Dimmi Amora, da Agência iNFRA
Um serviço permanente de transporte de contêiner para Singapura e outros portos do extremo oriente, operado no maior navio porta-contêineres que trafega pela costa do país, começou a operar no porto de Salvador (BA) em julho, dando à região Norte e Nordeste do Brasil a primeira linha direta ligando a região ao Extremo Oriente.
A operação começou com o navio MSC Orion, um New Panamax de 366 metros que em Salvador poderá contar com um canal com profundidade de 15 metros (a depender da maré, pode chegar a 18 metros) e operar sem restrições no terminal Tecon Salvador. Lá, os berços são preparados para dois navios desse tipo, num terminal que está com capacidade para movimentação dessa carga.
“Até a inauguração desse serviço, não tinha nenhum serviço regular para o extremo oriente escalando portos ao norte do Rio de Janeiro. Todos éramos atendidos por transbordo”, explicou Demir Lourenço, diretor-executivo do Tecon Salvador, informando que a redução do transit time para as cargas da região chegará a 21 dias em relação ao que é hoje. “Nossa perspectiva é também uma redução de fretes.”
A Wilson Sons administra o terminal desde 2000, e foram feitos investimentos de R$ 1 bilhão, o mais recente concluído em setembro do ano passado, com a expansão do cais para 800 metros. Os objetivos eram ter linhas diretas e receber escala de grandes navios. Para Demir Lourenço, desde 2018 estava claro que o país precisaria de capacidade de atender a grandes navios.
“A gente sabia que os navios de 366 metros viriam ao Brasil. Não sabíamos quando, mas sabíamos que iria acontecer. Era importante que nós estivéssemos preparados. [O investimento] nos propiciou chegar a esse momento que estamos vivendo agora, onde estamos meio que na contramão do mercado, porque nós temos capacidade adicional”, comentou o diretor sobre as restrições que os grandes navios de contêineres têm enfrentado em alguns portos do Sul e Sudeste do país.
O diretor afirmou que, quando o porto de Salvador, que é administrado pela estatal Codeba (Companhia Docas do Estado da Bahia), conseguiu a homologação para esse tipo de navio em 2018, a empresa iniciou uma estratégia para tentar convencer os armadores a utilizarem o Tecon como um hub regional. Isso porque parte das cargas que vão para o Norte e Nordeste, especialmente as com destino à Zona Franca de Manaus (AM), era deixada em terminais no Caribe ou na Europa e depois transbordada em navios menores para os portos do Brasil.
“Nós batemos na porta de vários armadores dizendo: ‘Olha, pega esse serviço e passa a fazer em Salvador. O custo vai ser menor'”, contou Lourenço. “Esse serviço regular que se iniciou na semana passada é o primeiro. Eu acho que será seguido por outros.”
Serviço mais competitivo para a região
Segundo ele, as possibilidades para os clientes que usam o comércio exterior na região ficam muito maiores. Produtores de algodão do oeste da Bahia tinham que levar as cargas para o Sul e Sudeste para exportar. Agora, estão sendo procurados para usar o novo serviço, além de produtores de carnes e outros produtos em estados como Mato Grosso, Goiás e Tocantins, por exemplo.
“Esse serviço direto e regular nos torna muito competitivos para essas cargas. [O cliente] está mil quilômetros daqui, mas está a dois mil do porto que utiliza atualmente para movimentar”, lembrou o diretor, citando algumas cargas que nem teriam condições de serem exportadas nas condições atuais, pelo longo tempo de espera. Com o novo serviço em Salvador, poderão fazê-lo, como alguns tipos de frutas produzidos na região (a uva entre elas).
O Tecon Salvador é um terminal com capacidade para movimentar 550 mil TEUs (medida para contêiner) por ano. Em 2023, alcançou 400 mil, segundo a empresa. Neste ano, foi eleito o sexto melhor do mundo nessa categoria, de acordo com uma publicação especializada. Apesar da vantagem em relação à profundidade do canal e a qualidade, é um terminal de menor porte comparado aos grandes terminais no Sul e Sudeste, com estrutura para o dobro ou mais de movimentação.
Esses terminais seriam em tese os preferidos dos armadores para concentrar cargas devido ao tamanho e a uma demanda maior de clientes, por estarem em regiões de maior desenvolvimento econômico. No entanto, vários desses terminais no Sul e Sudeste enfrentam no momento dificuldades para operar esses grandes navios, seja pela falta de profundidade nos canais, seja pela falta de espaço para movimentação e armazenagem. Reportagens sobre o tema neste e neste link.
PPPs de canal em ritmo lento
O MSC Orion, por exemplo, buscou, além de Salvador, outros terminais em portos que têm grande profundidade no canal, como Suape (PE) e Itajaí (RJ), onde pode operar com menores restrições. Em Santos (SP) e Paranaguá (PR), os maiores portos do país para movimentação desse tipo de carga, onde ele também vai operar, as restrições operacionais são maiores no momento, especialmente pela falta de profundidade dos canais.
Em entrevista recente, o diretor da Autoridade Portuária de Santos afirmou que o porto “não pode depender da maré” para operar navios. Isso porque a profundidade de 14,5 metros do canal só é alcançada na maré cheia. Mas, segundo ele, a conclusão do aprofundamento do canal para 16 metros ocorrerá só em 2025. O investimento ainda não foi licitado.
Tanto Santos como Paranaguá têm projetos para PPPs (Parcerias Público-Privadas) em que a gestão do canal fique sob administração privada, evitando assim problemas comuns com a falta de dragagem quando estão sob gestão pública. Mas esses projetos têm andado a passos lentos no atual governo e dificilmente serão licitados neste ano, de acordo com fontes que trabalham no tema.
Transborda ou é transbordado
Lourenço, o diretor do Tecon Salvador, lembrou que a empresa está sempre se preparando para novas etapas de crescimento, desde que assumiu a unidade em 2000. Segundo ele, a Codeba já fala em aprofundamento do canal para 17,5 metros a partir de 2025. E os planos são de seguir se desenvolvendo para que a unidade possa se tornar um porto para esse tipo de grande embarcação no país.
“Ou você se torna um porto onde a carga é transbordada ou você se torna o porto onde a carga chega por transbordo”, afirmou o diretor.