iNFRADebate: Gás brasileiro para reindustrializar o Brasil

Julio Ramundo* e Ieda Gomes Yell**

Quando se confirmou a existência do pré-sal, em 2006, e foram feitas as projeções dos tamanhos das reservas petrolíferas, a descoberta foi motivo de comemoração e de preocupação. Comemoração porque havia uma gigantesca riqueza no fundo do mar, com imenso potencial, a ser explorada. E preocupação porque na época, para alcançar viabilidade comercial para exploração do pré-sal, o preço do petróleo deveria ser maior que US$ 60/barril. Dezessete anos depois, o pré-sal é uma realidade e o custo de produção é apenas uma fração dessa referência.

Os campos de pré-sal guardam outra riqueza, igualmente importante, que não está sendo aproveitada pelos brasileiros: o gás natural. Fundamental para a indústria, que foi responsável por 61% do volume consumido deste insumo em 2022 no país, segundo o MME (Ministério de Minas e Energia), também é considerado estratégico para fazer avançar a reindustrialização do Brasil. Este recurso natural pode ser utilizado tanto para fins energéticos – para geração de calor ou eletricidade – quanto como matéria-prima para a indústria química e na fabricação de fertilizantes. Entretanto, para ser considerado um vetor para a retomada da indústria, ele precisa estar disponível e ter preços competitivos.

Por isso, é preciso olhar novamente para o pré-sal. Em 2022, de acordo com o MME, o Brasil produziu 138 MMm³/dia de gás natural. Metade desse volume foi reinjetado nos campos, pois não havia como trazê-lo para o continente. Enquanto isso, para atender a demanda interna, o país importou da Bolívia 17,5 MMm³/dia e outros 6,5 MMm³/dia de cargas de GNL (Gás Natural Liquefeito), fechando o balanço para um consumo de 68 MMm³/dia. Se o Brasil tivesse acesso, ainda que em parte, a esse recurso natural reinjetado no pré-sal, diversos produtos que utilizam o gás natural como insumo poderiam estar sendo produzidos no Brasil, como amônia, fertilizantes e resinas plásticas e uma série de indústrias ganhariam em competitividade.

O Novo Mercado do Gás, programa do governo federal lançado em 2019, tinha como objetivo aumentar a competição e a oferta do insumo no Brasil. A Nova Lei do Gás (Lei 14.134/2021) trouxe o arcabouço legal para facilitar a diversificação dos ofertantes e impulsionar a infraestrutura necessária para garantir o escoamento do gás.

Quatro anos após o lançamento, alguns passos foram dados. Surgiram novos players no mercado e ocorreram avanços nas regulações estaduais, em especial. Entretanto, a expectativa de gás barato para a indústria não se concretizou. Como não se chegou a uma equação técnica e econômica que viabilize trazer esse gás para o continente, o esperado choque de oferta não ocorreu. Pior, deteriorou-se com a pandemia da Covid-19 e com a guerra entre Rússia e Ucrânia.

Estudos da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) indicam que é possível disponibilizar parte desse gás do pré-sal para o mercado. Para fomentar o gás natural, é preciso dar segurança para o investimento e incentivos para a construção de infraestrutura capital-intensiva e de longa maturação. Parte desse ambiente é estabelecida quando há previsibilidade do lado do consumo, de volumes e de preços.

Como comparativo, conforme a Petrobras, o Gasoduto Rota 3 ligará o pré-sal ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, com 307 km de gasodutos no mar e capacidade de escoamento de 18 MMm³/dia, começou a ser construído pela empresa em 2016 e deve ser finalizado em 2024, tem custo estimado pela EPE em R$ 6 bilhões. 

O que impede um avanço mais rápido na obtenção deste recurso natural? O principal argumento dos produtores é que a reinjeção do gás do pré-sal é necessária para aumentar a produção de petróleo, o gás é rico em CO2 (o que aumenta o custo da extração) e a infraestrutura para o escoamento até a costa é cara e com muito risco associado. 

É muito importante que os novos leilões prevejam a oferta obrigatória do gás para o mercado, uma vez que disponibilizar esse recurso natural é estratégico para o país. Há inequívoco interesse público. Sem a regulação adequada, os produtores continuarão precificando o gás natural pelo maior valor possível, dados os preços dos concorrentes, como a importação de GNL, por exemplo. A busca pelo maior retorno aos acionistas é legítima. Mas, diante dos benefícios que o gás natural pode trazer para a sociedade brasileira, a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) considera fundamental a adoção de uma política pública que garanta oferta abundante e preço competitivo ao gás natural do pré-sal. 

As consequências positivas para a economia são inúmeras: redução dos custos de produção, aumento da competitividade das indústrias, maior arrecadação de impostos, além da geração de emprego e renda. Com mais concorrência, menos custos de transporte e distribuição, aumento da oferta e uma regulação adequada, é possível mudar as condições de oferta, em benefício do processo de reindustrialização do Brasil.

*Julio Ramundo é diretor titular do Departamento de Infraestrutura da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
**Ieda Gomes Yell é conselheira do Conselho Superior de Infraestrutura da Fiesp.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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