Gabriel Tabatcheik, da Agência iNFRA
Todos os anos, centenas de navios aportam no porto organizado do Rio, administrado pela CDRJ (Companhia Docas do Rio de Janeiro). Eles movimentam a economia do país inteiro. No ano passado, considerando todos os seus terminais, o porto movimentou 7,4 milhões de toneladas de produtos, entre importação e exportação.
A CDRJ está trabalhando para melhorar o acesso aquaviário de todos os tipos de navios ao principal porto fluminense. Para isso, estabeleceu um GT (grupo de trabalho) para estudar quais melhorias são necessárias. Hoje você vai conhecer um pouco sobre elas, na reportagem especial que a Agência iNFRA preparou sobre o tema.
O coordenador desse projeto na CDRJ (Companhia Docas do Rio de Janeiro), Marcelo Villas-Bôas, disse que a iniciativa conta com apoio da Marinha, dos terminais arrendados e da praticagem, além de empresas de consultoria especializadas para as áreas de sinalização náutica e software.
O GT tem quatro eixos de atuação: navegação noturna pelo Canal da Cotunduba, aumento do porte dos navios conteineiros, implantação do calado dinâmico na Barra Grande e instalação do VTMIS.
O assunto foi debatido no iNFRALive – 110 Anos do Porto do Rio, evento realizado pela Agência iNFRA e pela CDRJ, com patrocínio do Sindoperj (Sindicato dos Operadores Portuários do Rio de Janeiro), do Pier Mauá, do Terminal de Trigo do Rio de Janeiro, da Triunfo Logística, da Multirio Terminais e do ICTSI Rio, e com apoio da associação Logística Brasil (Associação Brasileira de Usuários de Portos, de Transportes e da Logística). Assista à íntegra abaixo:
Cotunduba
“O Rio de Janeiro é abençoado”, definiu Villas-Bôas, ao referir-se ao Canal da Cotunduba. Com uma profundidade natural de 17,3 m e pouco assoreamento, a via permite a entrada e saída contínua de embarcações no limite de capacidade de carga — desde que se implementem adaptações. Ela só é usada plenamente de dia. Alguns navios já saem à noite por ali, mas isso está sendo considerado como teste. Dos três planos para incrementar o acesso marítimo ao Porto do Rio, a navegação noturna na Cotunduba é o maior deles.
“No caso do balizamento de Cotunduba, a gente queria usar o canal à noite. A praticagem argumentou do risco da navegação noturna. Então nós percebemos que, para resolver esse problema, precisaríamos melhorar a sinalização”, explicou Villas-Bôas.
O sistema de identificação automática, o AIS AtoN, ajudará nesse sentido. Em fase de implantação, ele fará com que os radares percebam a presença das boias náuticas, ainda que a visualização esteja prejudicada. As boias ajudam o navio a traçar sua trajetória. “Ela tem um beacon, um sinal que é identificado no radar”, definiu o coordenador.
Outra necessidade é a varredura do canal, usado por pescadores e turistas com frequência.
“Você tem um tráfego noturno ali, de embarcação de pesca e de passeio. Como ficou anos sem passar nada ali de noite, a população, os pescadores, estão acostumados a esse estado das coisas”, ponderou Luiz Henrique Carneiro, CEO dos terminais MultiRio e MultiCar.
Por causa disso, lanchas da autoridade portuária efetuam a varredura do canal previamente a cada manobra noturna. A Capitania dos Portos divulgou vídeos nas redes sociais tratando sobre o uso noturno e constante do canal em um futuro próximo.
“O vídeo é voltado para as comunidades de pesca, para os clubes de náutica, para os iate clubes, dizendo que vai ter [navegação noturna]. Tem todo um processo de alerta para fazer essa passagem, por enquanto, monitorada. Para depois poder tornar rotineira”, disse Carneiro.
Ramp up
Essas iniciativas servem para trazer navios maiores para o porto. O processo tem o nome de “ramp up”, um termo em inglês que significa “incremento constante”.
“Os navios vão aumentando de tamanho, comprimento e boca [largura]. A gente está acrescendo o tamanho dos navios que podem acessar o porto”, revelou Villas-Bôas.
O Porto do Rio está totalmente liberado para embarcações de até 306 metros de comprimento. Estão em ramp up para passar a receber os de 336, muito usados em serviços para a Ásia. Estes estão em fase final dos testes para homologação.
