Leila Coimbra e Guilherme Mendes, da Agência iNFRA
O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, está confiante no cargo, mas diz que não possui apego à posição, que é de escolha exclusiva do presidente Jair Bolsonaro. A declaração foi feita em entrevista à Agência iNFRA nesta quarta-feira (29).
A conversa ocorreu em seu gabinete, 14 horas depois de o ministro retornar de viagem à Índia. Albuquerque aparentava estar animado – foi direto do voo ao trabalho, com uma pausa para ir à academia na hora do almoço. “Jet lag é para os fracos”, brincou. A animação também tem outro sentido – uma vez que o almirante não parece se importar com conversas sobre uma eventual reforma ministerial que inclua seu nome.
No retorno após dez dias de viagem, o ministro abordou variados temas: do impasse sobre o risco hidrológico ao mercado de gás; da privatização da Eletrobras à relação com o Congresso Nacional.
Abaixo, os principais trechos da conversa.
Agência iNFRA – O senhor está firme e forte no cargo? O presidente Jair Bolsonaro já veio ao ministério várias vezes em sinal de prestígio ao seu trabalho [não é praxe o presidente se deslocar para se reunir com ministros, mas o contrário]…
Bento Albuquerque – Ele [o presidente da República] nem veio aqui para me prestigiar. Já veio aqui quatro vezes, e é algo dele isto. Estou te falando com toda a sinceridade. Aquela história nunca surgiu lá da cabeça dele [a demissão], nunca surgiu, não tem nada disso. Como eu tinha te dito na época, não fazia sentido, não juntava coisa com coisa. Tanto que eu estou aqui.
E é uma coisa dele, ele particularmente gosta de vir aqui ao ministério. Tanto que já veio aqui quatro vezes. Duas vezes no ano passado e duas vezes este ano.
Então o senhor acredita que permanecerá como ministro?
Olha só: o cargo não me pertence, pertence a ele [o presidente Jair Bolsonaro], ele quem foi eleito presidente da República, ele quem me convidou para ser ministro de Minas e Energia. Nunca imaginei que eu pudesse vir a ser ministro de Minas e Energia – o que me deixou feliz pela honraria do cargo. Mas não tenho nenhum apego ao cargo, que pertence ao presidente.
Enquanto ele achar que eu estou cumprindo a missão que ele me deu, eu estarei junto com ele, no tempo que ele achar necessário. Na hora em que ele achar que eu não sou mais necessário, eu saio, sem nenhum problema.
E o senhor está amigo do Davi Alcolumbre [presidente do Senado]?
Eu nunca deixei de ser amigo dele.
Acha que o Congresso vai aprovar os projetos de interesse do setor de energia?
Como já disse anteriormente: o Congresso tem sua própria dinâmica. Então isso vai ocorrer no momento correto. O próprio PL do Gás, que está na Câmara, foi aprovado por unanimidade na comissão de Minas e Energia, com o concurso aqui do ministério. E o protagonista disto tem de ser o próprio Congresso Nacional, com o evidente apoio do Executivo e da área técnica.
Há duas possibilidades sobre a resolução do impasse sobre o risco hidrológico (GSF): uma é a apreciação de liminares pelo presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), João Otávio de Noronha – o presidente da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), Rui Altieri, considera essa a alternativa mais rápida e viável. Mas alguns geradores preferem o projeto de lei, porque facilita a vida do setor…
E também porque foi negociado [o projeto de lei].
E, para o senhor, qual é a melhor solução para o setor? Justiça, acordo administrativo, ou o PL?
Eu costumo dizer que as instituições no nosso país estão funcionando e não é de agora. Quando eu assumi o ministério, já havia este acordo entre o setor, o meio político e com o Executivo. O PL já estava lá, e este era o acordo.
Nós, do novo governo, analisamos e entendemos que não iríamos mexer neste acordo – e eu coloquei sua aprovação como prioritária, eu fui ao presidente da Câmara [Rodrigo Maia, do DEM-RJ] e falei isto, e ele foi aprovado na Câmara dos Deputados.
Ele foi aprovado, mas uma emenda que era um jabuti fez retornar em caráter terminativo ao Senado. Dei esclarecimentos ao senador Omar Aziz [PSD-AM], assim como ao ministro da Economia.
O melhor é quando as instituições funcionam. Se o Congresso entender que ele pode fazer o gesto de aprovar o PL no início dos trabalhos – que é só botar na pauta do plenário –, acabou. Agora, se o Judiciário tomar a decisão dele, na instância do Superior Tribunal de Justiça, também vai ser solução.
O que importa é que tenhamos segurança jurídica. Se a Justiça assim decidir, para mim será a melhor solução. Se o Congresso e, em particular o Senado, decidir, também vai ser a melhor solução.
E em relação ao Novo Mercado do Gás? Quais são os próximos passos?
