08/07/2025 | 10h00  •  Atualização: 08/07/2025 | 16h03

Brasil e China assinam acordo de 5 anos para estudar viabilidade de ferrovia entre Chancay, no Peru, e Mato Grosso

Foto: Michel Corvello/Ministério dos Transportes

da Agência iNFRA

Os governos brasileiro e chinês assinaram na segunda-feira (7) um memorando de entendimento para elaboração de estudos de viabilidade de um corredor ferroviário internacional que ligaria Chancay, no Peru, a Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, um dos polos da produção agrícola do centro-oeste. Complexo, o traçado não tem data para sair do papel e tem como um dos principais desafios o risco de engenharia associado ao terreno da Cordilheira dos Andes.

Na prática, o documento oficializa o interesse dos chineses em avaliar a ligação após uma série de tratativas entre auxiliares de Xi Jinping e Lula, que quer colocar o Brasil no mapa do programa de investimentos bilionários em infraestrutura do governo chinês, conhecido como Nova Rota da Seda. 

Para o lado oriental, a atratividade do projeto gira em torno da avaliação de um escoamento mais eficiente e rápido da produção que embarca e desembarca no recém-inaugurado Porto de Chancay, operado pela estatal chinesa Cosco Shipping e que fica a 70 quilômetros de Lima, capital peruana. Entra no cálculo também o fortalecimento da presença chinesa na região. 

O acordo foi fechado entre a Infra S.A., estatal brasileira, e o Instituto de Planejamento e Pesquisa Econômica da China State Railway Group, que carrega o título de maior empresa pública ferroviária do mundo. A oficialização da parceria contou com a participação virtual de um time do governo chinês direto de Pequim. Entre eles, o presidente e chefe-executivo do Instituto de Planejamento Econômico e Ferroviário da China.

O prazo fixado para o memorando reforça a complexidade do projeto: serão cinco anos de parceria entre os governos, período que pode até ser prorrogado. O documento dá as bases para o compartilhamento de informações entre as duas estatais. Os chineses serão municiados pela Infra S.A. com levantamentos e informações sobre o contexto brasileiro, o que inclui também o cenário de outros modais, como rodoviário, portuário e hidroviário. 

Uma boa parte do traçado inicialmente imaginado, por sua vez, não é em território brasileiro. A malha sairia de Chancay e passaria por Cusco, ainda no Peru, chegando ao território brasileiro pelo Acre. De Rio Branco (AC), chegaria em Porto Velho, em Rondônia, descendo até desembocar em Lucas do Rio Verde, onde se conectaria com o corredor Fico-Fiol – que finaliza na Bahia e ainda está em construção ou em fase de estudos para alguns trechos, com leilão programado para 2026. 

Portanto, se o traçado internacional for viabilizado, o projeto ligaria o leste brasileiro e o Oceano Atlântico ao Oceano Pacífico, e por isso vem sendo chamado de corredor bioceânico. 

Traçado em avaliação
Integrantes do governo brasileiro reconhecem que a Cordilheira dos Andes impõe desafios ao projeto. Mas a avaliação feita até o momento é de que a ferrovia pode ser viabilizada se aproveitar a faixa de domínio da rodovia já existente no trecho. 

“Assim você mitiga riscos de licenciamento ambiental, desapropriação, fica mais fácil. Mas é preciso fazer uma avaliação técnica, que envolve engenharia, questões ambientais e econômicas”, disse o secretário nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro. 

Os ministérios dos Transportes, do Planejamento e a Casa Civil contam com a expertise tecnológica e os recursos chineses para tirar o traçado do papel. Ribeiro pontua que há um gap de investimento “altíssimo” para ser preenchido no Brasil e que a parceria tenta buscar essa complementação.

“Nós temos as informações sobre o contexto brasileiro. Essa troca de conhecimento e de colaboração mútua vai permitir que os chineses possam entrar no setor de transportes – assim como aconteceu no setor de energia, em que eles entraram porque eles estavam com as informações”, afirmou. “Precisamos agora, com a Infra S.A. e a China Railway Group, depurar, enriquecer os dados”, concluiu. 

Trecho no Peru
Dentro das rotas de Integração Sul-Americana traçadas pelo Ministério do Planejamento, o corredor estaria incorporado à chamada Rota 3 (Quadrante Rondon), que ainda incluiria ligações pelo Chile e Bolívia. Em planejamentos passados, os governos da região, incluindo o brasileiro, já cogitaram também fazer uma conexão ferroviária entre o Chile e o Brasil que passaria pelo Paraguai e a Argentina. 

Segundo técnicos, uma das motivações de o Brasil prever a malha ferroviária entre Chancay e o Acre foi a de os trilhos passarem apenas por um país vizinho para chegar ao Pacífico. 

O diagnóstico feito até o momento dentro do governo brasileiro é de que o Peru também tem muito interesse em viabilizar a malha, especialmente após a ativação do porto administrado pela Cosco. Em junho, o secretário de Articulação Institucional, João Villaverde, esteve em Lima para participar do Fórum Internacional Peru-Brasil. Villaverde também foi palestrante no painel “Conectividade e Facilitação do Comércio Peru-Brasil”, durante evento realizado pela Câmara de Comércio Brasil-Peru na Universidade de Lima. 

No país, ele aproveitou para fazer reuniões bilaterais com o ministro da Economia do governo peruano, Raúl Perez-Reyes, e com o presidente do Congresso da República do Peru, Eduardo Saluana, acompanhado do Embaixador do Brasil em Lima, Clemente Baena. O assunto principal dos encontros foi a ferrovia bioceânica. 

Portaria da Infra S.A.
Também nesta segunda, o Ministério dos Transportes publicou a Portaria 504/2025, com diretrizes referentes à gestão e exploração de pátios ferroviários, terminais logísticos e demais instalações de armazenagem e movimentação de produtos sob administração da Infra S.A. Segundo o texto, a estatal deverá apresentar à pasta em até 60 dias uma proposta para que o PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) do governo federal qualifique empreendimentos nessa área.

Após qualificação, a empresa terá de enviar ao Ministério dos Transportes estudos técnicos de modelagem da licitação. Ainda de acordo com o texto, contratos geridos pela estatal poderão ser prorrogados desde que assegurada a vantajosidade. 

Caso a nova licitação ou a prorrogação não tenha se efetivado em até um ano antes do término da vigência do contrato original, a portaria recomenda que a Infra S.A. realize a prorrogação por dois anos para que não haja descontinuidade na prestação do serviço.

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