Dimmi Amora, da Agência iNFRA
A suspensão das indicações do governo para os novos diretores da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), num processo que em 24 horas teve troca de nomes e cancelamento, indica que as agências reguladoras serão alvo de uma ferrenha disputa entre os representantes do Congresso e do governo, especialmente no ano que vem, quando os três diretores-gerais das agências reguladoras de transportes deixarão seus cargos.
Mário Povia, da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), e Mário Rodrigues, da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), terminam seus mandatos em fevereiro. No mês seguinte, Ricardo Botelho, diretor-geral da ANAC, encerra seu mandato junto com outro diretor da agência, Ricardo Bezerra. Serão, portanto, quatro vagas a serem preenchidas. Cabo ao presidente a indicação do diretor-geral entre os diretores com mandato.
Pelo lado do governo, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, não abre mão de indicar técnicos com conhecimento dos setores para esses cargos. Na visão dele, essas indicações são um dos alicerces para a política do governo de atrair investimentos privados para o setor de infraestrutura nos próximos anos, dando garantia de que as decisões desses órgãos terão qualidade e ficarão distante da influência de grupos privados ou até do governo.
Com esse argumento, ele próprio pediu a suspensão das indicações dos dois diretores da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), na última quinta-feira (3), um dia após o governo encaminhar ao Senado os nomes que tinham sido indicados por ele para o cargo, o secretário de Transportes do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), Thiago Caldeira, e o superintendente da ANAC Ricardo Catanant.
Após esses dois nomes saírem no Diário Oficial, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não gostou de as indicações não terem passado por seu crivo e atuou para trocar os nomes, conforme a Agência iNFRA mostrou em seu serviço de notícias urgentes por aplicativo. Para tentar evitar que fosse atribuída a mudança a um nome político, negociou a colocação de Gustavo Saboia no lugar de Catanant.
Saboia é chefe da Assessoria Internacional do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas. Servidor do Senado e técnico considerado de alta qualificação, ele não tem conhecimento específico da área de aviação civil como os outros dois indicados. O nome acabou sendo uma forma de criar constrangimento ao próprio ministro Freitas, por ser da equipe dele. Mesmo assim, Freitas decidiu não aceitar e pediu o cancelamento dos dois indicados.
A força de Davi
O presidente do Senado vem cada vez mais pressionando pela ocupação de espaço dentro do governo por indicados do setor político. Vinha se concentrando especialmente no setor de energia, conforme o boletim iNFRAEnergia, da Agência iNFRA, mostrou em diversas ocasiões. Houve pedidos de diretorias de estatais e órgãos do governo para apadrinhados políticos.
O poder natural que o presidente do Senado tem foi ampliado pelas decisões do presidente Jair Bolsonaro, entre elas a de indicar o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), seu filho, para embaixador dos EUA, cuja aprovação precisa de aval do Senado. Por isso Alcolumbre tem cada vez mais pressionado o governo a entregar cargos para indicação política.
As decisões da agência
A troca de Catanant por Saboia levou a um grande desconforto entre os servidores da agência e também não foi bem recebida por empresas do setor que enviaram recados ao ministro Tarcísio de Freitas. Catanant é atual superintendente de Acompanhamento de Serviços Aéreos da ANAC e passou por vários cargos dentro da agência onde entrou no primeiro concurso público, em 2007. Advogado de formação, ele se especializou em aviação civil.
Nos últimos anos, ele tem liderado temas importantes na agência, como a Resolução 400, que trata dos direitos e deveres dos passageiros e ficou conhecida como a resolução da franquia de bagagem, e a abertura do setor a capital estrangeiro. No dia seguinte à troca, ele foi para a Argentina negociar o acordo de céus abertos com o país vizinho, assunto sobre o qual é um dos principais conhecedores.
A demora em nomear os diretores da ANAC já tem impactos na agência. Como ela está com apenas três dos cinco diretores, somente decisões por unanimidade podem ser tomadas. O número de reuniões de diretoria e de decisões tomadas vem diminuindo. Se a disputa não se encerrar até o novo nome ser aprovado no Senado, ela corre o risco de ficar sem poder tomar decisões.