Bagagem despachada obrigatória dificultará entrada de low cost no Brasil, alerta CEO da JetSMART

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

Se a regulamentação no Brasil passar a incluir bagagem obrigatória despachada, a entrada de todas as companhias aéreas de ultrabaixo custo no país estará dificultada. Além disso, o preço das tarifas “aumentará permanentemente”.

Quem diz isso é um dos grandes interessados no mercado brasileiro de aviação, o CEO da JetSMART, Estuardo Ortiz, empresa aérea que opera em padrão baixo custo e que acabou de fechar com a American Airlines um acordo para ampliar ainda mais sua participação na América Latina.

“O mundo inteiro está caminhando para tarifas desagregadas, quando o próprio cliente pode decidir o que comprar, então acreditamos que essa política de inclusão de bagagem deixaria o Brasil para trás em toda a América do Sul e afetaria o passageiro, pois tiraria o direito de escolha de pagar apenas pelo que quiser usar”, afirmou Ortiz nesta entrevista à Agência iNFRA, por e-mail.

A JetSMART foi criada pela Indigo Partners, fundo privado de investimento com mais de 20 anos de experiência desenvolvendo linhas aéreas Ultra Low Cost no mundo, entre elas a Wizz Air (Leste Europeu), Volaris (México) e Frontier Airlines (Estados Unidos).

A empresa opera desde 2019 voos internacionais no Brasil, com destino ao Chile e à Argentina. Mas, por enquanto, o nosso mercado doméstico ainda não tem garantia de que será atendido. A empresa já está há um ano operando no Peru, vai iniciar operações domésticas na Colômbia e, com o acordo com a American, poderá eventualmente atuar na Argentina.

“A parceria permite o rápido crescimento da JetSMART e de sua rede de baixo custo em toda a América do Sul e dá à American uma participação minoritária na companhia aérea”, informou o CEO.

Ortiz elogiou a atuação do Brasil na abertura do mercado aéreo nos últimos anos e diz que a companhia tem interesse e mantém a visão de ingressar no país para voos domésticos. Mas, para ele, o país ainda precisa se alinhar às melhores práticas globais no setor, especialmente quanto à judicialização.

“É preciso entender a realidade da aviação no Brasil e buscar mecanismos que permitam um maior alinhamento com as melhores práticas globais, possibilitando a proteção do consumidor sem penalizar as companhias aéreas por situações que em sua maioria fogem ao seu controle”, disse Ortiz na entrevista que segue abaixo.

Agência iNFRA – Qual é o potencial do mercado brasileiro para uma empresa aérea modelo low cost?
Estuardo Ortiz – Na última década, a aviação comercial brasileira passou por um processo muito interessante e positivo de modernização e abertura ao mercado internacional. Isso se reflete no projeto de redução de tarifas aeroportuárias para voos internacionais, que faz parte da filosofia da ANAC [Agência Nacional de Aviação Civil] de atrair novas companhias aéreas e promover a concorrência. Há alguns anos, iniciou-se o processo de terceirização e concessão de aeroportos nacionais em prol do investimento e sua modernização.

A JetSMART vê o Brasil como um país relevante em termos de volume e tamanho, mas que antes não tinha as melhores condições regulatórias para a entrada de um novo concorrente, como agora. O Brasil tem feito progressos muito positivos na regulação aeronáutica, por meio da ANAC, tornando o quadro operacional no Brasil mais flexível e moderno, permitindo, por exemplo, a troca de aeronaves ou a propriedade estrangeira de uma companhia aérea brasileira.

Há quantos anos a empresa estuda aumentar sua atuação no Brasil?
Operamos voos internacionais no Brasil desde dezembro de 2019 e estamos aumentando progressivamente a conectividade entre o país e outros da América do Sul. Atualmente, operamos sete rotas internacionais no Brasil: de São Paulo, Rio de Janeiro e Foz do Iguaçu para Santiago do Chile; de São Paulo e Rio de Janeiro para Puerto Montt (conexão) [no Chile]; e do Rio de Janeiro para Buenos Aires [Argentina] e Montevidéu [Uruguai].

Da mesma forma, durante os meses de julho e agosto aumentaremos as frequências semanais de São Paulo para Santiago. Com este aumento de rotas, acreditamos que podemos fortalecer o mercado, para que haja uma sinergia com passagens de baixo custo, proporcionando mais opções para quem deve viajar a trabalho, especialmente para PMEs [Pequenas e Médias Empresas] e empresários que precisam viajar para o Brasil.

Estamos muito confiantes no potencial do mercado brasileiro e vemos o Brasil como um mercado muito relevante, pois é um país com o qual o continente mantém relações estreitas e com grandes corporações e multinacionais.
 
Que ganho a empresa estima que traria para o mercado brasileiro caso expandisse uma operação de low cost/low fare no mercado doméstico do país?
Desde o início da nossa operação verificamos que, nos mercados onde entramos, as passagens aéreas apresentam uma redução de cerca de 35%.  

A empresa tem interesse em atuar no mercado brasileiro com voos domésticos?
Estamos sempre atentos a novas oportunidades de rotas, acompanhamos de perto o desenvolvimento do mercado doméstico brasileiro, dado seu enorme potencial, e mantemos comunicação constante com autoridades e aeroportos. 

No momento, continuaremos aumentando nossa presença com rotas internacionais a partir do Chile, Peru e Argentina, e em breve a operação doméstica na Colômbia, pois acreditamos que o mais importante é manter o espírito do nosso modelo, onde o passageiro paga apenas para o que usa, em voos a preços acessíveis, com uma ótima conectividade de rotas, muitas delas Rotas SMART que conectam cidades que não são destinos tradicionais como as capitais de cada país.

