Marisa Wanzeller, da Agência iNFRA
A Engie Brasil não visualiza investimentos em novos projetos renováveis no momento e defende que a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) avance na regulação dos cortes de geração, o chamado “curtailment”. O diretor de Regulação, Estratégia e Comunicação da companhia, Gabriel Mann, disse em entrevista à Agência iNFRA que a reforma do setor elétrico promovida pela MP (Medida Provisória) 1.304 – sancionada na Lei 15.269/2025 – representa “uma evolução”, mas que o cenário ainda é bastante desafiador.
“A gente tem hoje uma previsão de ser recuperado parte do curtailment do passado, e parte do curtailment daqui pra frente. A ANEEL vai ter que regulamentar muita coisa após a lei, temos esse cenário um pouco melhor, mas que é um cenário que não resolve o problema. Continua, na nossa visão, sendo muito difícil implantar novos projetos de renovável, de eólica e de solar, sobretudo”, disse o executivo.
A empresa obteve a revogação de outorga de quatro projetos solares no Rio Grande do Norte no último mês. O pedido foi feito ao perceber que os projetos não teriam viabilidade econômica dentro do horizonte esperado. “A gente pediu a revogação, porque senão a gente começa a entrar em descumprimento com a autorização”, explicou o diretor.
Apesar do impacto do curtailment, Gabriel Mann diz que a Engie consegue “balancear o risco” por ter um portfólio diversificado, com grande parte de geração hidrelétrica.
“[Para] um gerador que só tem solar é muito mais difícil, [para] um gerador que só tem eólica é muito mais difícil, mas para um gerador como a gente, que tem um portfólio muito diversificado, a situação ainda é um pouco suavizada, mas mesmo assim, novos projetos não fazem sentido”, diz.
Geração distribuída
Para mudar o cenário, a empresa tem defendido que a regulação continue evoluindo e inclua a geração distribuída no rateio dos custos do curtailment. “A MMGD tem tido um crescimento muito grande, desenfreado na nossa visão, e não é possível de ser cortada. Com isso, aumenta a necessidade de cortar os grandes geradores e aumenta o curtailment”, comentou o diretor.
Outra medida necessária, na visão do executivo, é que a tarifa paga pelos geradores distribuídos leve em conta a lógica horária: “a gente entende que essa lógica deveria ser aplicável também para os geradores que têm geração distribuída, dado que o preço [da energia] hoje no Brasil já é um preço horário, já tem um PLD [Preço de Liquidação das Diferenças] horário. Ele já valora de maneira diferente a energia ao longo das horas e a tarifa desses geradores que têm a geração distribuída deveria também levar isso em conta”.
Sinal locacional
Gabriel Mann avalia que o cenário de curtailment no Brasil pode se agravar se o Congresso Nacional aprovar o PDL (Projeto de Decreto Legislativo) 365/2022, que susta norma da ANEEL que estabeleceu o sinal locacional na tarifa de transmissão de energia elétrica.
A medida implantada pela reguladora faz com que os geradores paguem o uso do fio de forma proporcional à distância para onde entregam a energia. Por outro lado, reduz a tarifa dos consumidores localizados próximos às usinas.
Mann aponta que reverter essa lógica encareceria a tarifa para os consumidores nas regiões onde há mais sobreoferta de energia, como o Nordeste, levando a uma redução da demanda e aumento dos cortes de geração. Ele também destaca que, à medida que a conta de luz do consumidor regulado aumenta nessas localidades, a instalação de placas solares nas residências e comércios é incentivada. “Vai tornar mais viável ainda a geração solar distribuída, a MMGD, que na nossa visão, é uma das causas do problema do curtailment”, disse.
O diretor destaca que, para a Engie, o sinal locacional não foi um fator de desincentivo a novos investimentos, como argumentam os defensores do PDL 365, ao contrário do curtailment.
“O fato é que, nesses três anos que nós temos de vigência de sinal locacional, ninguém deixou de colocar projeto por conta disso. A gente deixou de colocar projeto por conta do curtailment. O curtailment, por exemplo, está machucando muito e inviabilizando novos projetos. A gente mesmo segurou uma série de projetos que a gente tinha”, afirmou.
Apesar de aumentar o custo para geradores no Norte e Nordeste, regiões distantes dos grandes centros de consumo e onde a Engie também possui empreendimentos, a empresa entende que a norma da ANEEL agregou “racionalidade técnica e econômica na questão das tarifas de transmissão”.
O PDL foi aprovado em outubro de 2023 na CI (Comissão de Serviços de Infraestrutura) do Senado e avançou para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), onde será deliberado de forma terminativa. Pautado no colegiado no início de novembro, o projeto está sob pedido de vista e não há expectativa de ser deliberado ainda neste ano.








