Guilherme Mendes, da Agência iNFRA
O deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), relator de um projeto de lei com o novo marco legal sobre energia distribuída, disse que pretende democratizar o uso de energia solar, que deixará de ser uma “exclusividade de pessoas ricas”.
“Sim, apenas quem tem poder aquisitivo pode gerar energia solar hoje, mas esta energia solar gerada por esta camada mais rica barateou a conta dos demais brasileiros”, disse o deputado em entrevista à Agência iNFRA.
Segundo Andrada, o projeto de lei deverá oferecer, em sua primeira versão, 10 anos de subsídios a pequenos geradores. Geradores comerciais, residenciais, compartilhados e microgeradores terão alíquotas distintas, que avançarão rumo ao desembolso integral do valor pago às distribuidoras, chamado de “Fio B” no mesmo prazo de 10 anos.
Enquanto microgeradores e geradores residenciais pagariam 10% deste repasse no primeiro ano, fazendas solares já seriam responsáveis, de saída, por 100% deste valor.
Andrada afirma que há boa vontade do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pela aprovação do projeto, mas que ainda não está definida a forma de tramitação do projeto. “A grosso modo, será em regime de urgência”, pontuou o parlamentar. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Qual foi o questionamento que levou ao projeto?
Ao elaborar o projeto, notamos que o sistema atual em vigor, a resolução nº 482 da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), contém distorções. Ela foi feita com o intuito de incentivar a energia solar, o que é favorável, mas acabou gerando uma distorção indesejável, ao beneficiar camadas mais ricas, por duas razões. Primeiro que só quem tem poder aquisitivo tem condições de ter o seu painel solar. A segunda distorção é que, pela norma atual, a geração compartilhada, que poderia popularizar a energia solar, ficaria mais cara que a energia comum.
O projeto fará uma divisão de categorias de geração?
O nosso projeto divide a micro e minigeração distribuída em quatro categorias que terão tratamentos diferentes. Na primeira, de geração remota, são as fazendas solares – no projeto, a taxação começa em 28%, que é o pagamento do “Fio B”, que remunera as distribuidoras. A geração remota começa pagando integralmente a parcela de “Fio B”.
Depois estamos modificando o tratamento e o conceito de “geração compartilhada”, que é quando um grupo de pessoas faz uma fazenda solar que alimente nossas residências. Este modelo será dividido em comercial e residencial [no projeto de lei] e, com este conceito novo, será barateada esta opção.
Para a geração comercial, será iniciado em 50% do “Fio B” e, ao longo de 10 anos, esta alíquota de 50% vai crescendo paulatinamente para que, no final destes 10 anos, esteja pagando integralmente o “Fio B”. No caso de geração compartilhada residencial, se começa com 10% do “Fio B” para, no fim de 10 anos, também pagar integralmente o “Fio B”.
Haverá uma quarta categoria, de microgeração local – o telhadinho, ou o produtor rural que possui uma geração solar na sua fazenda para aquecer o galinheiro, ou movimentar sua fábrica de queijos. Este terá o mesmo tratamento da geração residencial, começando com 10% e pagando integralmente o “Fio B” ao final da transição.
Como será feito o complemento sobre este valor?
A CDE quem fará este complemento. Na microgeração, no primeiro ano será cobrada uma alíquota de 10% sobre o “Fio B”, e a CDE que completa os 90% restante. No terceiro ano, o gerador pagará 30% e a CDE arcará com 70%. No quinto ano, 50/50… A CDE irá subsidiar de maneira decrescente, e estamos propondo o fim da CDE para o segmento solar, caindo de maneira decrescente ao longo de dez anos.
A estimativa é de que a CDE some R$ 3,5 bilhões. Mas a expectativa é de que a economia para o sistema seja de R$ 37,8 bilhões. O saldo será positivo, e é o típico incentivo que traz resultados.
Este projeto conseguirá aumentar a oferta de energia solar no país?
Com este modelo, vamos conseguir finalmente popularizar e democratizar a utilização da energia solar. Pois existe hoje uma falha de narrativa: se por um lado é verdade que só pode ter energia solar quem tem poder aquisitivo maior, por outro lado, as simulações com dados oficiais da ANEEL mostram que a produção de energia solar, hoje, com as normas atuais, injeta no sistema energia suficiente para substituir as usinas termelétricas, que são caríssimas. Houve uma economia de R$ 455 milhões ao sistema no ano de 2019.
Quando se substituir a energia solar pela térmica, esta economia será também distribuída a todos os brasileiros, ao diminuir a conta de todo mundo. Sim, apenas quem tem poder aquisitivo pode gerar energia solar hoje, mas esta energia solar gerada por esta camada mais rica barateou a conta dos demais brasileiros.
Como está a produção do projeto de lei atualmente?
O projeto está praticamente pronto, e vai passar por pequenos ajustes e detalhes. Tenho conversado com o presidente [da Câmara] Rodrigo Maia sobre o projeto. Ele viu o projeto em linhas gerais, mas o caminho é longo ainda. A intenção dele é votar no início de fevereiro, e logo no início dos trabalhos resolver isso. Até o próprio presidente [da República] Bolsonaro já se manifestou sobre o tema.
O projeto deve passar por alguma comissão especial, ou tramitar em regime de urgência?
Acho que não. Neste ponto, o próprio presidente [da Câmara] Rodrigo Maia está fazendo uma avaliação de qual mecanismo regimental dará a maior celeridade. Existem várias possibilidades regimentais, e ele deverá junto com os líderes analisar qual é a melhor.
Vai ser de forma urgente. Qual vai ser o mecanismo regimental é o que ainda estamos avaliando.
O tema da geração de energia solar voltou ao debate no último mês, inclusive com comentários de presidente da República. Como a sociedade auxilia na discussão do projeto na Câmara?
Para mim, o presidente está correto quando ele fala que a energia solar precisa ser incentivada – o Brasil é o país do sol. Mas este projeto é fruto de uma construção coletiva, que vem acontecendo ao longo dos últimos seis meses. Para chegar a este texto, conversamos com distribuidoras, com a ANEEL, com o Ministério de Minas e Energia, e com o setor solar. É um projeto que visa a convergência e o consenso, e que os atores consideram razoável e factível – ao mesmo tempo que corrige distorções e incentiva o setor solar.