Por quais principais motivos a empresa não inicia todos os seus planos de operação doméstica no Brasil?
Como eu comentei, estamos sempre de olho em novas oportunidades de rotas no Brasil, dado o seu enorme potencial, estamos muito focados na expansão de nossas rotas na América do Sul e na consolidação de mercados domésticos como Chile, Argentina e Peru, e, em breve, Colômbia.

No entanto, é muito importante entender em que direção as regulamentações estão se movendo no setor. Por exemplo, regulamentações como a que analisa a inclusão do transporte gratuito de malas na compra da passagem aérea são um grande revés para o crescimento exponencial do modelo de baixo custo na América do Sul. 

Incluir o custo da mala no bilhete será sempre mais caro, e sabemos pela nossa experiência em todos os mercados onde operamos, que as tarifas podem ser entre 15 e 50 dólares mais caras em cada trecho, e que podem ser 57% mais caras para as pessoas que hoje optam por não comprar bagagem para sua viagem.

O que a empresa vê de diferente no mercado brasileiro de outros mercados similares que impedem esse tipo de operação no país?
Acreditamos que, com a retomada do turismo, cada vez mais brasileiros viajarão. E sabemos que o alto custo das passagens pode ser um fator limitante para o crescimento do setor.

Uma companhia aérea de baixo custo tem que dar aos passageiros o que eles realmente querem. Sempre que se faz esta pergunta a um cliente da aviação, em diferentes países e em diferentes momentos, a resposta é invariavelmente o preço. As pessoas querem voar barato e com segurança, obviamente. Para isso, é necessário montar uma operação que gere baixos custos.

Quanto aos desafios para atuar neste mercado, acreditamos que vão além do Brasil. Temos questões como a disposição das pessoas em voltar a viajar de avião em um mercado aéreo pós-Covid, o tamanho do mercado, o número de vezes que as pessoas viajarão, mudanças nos hábitos de compra e ainda saber se as pessoas viajarão por mais ou menos dias. 

Precisamos entender o mercado, pois houve um impacto na demanda, para definir corretamente a capacidade, os dias, o número de voos e os preços certos para atrair pessoas para voar em um de nossos voos. No momento, estamos avaliando as rotas e horários mais convenientes, mas definitivamente temos interesse em continuar nossa expansão, promovendo a conectividade com toda a América do Sul, onde até hoje já transportamos mais de 19 milhões de passageiros com nossas 77 rotas.
 
A constante ameaça de uma lei no Brasil restabelecendo a obrigatoriedade de isenção de uma mala despachada por passageiro é considerada na decisão de prorrogar ou não a entrada no país? 
Acreditamos que restabelecer a obrigatoriedade da isenção de franquia para bagagem despachada representaria um retrocesso no crescimento do setor aéreo brasileiro, pois retiraria o direito de escolha do passageiro. No Chile, na Argentina ou no Peru, assim como na Europa e nos EUA, a presença do modelo ULCC tem permitido baixar os preços em mais de 35%, além de trazer uma dinâmica competitiva que beneficia o consumidor, pois lhe dá a oportunidade de escolher a tarifa que mais lhe convém, sendo sempre mais barata aquela que não tem bagagem incluída na tarifa.

A empresa considera a possibilidade de continuar no mercado caso exista tal obrigação legal?
Se a regulamentação no Brasil passar a incluir bagagem obrigatória, isso não apenas dificultará a entrada de todas as companhias aéreas de ultrabaixo custo no país, mas também aumentará permanentemente os preços para os brasileiros na medida em que obrigará as atuais companhias aéreas brasileiras a aumentar suas tarifas. Isso pode gerar um impacto muito negativo para todos os passageiros brasileiros.

O mundo inteiro está caminhando para tarifas desagregadas, quando o próprio cliente pode decidir o que comprar, então acreditamos que essa política de inclusão de bagagem deixaria o Brasil para trás em toda a América do Sul e afetaria o passageiro, pois tiraria o direito de escolha de pagar apenas pelo que quiser usar.

É imprescindível que as companhias aéreas tenham flexibilidade para oferecer passagens em que o passageiro tenha a opção de escolher pagar ou não pela bagagem, podendo pagar o mínimo possível pela viagem, de acordo com suas necessidades.

Do ponto de vista do modelo de negócios, até que ponto o custo do combustível de aviação no país influencia a decisão de iniciar operações no Brasil?
Em média, o combustível corresponde a 45% das despesas de uma companhia aérea e representa a primeira ou segunda despesa mais importante. Além disso, os impostos impactam diretamente no preço das passagens. Portanto, uma redução desse imposto beneficia diretamente os passageiros com a redução no preço de suas passagens, o que também beneficia muito toda cadeia de turismo. 

Quando há alterações no preço do combustível, há um impacto na companhia aérea, em nível global. Essa questão está a afetar não só os bilhetes aéreos, mas também os bens e serviços. Para ajudar a reduzir o custo do combustível, é essencial operar aeronaves de última geração e com baixo consumo de combustível, como os Airbus A320 e A321 da frota JetSMART.

Do ponto de vista do modelo de negócios, em que medida a excessiva judicialização do setor aéreo no país impacta a decisão de iniciar operações no Brasil?
A judicialização é negativa para as companhias aéreas e para os consumidores, pois pode gerar aumento de tarifas e redução da oferta de voos. Se levada ao extremo, dificulta a entrada de novas empresas no país, encarece as passagens e, portanto, desacelera o desenvolvimento das viagens aéreas no país.

É preciso entender a realidade da aviação no Brasil e buscar mecanismos que permitam um maior alinhamento com as melhores práticas globais, possibilitando a proteção do consumidor sem penalizar as companhias aéreas por situações que em sua maioria fogem ao seu controle, bem como evitar ir aos extremos da judicialização.

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