Marisa Wanzeller e Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA
Uma ação impetrada pela Eneva no STJ (Superior Tribunal de Justiça) sinaliza uma “onda de judicialização” contra o LRCAP (Leilão de Reserva de Capacidade) de 2025, disseram agentes do setor à Agência iNFRA. A Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres) sugeriu ao MME (Ministério de Minas e Energia) que cancele o certame caso os proponentes insistam nessa estratégia.
Por meio de cinco térmicas a gás, a Eneva entrou com um mandado de segurança na última segunda-feira (24) no qual pede a suspensão de uma regra que influencia diretamente na precificação dos projetos. A empresa questiona o chamado fator A, variável que diz respeito ao nível de flexibilidade das usinas e que influi no Preço de Disponibilidade de Potência.
Essa é a segunda ação judicial contra o certame, sendo que a primeira foi movida por térmicas a biocombustíveis, que conseguiram uma liminar para derrubar o teto do CVU (Custo Variável Unitário) do LRCAP.
Em nota divulgada nesta terça-feira (25), a Abrace alegou que as ações partem de grupos que “insistem em buscar benefícios específicos que comprometem o funcionamento do setor”. A associação afirmou ainda que está avaliando medidas jurídicas para garantir que o leilão só seja realizado se for “efetivamente competitivo”.
“O MME deveria demonstrar uma posição firme com olhar a todos consumidores e cancelar imediatamente a realização do leilão de contratação de capacidade em 2025 caso os empreendedores proponentes insistam nesta estratégia de judicialização para forçar uma contratação sem competição, cara, e que irá impor custos bilionários a todos brasileiros”, disse.
Fator A
A variável questionada pela Eneva faz com que usinas que demandam maior tempo para acionamento ou desligamento pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) tenham lances menos competitivos no leilão, já que teriam “fator A” elevado e isso afetará o valor total.
Segundo a Eneva, trata-se de “critério inédito” estabelecido pelo governo “sem a necessária realização de consulta pública prévia para sua discussão”. Assim, pede a suspensão da utilização da regra como componente de cálculo do Preço de Disponibilidade de Potência.
“Como há parcas informações sobre como o MME chegou à equação e aos índices que compõem o Fator A, há um risco real de que essa inovação introduza um viés indevido na definição do certame, que permitiria a contratação de empreendimentos e tecnologias que não entregarão, na realidade, o menor custo de energia ao consumidor final, gerando impactos deletérios na modicidade tarifária e na segurança de suprimento do sistema”, sustenta a empresa no pedido.
Já a Abrace defende a regra do fator A como um “um aprimoramento relevante” por ponderar de maneira mais eficaz se a usina térmica é flexível.
Eneva
Esse é o segundo embate da Eneva com o governo em torno do certame. A primeira portaria publicada pelo MME, ainda no final de 2024, vedava a participação de usinas com contratos firmados no ambiente regulado vigentes até a data de entrega do produto. Era o caso do Complexo Parnaíba, empreendimento da companhia.
As diretrizes só permitiam a participação de termelétricas já existentes para entrega de geração até 2027, ano em que terminam os contratos vigentes de algumas usinas da Eneva. A partir de 2028, só era permitida a participação de empreendimentos novos. Em janeiro, contudo, a portaria foi alterada, permitindo a participação das usinas da companhia.
MME desiste de recorrer
Enquanto isso, o MME decidiu não recorrer da liminar que atendeu térmicas a biocombustíveis e determinou a suspensão do teto do CVU (Custo Variável Unitário) estabelecido para o LRCAP, disseram fontes.
O entendimento da pasta sobre o CVU do certame se alterou e, por isso, não faria sentido recorrer da decisão. O MME cumpriu a liminar do STJ prorrogando o prazo para habilitação técnica das usinas para 31 de março e restabeleceu o teto original de R$ 2.636,99/MWh.
Na última semana, o ministro Alexandre Silveira disse que “há um completo desespero de todas as térmicas existentes” quando se faz um leilão de potência no país. “A térmica que não tiver sucesso em um leilão desse vai ter que ser descomissionada, custa caro, perdem-se todos aqueles ativos. Então é natural que haja essa angústia e essa judicialização”, declarou o ministro à imprensa.