Edgard Porto*
Os investimentos em ferrovias têm um potencial significativo para o desenvolvimento regional, oferecendo uma solução estratégica para reduzir as desigualdades entre as diferentes regiões do Brasil. Em 2002, o Nordeste representava 13,08% do PIB brasileiro e, passados 20 anos, evoluiu para apenas para 13,7%. Historicamente, a falta de infraestrutura eficiente tem dificultado a integração territorial e o crescimento econômico de regiões mais distantes dos grandes centros urbanos, especialmente nas áreas do interior do país. Ao investir em redes ferroviárias, o Brasil pode facilitar o escoamento de mercadorias, atraindo novos investimentos e promovendo a industrialização em locais que antes eram marginalizados.
As ferrovias também têm a capacidade de fomentar o desenvolvimento de clusters industriais, especialmente em regiões como o Nordeste. O estado da Bahia, por exemplo, destaca-se como uma área com capacidade para formar um cluster industrial de classe mundial, mesmo que de médio porte, apoiado por uma organização espacial do complexo portuário da Baía de Todos os Santos. A expansão da malha ferroviária na região poderá não apenas reduzir o custo do transporte no Brasil, mas também conectar essa área com o resto do país e com o mercado global, impulsionando seu crescimento econômico.
A requalificação das ferrovias de ligação de Minas Gerais com a Bahia, com bitola larga, articulada com o eixo da Fiol-Fico, em Mara Rosa e com a FNS (Ferrovia Norte Sul), é uma necessidade premente para se pensar o Brasil de forma mais equilibrada, onde o desenvolvimento das regiões mais afastadas dos grandes centros econômicos do Sul-Sudeste contribua para um crescimento nacional mais equitativo.
Um fator importante no desenvolvimento regional é a expansão do agronegócio, que está avançando em direção ao norte do Brasil, particularmente no Pará, Mato Grosso e Amazônia. Embora essa expansão represente uma oportunidade econômica significativa, é imprescindível que ocorra com responsabilidade ambiental. A preservação da Amazônia e de outros biomas sensíveis deve ser prioridade nas políticas de desenvolvimento, especialmente porque o desmatamento pode comprometer a sustentabilidade em longo prazo.
A mudança dos eixos de produção agrícola também está alterando as rotas de escoamento dos produtos, que agora se direcionam para o Norte e o Nordeste, com destaque para a Bahia. Essa transformação geoeconômica gera oportunidades para o desenvolvimento da infraestrutura logística nessas áreas, particularmente as ferroviárias, que podem conectar regiões produtoras aos portos e mercados internacionais.
Outro fator essencial no cenário do desenvolvimento econômico brasileiro é a relação comercial com a China, que, nos últimos anos, superou as relações comerciais com a Europa. Segundo o artigo “’Reindustrialização’: Novas oportunidades de cooperação entre China e Brasil”, a China é o maior parceiro comercial do Brasil por 15 anos consecutivos e o volume de comércio bilateral ultrapassou US$ 100 bilhões por seis anos consecutivos. A China se tornou um parceiro econômico fundamental para o Brasil, e seu projeto da Nova Rota da Seda pode representar uma oportunidade para o país se inserir mais estrategicamente no comércio global. O projeto pode reduzir os custos de circulação de mercadorias, facilitando as atividades comerciais e, ao mesmo tempo, abrindo portas para novos investimentos industriais.
A relação com a China também pode contribuir para o desenvolvimento da infraestrutura, como as ferrovias, que são essenciais para melhorar a competitividade brasileira. Com a parceria chinesa, o Brasil pode aproveitar novas oportunidades de investimentos que permitam a criação de uma malha logística mais eficiente, conectando melhor as regiões do país entre si e com o mercado internacional.
Estudos realizados recentemente pelo Governo da Bahia identificaram projeções de todos os tipos de cargas de passagem e com origem local que perfazem uma média de 110 milhões de TEUs em cada uma das direções: Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e para o exterior. O incremento a essa circulação de mercadorias vai potencializar o sistema de transportes rodoferroviário que terá influência sobre 132 municípios, que hoje representam quase que 73% do PIB baiano, 21% do PIB do Nordeste e onde habitam 56% da população estadual.
Esse esforço pode resultar na atração de partes de cadeias de valor global para o entorno do Complexo Portuário da Baía de Todos os Santos e na promoção da interiorização do desenvolvimento de grande parcela territorial nordestina. Tudo isso repercutirá nas economias do Sul-Sudeste, reduzirá a área marginalizada do Nordeste e incrementará o crescimento do Centro-Oeste brasileiro.
Já está operando uma rota regular Bahia-Ásia, com navios de grande porte, com 366 metros, ligando o Porto de Salvador aos portos chineses, sem restrições de horário, podendo atracar ou desatracar inclusive durante à noite, com capacidade para transportar 15 mil TEUs. Recentemente a MSC adquiriu o Terminal da Wilson Sons e comandará toda essa operação. Isso é uma demonstração de viabilidade dessa rota que poderá ser fortemente potencializada com a construção de ferrovias articulando o Complexo Portuário da Baia de Todos os Santos com outras regiões do Brasil.
O desenvolvimento do Nordeste brasileiro pode ter impactos positivos para outras regiões, especialmente o Sudeste. Ao atrair novos projetos industriais, o Nordeste pode fortalecer a atração de investimentos, reforçar suas cadeias produtivas e possibilitar uma maior integração econômica com o Sudeste, região historicamente mais industrializada, criando uma rede de interdependência produtiva que beneficiaria ambas as regiões.
Diante disso, a aposta em infraestrutura ferroviária é uma estratégia essencial para promover o desenvolvimento regional no Brasil, conectando as diversas regiões do país, e fomenta um crescimento econômico mais sustentável e equitativo.
Esse é um dos mais importantes e estratégicos projetos para o Brasil.
* Edgard Porto é diretor de Estudos da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.