Reflexões sobre a infraestrutura para Mobilidade Aérea Urbana – Parte 2

Dario Rais Lopes*

No artigo anterior expus algumas reflexões sobre a infraestrutura para os serviços de UAM (Mobilidade Aérea Urbana, em português): uma possível tipologia de rede e aspectos metodológicos do planejamento e construção dessa rede de vertipontos, vertiportos e vertihubs.

Penso ser importante também contribuir para essa discussão ao abordar dois outros aspectos que podem constituir dificuldades a superar para que essa infraestrutura permita a plena operação dos serviços: o relacionamento urbano, objeto do presente texto, e a superposição com os helicópteros, que será abordada num próximo artigo. Mais que um inventário de dificuldades, o objetivo é propor temas a detalhar para posterior exposição e conscientização da população.

O relacionamento urbano das infraestruturas do transporte aéreo se pauta por duas preocupações: a segurança das operações e os problemas de ruído (e seus desdobramentos no real estate). Para tanto, os aeródromos dispõem de dois planos – o da zona de proteção e o de zoneamento de ruído. O Plano da Zona de Proteção estabelece limites às alturas das construções que possam implicar em risco às operações naquela infraestrutura. Já o Plano de Zoneamento de Ruído contém as restrições ao tipo de uso do solo nas adjacências da infraestrutura, compatibilizando o uso e ocupação do solo no entorno com a atividade aeronáutica e reduzindo o incômodo causado por sua principal externalidade – o ruído.

 Especificamente em relação às questões de ruído, tem-se o fato concreto de que os veículos UAM produzirão menos ruído que os helicópteros. Mas isso não significa que não haverá conflito motivado pelo ruído dos e-VTOL. 

O volume e a frequência de um som depende principalmente de sua fonte, que no caso dos veículos UAM são motores, hélices e fuselagens. Embora um motor elétrico moderno gere um nível de ruído significativamente mais baixo do que um helicóptero, as hélices criam um som de alta frequência que não pode ser facilmente eliminado. Ensaios aerodinâmicos mostram que o som da hélice diminui cerca de 6 dB com cada duplicação da distância da fonte, o que pode ajudar na definição das rotas, mas não contribui muito com a infraestrutura. 

E o desafio da redução do ruído para os e-VTOL encontra um cenário mais adverso quando se trata do vertiporto. As operações das infraestruturas de transporte aéreo cada vez mais têm sido influenciadas pela ação das comunidades de seus entornos. O caso mais emblemático é o do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, onde o embate entre a operação aeroportuária e a comunidade (não apenas do entorno, mas de diversas regiões da cidade) já dura décadas e não há sinais de uma convivência pacífica.

Quando se analisa o relacionamento urbano de aeroportos, o usual é a implantação da infraestrutura ocorrer em área não habitada; sua construção induzir a ocupação do entorno que, ao longo do tempo, passa a questionar a existência do aeroporto. No caso do vertiporto há um complicador – a infraestrutura aérea vem depois da comunidade. O fato da infraestrutura ser posterior ao processo de urbanização e trazer a operação para bem mais próximo da comunidade (em relação aos aeroportos e helipontos) vai aumentar a percepção de exposição dos moradores os indivíduos a externalidades negativas, como ruído, degradação do meio ambiente ou redução de valores das residências.

Essa situação aumenta a probabilidade das comunidades se oporem à implantação das infraestruturas UAM no espaço urbano. A aceitabilidade de vertipontos, vertiportos e vertihubs vai demandar um sensível esforço de conscientização em relação às percepções de segurança, proteção, privacidade, propriedade, responsabilidade, ruído, poluição visual, poluição do ar e equidade do uso do espaço urbano. A definição final dependerá principalmente de ruído, poluição visual e preocupações com a privacidade, condicionadas a uma regulamentação específica, próxima, mas não igual à das infraestruturas para helicópteros.

*Dario Rais Lopes é ex-secretário nacional de Aviação Civil e professor da Escola de Engenharia da Universidade Mackenzie.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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