Novo fracasso do leilão da BR-381 impõe reflexões ao país

Agnaldo Brito*

O novo fracasso do governo federal em viabilizar o leilão de concessão do trecho da BR-381, em Minas Gerais, revela uma incômoda questão para o conjunto da infraestrutura nacional. Mais: exige avaliação mais realista sobre a modelagem atual de concessões no país.

A questão que surge é a seguinte: como um trecho de rodovia com mais de 300 quilômetros, com diversos problemas estruturais e de sinalização, geometria antiga e perigosa e, principalmente, um tráfego de caminhões e veículos de dar inveja a muitas concessões Brasil afora não tem viabilidade econômico-financeira? Onde está o problema? Como resolver de vez?

Alguém poderá dizer que grupos de infraestrutura estão boicotando o governo e “propositadamente” evitando participar de novos leilões até que sejam resolvidas as pendências contratuais, que estariam em fase de “otimização”.

Isso não é fato. Ninguém com algum conhecimento em infraestrutura desprezaria um projeto que exige bilhões em investimentos e que recebe diariamente milhares de veículos leves e pesados. Além disso, ter uma população de milhões de pessoas ansiosas por uma rodovia que ofereça mais segurança e serviços de apoio àqueles que a utiliza.

A esta altura, depois de tudo, não é razoável imaginar que o projeto da BR-381 não seja atrativo e não alcance uma TIR (Taxa Interna de Retorno) adequada, que no edital estipula um retorno de 9,88% ao ano. Estamos diante de algo muito, muito fora de contexto. A alcunha de “rodovia da morte” segue sendo a legenda desse trecho mineiro da BR-381, lamentavelmente.

A desistência de tantos grupos que já operam rodovias hoje no Brasil não decorre do acaso. A proposta desenhada e posta no edital pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) previa um mecanismo de segurança, para evitar “aventureiros” – grupos que eventualmente poderiam oferecer deságios elevadíssimos, mas que, em decorrência disso, inviabilizaria o equilíbrio econômico-financeiro do projeto.

É justo evitar problemas futuros, mas exigir aportes complementares (para além dos R$ 426,3 milhões) ao capital da concessão em caso de descontos elevados no leilão não contribui para inviabilizar o projeto?

Também é preciso pensar nas dimensões das concessões. Trechos de 300 quilômetros e mais de R$ 6,23 bi de CAPEX em uma única concessão fazem sentido ainda? Duas concessões de 150 quilômetros e um Capex (Capital Expenditure ou Investimentos em Bens de Capitais) melhor dimensionado e distribuído no tempo por critério de demanda do tráfego não seriam mais exequíveis? O tamanho dos investimentos, face a limitação tarifária versus seu tráfego, a concessão é de fato uma questão, não apenas financeira, mas de estruturação econômico-financeira.

A engenharia financeira necessária para viabilizar a obtenção do financiamento (primeiro o empréstimo-ponte e depois o de longo prazo), considerando o custo de capital que temos hoje no Brasil, não é tarefa trivial, sobretudo quando estamos mobilizando gente e capital para obras de grandes dimensões. Outro problema.

Não são poucos os relatos sobre o subestimado tamanho do investimento estimado e que é inserido no edital. A adoção de preços-unitários defasados é um problema antigo e que ainda gera divergências. Com tantos anos do programa de concessões, essa é uma discussão que já deveria ter sido vencida.

O licenciamento ambiental que deverá ser todo coordenado pela concessão, um processo difícil no Brasil. Além de desapropriações que segundo estimativa atinge R$ 560 milhões ao longo do trecho, bem como o reassentamento que eventualmente seja necessário. Por fim, prazos travados para o cumprimento de uma série de obrigações, embora nem todos estejam sob o controle da concessão. Tudo somado, o que estamos fazendo com o nosso programa de concessões de rodovias, que avançou muito nos últimos 35 anos e que patina nas sinuosas pistas da BR-381?

Inovações postas no edital, exemplo àquelas implementadas na concessão da rodovia Presidente Dutra e da BR-101 no Rio de Janeiro, estavam incluídas e seriam muito importantes para avanços no programa de concessões.

A paralisação, mais uma vez, do leilão da BR-381 é um prejuízo ao país e ao setor de infraestrutura no Brasil. Perde o governo, perdem os grupos privados, perdem sobretudo as populações de Minas Gerais, Espírito Santo e São Paulo, que seguirão enfrentando uma rodovia perigosa e insegura sabe-se lá por quanto tempo.

É justa e necessária uma reflexão de toda a comunidade da infraestrutura brasileira, entes públicos e privados, organizações que lutam e militam no setor. O novo fracasso do leilão da BR-381 não pode ser compreendido como normal. Algo muito errado está acontecendo.

*Agnaldo Brito é consultor e diretor da Infracomunicação.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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