iNFRADebate: Transferência automática da cláusula arbitral para seguradoras sub-rogadas

Carlos Eduardo Staudacher Leal Carvalho* e Lucas Russi Farah**

Em 9 de maio deste ano, a 4ª turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) julgou o Recurso Especial 1.988.894-SP, de relatoria da ministra Maria Isabel Gallotti.

O recurso foi interposto por Mapfre Seguros Generales de Colombia S/A em demanda de ressarcimento que promoveu contra Log Wisdom S/A, Thorco Shipping e Asia Sipping Transportes Internacionais Ltda e trata de tema rotineiramente discutido por estudiosos da arbitragem e direito civil: a extensão da sub-rogação legal da seguradora que prestou indenização a seu segurado e que busca se ressarcir contra o causador do sinistro.

O caso em tela envolve, na origem, um contrato de transporte marítimo internacional de peças destinadas à construção de uma usina na Colômbia. Nesse contrato, havia previsão de cláusula compromissória elegendo arbitragem administrada pela LMAA (London Maritime Arbitrators Association) como meio de resolução de disputas.

A seguradora Mapfre, naturalmente, não era signatária desse contrato, tendo apenas emitido apólice de seguro para os riscos relacionados ao transporte. Em função de sinistro envolvendo a carga transportada, a Mapfre indenizou o segurado, sub-rogando-se nos seus direitos, e, para se ressarcir da indenização prestada, promoveu uma demanda judicial contra as três sociedades mencionadas.

Na causa, as partes discutiram se a seguradora encontrava-se vinculada à cláusula compromissória prevista no contrato de transporte que dava suporte à pretensão de ressarcimento contra o tomador do seguro-garantia.

Em breve síntese, a 4ª Turma do STJ decidiu que a seguradora deve se valer da arbitragem prevista no contrato de transporte (no qual ela não figura como parte) para se ressarcir. Conforme destacou o acórdão, “não há como se afastar o conhecimento prévio da seguradora da existência de cláusula compromissória no contrato de transporte marítimo de cargas objeto da apólice securitária” e, por isso, “tendo sido submetido o contrato previamente à seguradora, a fim de que analisasse os riscos provenientes do contrato garantido, dentre os quais foi ou deveria ter sido considerada a cláusula compromissória, inafastável o entendimento de que tal cláusula deve ser considerara como um dos elementos essenciais do interesse a ser garantido e do risco predeterminado”.

A temática é de extrema relevância não só para o mercado de transporte marítimo, mas também para outras relações negociais que envolvam seguro-garantia. O acordão em tela, abordando peculiaridades do seguro-garantia, abre margem para que seguradoras e tomadores discutam o direito invocado por elas, para se ressarcirem das indenizações prestadas, nas jurisdições previstas nos contratos principais, celebrados entre os tomadores do seguro e os segurados.

Esse entendimento não é pacífico. Existe divergência doutrinária e jurisprudencial sobre (i) a extensão da sub-rogação das seguradoras, (ii) os limites de transferência automática da cláusula compromissória e (iii) a diferenciação entre ciência e consentimento da cláusula compromissória para fins da submissão de terceiros não signatários a arbitragem.

O acordão proferido pela 3ª Turma do STJ, em 22 de março de 2022, no âmbito do Recurso Especial 1.962.113, decidiu, por exemplo, de modo bastante amplo, que “o instituto da sub-rogação transmite apenas a titularidade do direito material, isto é, a qualidade de credor da dívida, de modo que a cláusula de eleição de foro firmada apenas pela autora do dano e o segurado (credor originário) não é oponível à seguradora sub-rogada”. A recente decisão do STJ, todavia, abordando peculiaridades relevantes do seguro-garantia, pode ser invocada em litígios análogos, que não envolvam contrato de transporte, exigindo que o tomador do seguro e a seguradora, sub-rogada nos direitos de seu segurado, observem a via arbitral prevista no contrato principal que deu origem àquele seguro.

*Carlos Eduardo Staudacher Leal Carvalho é sócio da Área de Seguros da Toledo Marchetti Advogados.
**Lucas Russi Farah é associado da Área de Projetos e Arbitragem da Toledo Marchetti Advogados.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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