Mas o futuro está mesmo com os post-panamax, supernavios com 366 metros de comprimento. Os portos brasileiros estão se adaptando, mas nenhum os recebe atualmente.
“É o maior navio que passa hoje nas eclusas do Canal do Panamá”, revela Carneiro. O Porto do Rio está implantando todas essas medidas para ver os post-panamax na baía de Guanabara.
“Os arrendatários dos terminais de contêineres já ofereceram para a CDRJ um projeto de canal, para receber esses novos navios. O próximo passo seria fazer uma simulação, junto com a praticagem. E ela estava marcada para ser feita na USP [Universidade de São Paulo], quando veio a pandemia de Covid-19. Então a gente suspendeu e estamos remarcando”, explicou Carneiro, que representa um dos arrendatários.
Depois da simulação e a incorporação de eventuais aprimoramentos ao projeto de dragagem, vem as etapas de licenciamento ambiental e execução da obra de dragagem.
“Como os navios têm maior comprimento, será necessário ampliar o diâmetro da bacia de evolução para possibilitar o seu giro. Também será necessário alargar alguns pontos do canal de acesso aos terminais de contêineres em função da maior largura [boca] dos navios, além de aprofundá-lo para 16,2 metros na entrada e 15,7 metros junto aos berços de atracação. Hoje, a profundidade do canal está regularizada em 15 metros”, disse o CEO da companhia.
Calado dinâmico
Quanto mais profunda uma via marítima, maior é o calado que um navio pode utilizar. O calado é o termo que se usa para medir a parte submersa de uma embarcação. É o que fica entre a superfície d’água e o fundo do barco. Quanto mais carregado um navio, maior é o calado.
Além disso, a legislação exige uma “folga” entre a embarcação e o fundo do mar, a fim de se evitar acidentes. Geralmente, ela corresponde a 10% da profundidade da via, o que significa que varia entre um e dois metros.
A outra via de acesso à baía da Guanabara é pela Barra Grande (Santa Cruz). Nela, os navios podem trabalhar com calado de até 12,6 metros. Para melhorar o acesso por essa porta, a CDRJ estuda o projeto de implementação do calado dinâmico. A iniciativa está em fase de homologação junto à Marinha do Brasil e ainda não tem data para ser implantada. Mas espera-se que isso ocorra até o final do ano.
O calado dinâmico é uma tecnologia que leva em consideração um sistema com boias que medem as condições meteorológicas de ondas, maré, vento e outras variáveis. Com esses dados, os responsáveis pela operação do canal são capazes de calcular o calado máximo permitido num determinado momento. Em vez do calado máximo da Barra Grande ser 12,6 metros sempre, em alguns momentos ele pode ser 13,5 metros, em outros pode ser 12,8 metros, ou qualquer outro valor, a depender dessas variáveis.
Na prática, o sistema melhora a “folga” entre a embarcação e o fundo do mar, permitindo que se trabalhe com segurança com margens menores, de até 50 centímetros. Cada centímetro a mais de calado permite a uma embarcação trafegar com mais carga, ampliando a competitividade do porto. De acordo com Villas-Bôas, o objetivo é que o Porto do Rio seja o primeiro do Brasil a operar com esse sistema.
“Estamos concorrendo com outros portos, mas trabalhamos para sermos os primeiros”, disse o coordenador dos projetos na CDRJ.
VTMIS
O Porto do Rio também trabalha para implantar o VTMIS, do inglês “Vessel Traffic Management Information System”. É um avançado sistema de informação e gerenciamento do tráfego aquaviário marítimo. De acordo com Villas-Bôas, a tecnologia permite monitorar todo o tráfego aquaviário com câmeras, sensores e radares, gravando toda a atividade naval e permitindo que o sistema “volte no tempo”, se necessário, a fim de verificar alguma ocorrência.
A fase inicial desse projeto será concluída no primeiro trimestre de 2021, com a implementação do LPS, ou Local Port Service. O sistema, que é o primeiro passo para se chegar ao VTMIS, vai contar com oito câmeras espalhadas pela baía de Guanabara: cinco na Ponte Rio-Niterói, duas no Morro da Urca e uma na Fortaleza de Santa Cruz.
“Vai começar com o monitoramento ambiental que vai envolver marégrafos e uma boia meteoceanográfica. Também vai melhorar nossa capacidade de comunicação com os navios”, resumiu Villas-Bôas.