Marília Sena e Amanda Pupo, da Agência iNFRA
A CI (Comissão de Infraestrutura) do Senado aprovou nesta terça-feira (9) o PDL (Projeto de Decreto Legislativo) 203/2025, que suspende um dos artigos da Portaria 689/2024 do Ministério dos Transportes, responsável por estabelecer requisitos e procedimentos de projetos prioritários para emissão de debêntures incentivadas e de infraestrutura nos setores rodoviário e ferroviário.
A discordância dos senadores foi sobre o artigo 4º do texto. Ele prevê que os projetos ferroviários autorizados só poderão acessar recursos por meio de debêntures incentivadas caso já possuam licença ambiental prévia, uma exigência adicional às ferrovias autorizadas em relação ao que é cobrado das concessões ferroviárias.
A regra foi elaborada após o Ministério dos Transportes ouvir os setores em consulta pública e teve como base uma previsão do decreto de 2022 que regulamentou a lei responsável por permitir a existência de ferrovias privadas (autorizadas) no Brasil. Um dos artigos prevê que a autorização de um traçado é cassada se não obtiver num determinado prazo a licença ambiental. Ou seja, antes desse procedimento, ainda faltam garantias de que o projeto vai poder sair do papel. A pasta argumenta que a exigência colocada na portaria foi uma forma de evitar que bilhões sejam emitidos para financiar uma ferrovia sem o compromisso de que ela efetivamente será construída.
“Como que eu vou permitir a emissão de bilhões de reais em títulos com incentivos fiscais no mercado de capitais se depois, daqui um ano, esse contrato pode deixar de existir porque não tem a licença ambiental?”, questionou a subsecretária de Fomento e Planejamento, Gabriela Monteiro Avelino, ao defender a regra prevista na portaria. As debêntures incentivadas e de infraestrutura são títulos com um diferencial em relação a outras letras com incentivo fiscal porque carimbam os recursos levantados pelas empresas um projeto específico.
A decisão da CI seguirá agora para análise na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado. Na visão do relator, senador Esperidião Amin (PP-SC), a portaria do Ministério dos Transportes estabeleceria dois pesos e duas medidas dentro do setor ferroviário.
“Exige-se delas as licenças ambientais antes da emissão de debêntures, quando esse é um expediente natural para a execução de qualquer projeto, incluindo as licenças ambientais que ele requeira”, afirmou na relatoria do projeto do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA).
Já a subsecretaria no Ministério dos Transportes argumenta ser natural que as regras sejam diferentes. “É inclusive nosso dever na hora de elaborar a política pública, conseguir identificar essas diferenças e de maneira fundamentada”, disse Avelino à Agência iNFRA. Ela lembra, por exemplo, que as concessões ferroviárias têm projetos elaborados pelo próprio governo. Não é o caso das ferrovias autorizadas, cujos desenhos partem do próprio setor privado. Há autorizações para construção de ferrovias que inclusive têm traçados coincidentes, o que não acontece com os projetos de concessão.
“Vamos supor que cada uma de três ferrovias autorizadas com o mesmo trecho queiram emitir R$ 1 bilhão. A gente pode correr o risco de ter um cenário em que emiti R$ 3 bilhões em debêntures, sendo que fisicamente só é possível existir uma ferrovia de R$ 1 bilhão. Isso é especulativo, efeito completamente deletério no mercado financeiro. É um risco para a política pública, um risco para a higidez do mercado muito grande”, levantou a subsecretária, pontuando que a situação também vai contra a política tocada pelo Ministério da Fazenda de tentar focalizar e aprimorar os gastos tributários.
Em seu relatório para suspender a norma do Ministério, o senador Espiridião Amin ainda avaliou que a medida proposta violaria o princípio da legalidade e criaria uma discriminação indevida entre ferrovias públicas e privadas, o que, na avaliação do parlamentar, desestimula os investimentos do setor privado. O relator também argumentou que a exigência de licença prévia como condição para o enquadramento de projetos prioritários pode gerar entraves burocráticos à emissão de debêntures incentivadas, comprometendo a captação de recursos.
A subsecretária pondera, por outro lado, que exigir o licenciamento prévio das ferrovias autorizadas seria uma obrigação – inclusive de custos – “ínfima” diante do capex necessário para uma ferrovia greenfield. “Se a empresa não consegue captar, ter recursos para custear o estudo do licenciamento prévio, como é que ela vai conseguir implantar a ferrovia?”, questionou Avelino, que também defendeu a legalidade e o cumprimento de normas durante a elaboração da portaria.
“Recebemos na consulta pública 127 contribuições de 16 órgãos. Fizemos uma ampla participação e debate social para justamente conversar com todas as partes interessadas. Teve uma análise jurídica, fizemos análise de impacto regulatório e atuamos no estrito uso das nossas competências estabelecidas pela lei”, disse.
Nova frente
A CI também aprovou nesta terça um projeto que institui a Frente Parlamentar para o Desenvolvimento da Navegação Brasileira. A proposta é de autoria do senador Marcos Rogério (PL-RO), presidente do colegiado.
Na proposta, apresentada em fevereiro, Marcos Rogério afirmou que a criação da frente representaria “um passo fundamental para a construção de uma política integrada e voltada para o futuro do Brasil como potência global no setor marítimo e fluvial”. “Esse esforço proporcionará uma navegação mais moderna, eficiente, segura e sustentável, alinhada aos interesses econômicos, sociais e ambientais do país”, escreveu.
A reportagem foi atualizada para contemplar o posicionamento do Ministério dos Transportes.








