Guilherme Mendes, da Agência iNFRA
O diretor-geral da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), André Pepitone, calculou em cerca de R$ 2,79 bilhões o impacto da crise financeira causada pela Covid-19 no setor no mês de abril. A afirmação foi feita durante o iNFRADebate Live, ocorrido na última sexta-feira (8).
“Nós tivemos em abril um valor faturado das distribuidoras de R$ 20,2 bilhões, mas o efetivamente arrecadado foi de R$ 17,5 bilhões”, disse Pepitone. Assista à íntegra abaixo:
O diretor-geral da agência apresentou números que foram colhidos pelo GMSE (Gabinete de Monitoramento da Situação Elétrica), instaurado para analisar diariamente os indicadores do setor durante a pandemia. Para apurar esse valor, Pepitone somou cerca de R$ 2 bilhões em inadimplência em abril causada exclusivamente em decorrência da pandemia, mais os R$ 795 milhões em queda de faturamento no setor.
Segundo os dados do mês de abril do GMSE, o setor elétrico teve uma inadimplência de 13,19%, sendo que 9,91% desse débito ocorreu por conta da Covid-19. No mês de abril, o total faturado foi de R$ 17,5 bilhões, com uma inadimplência próxima a R$ 2,66 bilhões – inclusas as inadimplências correntes do setor e as extraordinárias causadas em decorrência da crise do novo coronavírus.
Pepitone afirmou que o impacto traz uma série de problemas ao setor, como sobrecontratação e fluxo de caixa, mas que o órgão regulador terá de demonstrar serenidade nas decisões tomadas. “Buscamos uma solução de maior convergência possível, no sentido que queremos mitigar riscos jurídicos”, afirmou o diretor-geral. “O cristal do setor, que não pode ser arranhado, é o respeito aos contratos. Todas as soluções têm de passar por isso.”
Ainda sem detalhes, decreto deve sair nesta semana
Perguntado sobre o empréstimo destinado a dar liquidez ao caixa das distribuidoras, Pepitone se mostrou confiante na publicação iminente do decreto que dará diretrizes à operação. “Estamos em conversa muito avançada, desde a quinta-feira, conclusiva, com o segmento de distribuição e bancos, para termos segurança que o decreto seja editado na próxima semana”, garantiu. O diretor-geral da agência, porém, evitou entrar em detalhes sobre o texto.
Mas um dos temas aparentemente definidos é que o valor do crédito será menor do que o inicialmente esperado, de R$ 17 bilhões: “Estamos trabalhando com perspectivas menores que R$ 17 bilhões”, apontou. Ele ressaltou que os valores terão impactos mínimos nos balancetes das empresas. “Será, porém, uma operação off-balance, sem impacto nos caixas das distribuidoras, geridas pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) e com ativos regulatórios.”
Ao responder uma dúvida de um assinante da Agência iNFRA sobre quais seriam esses ativos, Pepitone deu algumas pistas: “Posso dizer que temos que formar esse ativo financeiro, e foi uma discussão para como seria formatado, e avançamos pelo caminho de ativos formatados pelo setor de distribuição”. Seriam ativos financeiros formados do último reajuste tarifário até dezembro de 2020, assim como a parcela do CVA (variação, entre os reajustes tarifários anuais, de parte dos itens de custo das distribuidoras, como a compra de energia elétrica da usina de Itaipu e alguns encargos tarifários do setor elétrico) contabilizado pelas empresas. Como tais ativos já constam nas contabilizações das empresas, a ANEEL acredita no aumento da previsibilidade da operação.
O empréstimo, como tem sido aventado nas últimas semanas, seria feito por um pool de bancos, capitaneados pelo BNDES. O cenário de juros em patamares historicamente baixos, na casa de 3%, trazem um prospecto positivo na visão do diretor-geral. “Em vez de se reverter em um tarifaço, será um amortecedor tarifário”, afirmou.
Revisão de carga e fim das térmicas a gás
A média da queda na carga demandada no Brasil, segundo dados do GMSE, foi de 20% por conta da pandemia do Covid-19. Na região Norte, a queda, foi de 11%; no Nordeste, de 15%, e no eixo Sul-Sudeste, de 21%.
Com isso, a ANEEL deverá promover uma revisão extraordinária da carga do país, para que a carga se adeque a esta nova realidade. De acordo com Pepitone, a demanda deverá ser de 61,4 GWm (gigawatts-médios) em maio, e 62,1 GWm em junho. Em julho, os esperados 67,8 GWm devem se reverter em 65,3 GWm. “Em julho, voltaremos aos patamares de maio-junho”, afirmou Pepitone.
A mudança de conjuntura “potencializa interesses” de descontratar usinas térmicas de alto custo e baixa eficiência energética. “[Esta é uma] oportunidade única de descontratar térmicas de CVU alto, de maneira negociada”, apontou Pepitone. A ANEEL estaria testando a proposta em um projeto envolvendo a Ceron (Centrais Elétricas de Rondônia), hoje Energisa Rondônia, e a usina Termonorte.
Se bem-sucedido, pode ser sinal de passos mais largos na descontratação em prol de uma geração mais eficiente. “A descontratação da Termonorte vai implicar em redução da tarifa local e na redução da conta CCC. É um caso específico, um projeto piloto que, se bem-sucedido, pode avançar com essa descontratação de térmicas no país inteiro”, afirmou.