Roberto Rockmann*
Com previsões do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) de que a energia armazenada nos reservatórios encerre o ano com patamares superiores a 50%, melhor nível dos últimos onze anos, e chuvas acima da média nesses dias que antecedem o verão, bancos e gestoras começam a reduzir ainda mais os preços de 2023 do PLD (Preço de Liquidação de Diferenças), referência do mercado livre. Cotações mais baixas pressionam a geração de caixa das geradoras e poderão ter impacto sobre seu nível de endividamento.
PLD abaixo de R$ 100 em 23
Em relatório, analistas do Bradesco BBI apontaram existir um excesso de oferta equivalente a 10%-12% da demanda até 2027 e que as projeções do preço da eletricidade para 2023 caíram de R$ 140 o MWh para cerca de R$ 100/MWh. Também enxergam sinais de fraqueza nos preços para 2024. Há consultorias que estimam números ainda mais baixos, com um PLD de R$ 70 o MWh no primeiro semestre e encerrando 2023 abaixo de R$ 90 o MWh.
“O leilão A-1 de energia existente, realizado no início de dezembro, terminou com preço médio de venda de R$ 99,8/ MWh, ante o preço inicial de R$ 140/ MWh, o que representou um deságio de 28,72%. Isso é um bom teste, ainda mais que o leilão de energia regulada sempre opera com valores mais altos”, diz um executivo. Já para o Leilão de Energia Existente A-2, o preço médio ficou em R$ R$ 131,95/MWh, alcançando deságio de 12,03%.
Muitos bancos e gestoras ainda trabalham com valores acima de R$ 120 o MW em 2023 e de R$ 150 o MWh nos próximos anos. “Ainda tem uma parte com planilha a R$ 150 o MW em contratos de cinco anos”, diz um gestor. Poderão ter de reavaliar sob o cenário atual e incertezas que poderão ter impacto. Isso coincide com o fato de que a Eletrobras a partir do próximo ano terá parte de sua energia liberada para venda no mercado livre.
Maior volume de água em 11 anos
Esse cenário de hidrelétricas com reservatórios no nível mais elevado em 11 anos e sobreoferta ainda poderá ser alterado por duas variáveis. Uma cujo desfecho será conhecido em breve: o andamento do PL (Projeto de Lei) 2.703/2022, que pode ser aprovado no Senado nesta quarta-feira (14) e pode elevar o ritmo de crescimento da GD (geração distribuída) solar, que, a depender da decisão, poderá chegar a 25 GW em 2023, com efeitos incertos sobre o portfólio das distribuidoras e sobreoferta.
Outra variável relevante é a tentativa do novo governo de mudar a Lei 14.182, que autorizou a capitalização da Eletrobras, mas contratou 8 GW de térmicas. O gabinete de transição já deu sinais de que quer evitar a contratação dessas térmicas.
Em paralelo, podem ganhar força as pressões para o desenvolvimento do mercado de flexibilidade, que poderia render receita extra para empresas que terão preços mais baixos de venda de energia. Na sexta-feira, o governo lançou a CP (Consulta Pública) 145/2022, cujo objetivo é ampliar discussões sobre serviços ancilares.
Poderá ser o impulsionador do desenvolvimento do mercado de flexibilidade. Hoje hidrelétricas e térmicas podem oferecer controle de tensão e atendimento ao horário de ponta, serviços ainda não precificados.
*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.
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