Leila Coimbra, da Agência iNFRA
O relatório do projeto de privatização da Eletrobras, elaborado pelo deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) na semana passada, coloca nas mãos das Forças Armadas a gestão de um fundo que receberá pelo menos R$ 15 bilhões nos próximos 30 anos.
O modelo proposto por Aleluia é a criação de uma entidade de capital privado, sem nenhuma ligação com o orçamento da União: a Revita (Fundação de Revitalização do Rio São Francisco) – que receberá R$ 500 milhões anuais da geração de energia da Eletrobras, e será a responsável pelos projetos de desenvolvimento da região do Rio São Francisco.
Presidente será obrigatoriamente militar
Apesar da independência em relação ao governo federal, o relator propõe que o comitê gestor da Revita tenha um membro do Exército, outro da Marinha e também um da Aeronáutica. E que o presidente da fundação seja obrigatoriamente um desses três militares, escolhido pelos outros membros do grupo.
Segundo a proposta, ao todo serão nove integrantes: além dos três oficiais superiores na ativa, mais dois membros designados pelo presidente da República, dois indicados pela Eletrobras, um pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) e um pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.
Aleluia: “Estratégia de estado”
Segundo Aleluia, o objetivo do controle militar é para que os recursos do fundo não sejam utilizados politicamente.
“É um modelo novo que estou propondo justamente para blindar a revitalização do São Francisco de qualquer influência política. Também fiz questão de incluir militares no conselho gestor para que a escolha dos projetos obedeça a uma estratégia de estado, e não de governo”, disse ele.
O relator da proposta diz que se baseou no modelo da Tennessee Valley Authority, uma agência de desenvolvimento criada nos Estados Unidos para controlar a navegação, geração de eletricidade e desenvolvimento regional na década de 1930.
Mas a Tennessee Valley Authority não tem nenhum membro das Forças Armadas norte-americanas em seu comitê gestor, segundo o site oficial da agência (www.tva.gov).
Ditadura militar
A proposta de Aleluia de colocar militares no comando de uma entidade que administra dinheiro privado ocorre justamente em meio a uma crise de imagem das Forças Armadas na mídia nacional.
A polêmica se deu diante da ampla divulgação de um memorando escrito em abril de 1974 por William Colby, então diretor da CIA (Agência Central de Inteligência) dos Estados Unidos, no qual ele afirma que o então presidente do Brasil, general Ernesto Geisel (1974-1979), decidiu manter a política de “execução sumária” de opositores do regime militar praticada pelos órgãos de segurança durante a presidência do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974).
Segundo a CIA, Geisel havia dado autorização para a manutenção das execuções de “subversivos perigosos” durante o seu governo, transformando esses assassinatos em política de estado. Caberia ao general João Baptista Figueiredo, então chefe do SNI (Serviço Nacional de Informações) e, posteriormente, sucessor de Geisel na Presidência da República, a aprovação das execuções – de acordo com o documento da agência de inteligência americana.
Jungmann: prestígio permanece
O governo teve que se pronunciar durante o fim de semana para defender os militares, que são protagonistas da intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro.
Segundo o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, a divulgação dos documentos da CIA não afeta o “prestígio” das Forças Armadas. Ex-ministro da Defesa, ele disse que o governo ainda não teve acesso ao documento de forma oficial, mas afirmou que alguma medida deve se tomada.
“Não estamos desconsiderando (o memorando), mas precisamos ter acesso de forma oficial. O prestígio das Forças Armadas permanece nos mesmos níveis. As Forças são um ativo democrático, isso não é tocado por uma reportagem”, afirmou à imprensa.