Sem negociação com Ministério da Infraestrutura, Economia propõe abertura geral a portos secos

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O Ministério da Economia finalizou proposta para uma medida provisória para ampliar, via autorização, os chamados “portos secos”, recintos alfandegados nas áreas secundárias (distantes de portos ou aeroportos, por exemplo). A proposta foi enviada à Casa Civil da Presidência para publicação.

O texto – de acordo com uma versão obtida pela Agência iNFRA – propõe que esses recintos possam ser autorizados pela Receita Federal do Brasil para quem cumprir requisitos simples. Ela também regulariza dezenas dessas empresas que foram criadas nos últimos anos em duas medidas provisórias não votadas no Congresso e cria uma nova taxa para as empresas que movimentam cargas.

A justificativa apresentada para a urgência de criar uma medida provisória sobre o tema é que, segundo o documento, cerca de 20 portos secos do país, feitos por regime de concessão ou permissão previstos na lei 9.074/1995, já estão com seus contratos vencidos ou vão vencer até 2025. 

Segundo a justificativa apresentada, fazer licitações previstas na lei é um processo “moroso e burocrático” e pode acarretar “demandas judiciais”. Diz ainda que a Receita Federal não tem condições de fazer estudos de viabilidade e que o regime da lei dos portos secos não está em consonância com o princípio da “livre concorrência”. 

Outro problema a ser resolvido, segundo a justificativa apresentada, é que a nova medida provisória criaria um sistema isonômico para unificar os portos secos e os Clias (centros logísticos e industriais aduaneiros), que são também portos secos, mas com outro nome, criados pelas medidas provisórias emitidas em 2006 e 2012 e não votadas.

Economicamente, a defesa é que os recintos em zona secundária aumentariam a fluidez no comércio exterior do país, eliminando “gargalos logísticos” em portos, aeroportos e zonas de fronteira, o que vai de encontro a discursos do atual ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, que tem repetido que os portos não são mais um “gargalo” para o país. 

Sem interação
Essa medida provisória vem sendo gestada desde o ano passado. Mas, mantendo o padrão desde o início do atual governo, os ministérios da Economia e da Infraestrutura tiveram pouca ou nenhuma interação sobre o tema. 

As arrendatárias de terminais portuários, que venceram licitações para fazer investimentos para receber navios de grande porte, foram ao Ministério da Infraestrutura para ter informações sobre os impactos que essa medida provisória teria em seus contratos, mas receberam pouca ou nenhuma informação.

Servidores responsáveis pelo setor portuário, inclusive na agência reguladora responsável, também não tinham conhecimento sobre o tema, de acordo com relato de três envolvidos.

Diálogo na Casa Civil
Após as consultas, os representantes do Ministério da Infraestrutura iniciaram um diálogo com a Casa Civil, com reuniões previstas esta semana, para tratar do tema. A ideia é que, como o projeto afeta o setor portuário, o Ministério da Infraestrutura possa avaliar e apresentar seu parecer.

De acordo com um responsável por terminal arrendado num grande porto do país, que pediu para não ser identificado, o impacto das medidas que estão propostas poderá ser severo sob os contratos atuais, afetando inclusive a decisão de investimentos no setor, especialmente no de terminais de contêineres e até mesmo nas novas concessões.

Isso ocorre pela característica do comércio exterior nacional. O Brasil é um país com baixa exportação de produtos industrializados (e alta importação). Além disso, há um grande número de terminais espalhados pelo país. Isso faz com que o volume de contêineres movimentados seja, em alguns casos, abaixo do que é recomendado para que um terminal “molhado”, onde navios atracam os navios, tenha a produtividade adequada para custear os elevados investimentos necessários ao seu funcionamento.

Além disso, a crise dos últimos anos criou uma ociosidade elevada na maior parte dos terminais de contêineres – exceção aos que têm armadores (donos de navios) como seus proprietários, o que é a minoria.

Mercado
Por essas características, parte considerável das receitas de terminais de contêineres, que pode chegar a mais de 50%, vem da armazenagem de contêineres e outros serviços prestados (em países com mais exportação de industrializados, esse percentual em geral é bem menor). 

É nesse mercado que os portos secos (Clias ou agora A2) concorrem com os terminais “molhados”, mas em condições diferentes, já que os investimentos são mais baixos por não precisarem ter os equipamentos para a operação dos navios.

Com a ampliação indiscriminada proposta na minuta de medida provisória, as empresas do setor portuário temem que parte dos terminais de contêineres com acesso a navios fiquem inviabilizados, porque teriam dificuldades para repassar preços, já que cobram de armadores (donos de navios) pelos serviços que não são de armazenagem.

Mobilização
Por isso, há uma mobilização da chamada Coalizão de Associações Portuárias, que reúne as principais entidades de representação das empresas portuárias do país, para que a medida provisória passe por um processo de avaliação de impactos para o setor, o que não foi feito até o momento.

Uma carta foi assinada pelos presidentes de todas as associações alertando para os problemas que a medida poderá gerar no setor. Eles pedem para que, antes da edição, seja feita uma avaliação de impacto econômico e regulatório, alertam que as ineficiências já apontadas em acórdão do TCU (Tribunal de Contas da União) vão se agravar e que poderá haver impacto nos investimentos estimados para o setor nos próximos anos.

Consultado, o Ministério da Economia não respondeu.

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