Na Petrobras, queremos quebrar o monopólio de fato, uma vez que o monopólio de direito já não existe há 20 anos. Na produção, distribuição e transporte. Com o novo mercado de gás, a Petrobras já comercializa o gás com valor 10% mais baixo…
Mas o gasoduto Bolívia-Brasil teve sua chamada pública adiada por falta de outras empresas interessadas, correto?
Não, foi só por uma mudança de governo na Bolívia. Recebi aqui o ministro de hidrocarbonetos do governo de transição da Bolívia, e tudo foi feito de forma bastante transparente com a Petrobras.
A própria Bolívia está negociando com estados e empresas do Brasil. Cinco empresas já manifestaram interesse em participar do excedente que a Petrobras não deseja [12 milhões de metros cúbicos por dia]. Tudo isso está sendo viabilizado e ajuda a naturalmente diminuir o preço da commodity.
Sobre a privatização da Eletrobras, o senhor recebeu algum feedback da Câmara dos Deputados sobre a tramitação?
Eu conversei com o presidente Rodrigo Maia várias vezes, fomos à residência oficial, fizemos apresentações às lideranças da Câmara sobre o tema, e recebemos contribuições que foram frutos de dúvidas e questionamentos.
Aperfeiçoamos o projeto de lei que já tínhamos aqui minutado, antes de entregá-lo à Câmara dos Deputados. De certa forma, há um conhecimento grande em relação a este projeto de lei. E o próprio presidente [da Câmara] Rodrigo Maia tinha dito que não adiantava instalar comissão no final do ano passado.
Ainda não tive nenhuma oportunidade de conversar com o presidente Rodrigo Maia – até nos falamos rapidamente antes da minha viagem, mas não tratamos especificamente da Eletrobras. Provavelmente na próxima semana terei algum contato com ele, senão nesta semana.
Qual o balanço que o senhor faz desse primeiro ano de gestão?
Esse ano foi onde os resultados apareceram, dentro de ações prioritárias no ministério. Em janeiro do ano passado, reunimos as associações e a imprensa e apresentamos as ações em três setores do ministério, e avançamos naquilo que estabelecemos como prioridade em todas elas.
No setor de petróleo, gás e biocombustível, fizemos o RenovaBio e tudo aquilo para que o projeto entrasse em vigor na data planejada, 30 de dezembro. Não era uma questão só deste ministério, era também uma questão da Economia, do Banco Central e uma porção de outras instituições que fazem parte deste processo para que fosse viabilizado isto.
Conseguimos que a ANP [Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis] e outros órgãos de regulação trabalhassem para que a mistura de biodiesel passasse para 12% neste primeiro trimestre de 2020. O maior investimento em debêntures incentivadas foi no setor de energia.
Todos os leilões de óleo e gás foram exitosos e pela primeira vez a Petrobras não participou de um leilão [referindo-se ao leilão da 16ª rodada], entrando pequenas e médias empresas. Há casos como o campo de Azulão, que tem reservas comprovadas desde 1999 e está sem exploração na Amazônia, começando uma exploração pela Eneva e fruto de um leilão de energia em 31 de maio do ano passado.
Até julho de 2021, haverá uma térmica pronta em Roraima, com gás do campo de Azulão, que será liquefeito. Isso só foi viável por conta da abertura que fizemos, no que consideramos ações prioritárias. Maravilhoso, estamos caminhando para onde queríamos – porque torna importante não só na abertura [do mercado] como também nos investimentos. Os investimentos deste setor dependiam, basicamente, da Petrobras. Hoje em dia vemos pequenas, médias e até grandes empresas investindo nisso.
No setor elétrico, todos os leilões foram muito bem sucedidos, terminando com um de transmissão em dezembro, com um deságio maravilhoso de mais de 60%. Há o projeto de modernização do setor elétrico, que está sendo trabalhado junto ao Congresso. Já existem lá os projetos, feitos a quatro mãos pelo ministério e pelo Congresso.
Como foi a viagem à Índia?
Eu voltei da Índia hoje [quarta-feira]. Lá, em um seminário do setor de energia e mineração que realizamos, falamos eu, um dos ministros vinculados ao setor na Índia [o Ministro de Energia e de Recursos Novos e Renováveis], e depois falaram empresários.
E então veio um que é um dos maiores investidores no Brasil, que investiu R$ 8,2 bilhões, a Sterlite. Para minha grata satisfação, ele afirmou que aqui no Brasil ele não se sentia um investidor estrangeiro, mas sim um investidor junto aos investidores nacionais e outros estrangeiros, sem nenhuma discriminação, e que ele via um ambiente regulatório bastante estável, com respeito aos contratos. Eles estão aqui há alguns anos, e querem aumentar os investimentos.
Isso mostra que estamos em um ambiente de negócio atrativo.