Distribuidoras apoiam proposta para abrir o mercado e consumidores pedem para adiar

Leila Coimbra e Alexandre Leoratti, da Agência iNFRA

Chegou ao fim uma das Consultas Públicas mais importantes do setor de energia elétrica deste ano, a CP 131/2022, que propõe a abertura de todo o mercado consumidor ligado em alta tensão a partir de 1º de janeiro de 2024, com resultados no mínimo interessantes.

Algumas distribuidoras de energia – que hoje possuem o direito exclusivo aos consumidores cativos – tiveram uma postura pró-mercado e apoiaram a proposta feita pelo Ministério de Minas e Energia de maior competição. 

Dentre elas a EDP, a Cemig, a Enel e a Equatorial. Esta última diz que a abertura de todo o seu mercado, inclusive o de baixa tensão (consumidores residenciais e rurais) a partir de 2028, “é adequada”.

Já as associações que representam os grandes consumidores de energia, que teoricamente seriam os mais beneficiados com o direito de escolha, por sua vez, adotaram uma postura mais conservadora e pediram que o cronograma seja mais lento do que o proposto inicialmente. Foram menos progressistas do que as concessionárias de distribuição, de onde se esperava a reação menos favorável à proposta.

A Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres) pediu o adiamento em dois anos de cada marco da proposta original do MME. Seria “mais prudente que a abertura adicional para o Grupo A se dê a partir de janeiro de 2026; a partir de janeiro de 2028 para o grupo B não residencial e não rural e, por fim, a partir de janeiro de 2030 para o Grupo B residencial”, escreveu. 

A associação justifica sua posição dizendo que, entre 2023 e 2025, muitos contratos feitos no ambiente das distribuidoras serão finalizados, levando a uma natural descontratação, e que as eventuais sobras serão tratadas por meio de outros mecanismos a serem definidos na esperada aprovação da modernização do setor elétrico.

A Anace (Associação Nacional dos Consumidores) também sugere que parte do grupo de alta tensão só possa comprar energia no mercado livre a partir de 2026, e não em 2024. “De modo a evitar riscos de sobrecontratação das distribuidoras, sugerimos uma abertura de mercado mais moderada, ajustando o ritmo de abertura ao volume de energia contratada”, diz a entidade.

Distribuidoras: opiniões diferentes
No caso das concessionárias de distribuição, porém, não há consenso a respeito dos prazos para abertura do mercado, defendida principalmente pelas comercializadoras de energia. Algumas apoiaram o cronograma proposto pelo governo, mas há também quem defenda a prorrogação.

Além da Equatorial, outras empresas disseram que apoiam que os seus clientes possam migrar a partir de 2024, desde que sejam tomadas algumas medidas para que isso ocorra de forma equilibrada.

A Cemig, por exemplo, diz que a livre escolha para toda alta tensão “será um importante passo rumo à modernização do setor elétrico brasileiro e permitirá que o consumidor tenha liberdade de escolha, atendimento e preço”; e que “o mercado já está preparado para receber os consumidores do grupo A e concorda com a minuta de portaria apresentada”. 

O Grupo Enel afirmou que apoia a saída dos consumidores do grupo A, de acordo com a proposta do governo, “mas que a abertura do mercado para os demais consumidores (grupo B) se dê preferencialmente por vias legais”. 

A companhia acrescenta que “é importante que a competição almejada seja impulsionada pela busca da eficiência, e não pela busca de benefícios individuais e socialização dos custos”.

Já a EDP, que também apoia a saída da alta tensão em 2024, propõe um cronograma para abertura integral do mercado em até cinco anos, sendo implantado em um ano um “programa de conscientização dos consumidores, desenvolvimento da segurança de mercado e início da separação fio e energia”.

Quer a criação do centralizador de contratos e SUI (Supridor de Última Instância) em um prazo de dois a três anos, mercado de capacidade e a separação total de fio e energia. “Por fim, no longo prazo o desenvolvimento de um sistema robusto de garantias”, diz a distribuidora. 

“A EDP parabeniza e concorda com a proposta do MME para a possibilidade de migração do Grupo A a partir de 2024. Contudo, apresenta alguns desafios enfrentados para a migração destes consumidores, que requerem atenção”, conclui.

Abradee
A Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica) diz que a expansão do mercado sem a aprovação de dispositivos do PL 414/2021 resultará em aumento tarifário a partir de 2024. Segundo a associação, a sobrecontratação resultante dos contratos legados e da migração de consumidores trará, em 2024, R$ 5,5 bilhões de custos adicionais para os consumidores regulados remanescentes. 

Em sua contribuição para a consulta pública, a associação diz que existe na carteira das distribuidoras um legado de contratos para atender ao mercado regulado que vai até pelo menos 2055, com parcela relevante dos contratos, com vigência até 2040. Apesar disso, a abertura do mercado aos consumidores com demanda inferior a 0,5 MW, como propõe a minuta de portaria apresentada na consulta pública, abre espaço para “potenciais novas migrações”, que, nas simulações da Abradee, podem chegar a 5,45 GWm (gigawatts médios)

“Embora os valores sejam projeções, com pequenas diferenças conforme as premissas adotadas, fato é que a abertura do mercado livre ao grupo A em 2024 reduzirá em algum grau o mercado das distribuidoras, agravando o cenário de sobrecontratação atual”, defendeu a associação na consulta pública. 

“Quando temos essa fala de que o consumidor foi ao mercado livre e economizou milhões ou bilhões, ele não economizou energia, mas apenas repassou o custo para os consumidores que ficaram para trás. Entendemos que isso é injusto e não é adequado do ponto de vista de política, além de bagunçar todos os sinais de preço do setor elétrico”, afirmou Ricardo Brandão, diretor-executivo da Abradee.

A associação propõe para a consulta pública que, como requisito à migração, os consumidores que optarem pelo mercado livre deverão arcar, mediante componente tarifária cobrada na proporção do consumo de energia elétrica, com os custos remanescentes das operações financeiras contratadas para “atender à finalidade de modicidade tarifária e dos encargos tarifários incidentes exclusivamente sobre os consumidores regulados”.

Outra proposta é que não deve ser definida data para abertura do mercado aos consumidores do grupo A até que as medidas do PL 414/2021 sejam regulamentadas e normatizadas.

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