Daniel Matos Caldeira*
As discussões que envolvem as emendas parlamentares e aquelas sobre a questão das obras públicas guardam estreita correlação pelo grande número de obras paralisadas e inacabadas oriundas dessa dinâmica. Os reduzidos resultados para além de acarretarem historicamente um sistemático número de apontamentos por parte dos órgãos de controle, um elevado número de procedimentos de ressarcimento ao erário e consequentes processos de responsabilização, sobretudo se traduzem na baixa efetividade social daquele empreendimento pela população.
Embora a discussão em torno do tema não seja recente, a mesma ganhou novos contornos após a aprovação da Emenda Constitucional 86, de 17 de março de 2015, chamada Emenda do Orçamento Impositivo, que tornou obrigatória a execução orçamentária e financeira das emendas parlamentares individuais consignadas nas programações dos projetos de lei orçamentária, isto é, tornou-as assim imunes aos efeitos dos contingenciamentos.
Já a execução das emendas de iniciativa de bancada de parlamentares seguiu também o mesmo caminho e por meio da Emenda Constitucional 100, de 26 de junho de 2019, passou também a ser obrigatória.
Por conta disso, alvissareira é uma recente medida implantada a partir de 2019 pelo Ministério da Infraestrutura, ao inaugurar um novo paradigma na Administração Pública colocando em prática uma grande inovação na dinâmica de relacionamento entre o Governo e o Congresso para a busca de convergência de entendimentos em relação à alocação das emendas parlamentares pela via do diálogo.
O grande mérito da iniciativa foi abandonar a estratégia até então dominante na relação do Poder Executivo com o Poder Legislativo, de tão somente elaborar e distribuir cartilhas orientadoras para difundir ações e programas das pastas e passar a se posicionar proativamente como um agente facilitador em um esforço de alinhamento com os líderes das bancadas estaduais em torno de uma decisão conjuntamente construída e pactuada.
A dinâmica foi capitaneada pelo titular da pasta, denotando tanto simbolicamente como na prática a mais alta deferência ao processo de planejamento orçamentário conjunto com o Parlamento.
Em síntese, a pasta de infraestrutura prepara para cada estado uma lista de prioridades para a alocação das emendas parlamentares tomando como fundamento três princípios atrelados à maximização dos resultados dos investimentos:
1 – Obras estratégicas: priorização de corredores logísticos de exportação e estruturas que fomentem atividades produtivas vocacionadas no estado;
2 – Obras em andamento: conclusão do passivo de obras atrasadas ou paralisadas antes do início da abertura de novas frentes de obras;
3 – Manutenção: continuidade do investimento para a conclusão da infraestrutura cuja execução já foi iniciada, sob o risco da perda dos investimentos realizados e um custo muito maior na sua recuperação.
O foco desse racional é que é melhor investir em obras que darão maior retorno socioeconômico, seja porque são estratégicas, ou porque já foram iniciadas ou porque podem resultar em uma elevada perda de investimento já realizado, do que pulverizar os escassos recursos para iniciar novas frentes de obras sem a garantia de que as mesmas serão concluídas.
À luz do domínio da teoria da negociação, a solução formulada é integrativa e com alto grau de legitimidade, pois é construída em torno da consensuação entre os atores institucionais, sendo o compromisso firmado fundamentalmente mais duradouro, de um lado o ministério e sua perspectiva técnica, do outro os parlamentares com o prisma político-social.
Essa inovação no arranjo cooperativo exige uma mudança de postura dos poderes que, em última análise, cria as condições para se buscar uma eficiência alocativa dos investimentos em infraestrutura.
O texto expressa a opinião do autor, não representando a opinião institucional do órgão em que trabalha.