Nestor Rabello, da Agência iNFRA
Agentes do setor elétrico apontam estar preparados para a entrada em vigor do preço horário, que teve início em 1º de janeiro. Nesta segunda-feira (4) – primeiro dia útil do ano com a nova regra – o PLD (Preço de Liquidação de Diferenças) mínimo será de R$ 273, 69 o MWh às 02h00; e o valor máximo atingirá R$ 309,34, às 15h00. O preço médio do MWh será de R$ 296,17 no dia.
Pelo fato de o preço passar a ser atualizado a cada hora, a visão dos especialistas é que uma maior volatilidade será sentida a partir do novo modelo de precificação da energia, sobretudo em função de uma maior intermitência na matriz energética.
“A gente tem implementações [ocorrendo], percalços, mas acho que o modelo é necessário. A gente teve dois anos de operação sombra, em que apresentamos modelos, muita discussão setorial, então a tendência é que as coisas vão se adequando”, disse o gerente de Preços e Estudos de Mercado da Thymos Energia, Gustavo Carvalho.
Descolamento de valores
Esse cenário aponta para uma dinâmica de descolamento de valores, em horários de maior ou menor geração, que deve se agravar no fim de semana, de acordo com Carvalho.
“É um processo iterativo de ajuste. Na média, o PLD horário é mais volátil. Ao longo de um determinado dia, temos picos e vales que a gente não tinha. No final de semana, já vimos descolamento de mais de R$ 300,00 MWh [nos preços]”, disse ele.
O gerente da Thymos diz ser necessário acompanhar a dinâmica operativa entre CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) e ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), as mudanças nos modelos de previsão de geração e os impactos da nova operação nas diferentes cadeias do setor elétrico.
O presidente da Abraget (Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas), Xisto Vieira, aponta na mesma direção: “Acho que aos poucos vamos chegar aonde a gente acha que é o ótimo [da operação], vamos dizer assim”, pontuou.
Para o diretor técnico da PSR, Bernardo Bezerra, apesar de mais volátil, o impacto será muito maior em termos de alocação de custos do que propriamente em relação ao custo geral a ser sentido pelos agentes.
“Geração que era concentrada em determinado horário de baixo estresse ao sistema, que essa geração não era corretamente valorada, passa a ser melhor valorada. Você não tem tendência de mexer em custos totais, e sim na alocação desses custos entre os diferentes agentes”, salientou.
“Susto” em dezembro
À Agência iNFRA, dirigentes de associações e especialistas disseram, porém, que a mudança súbita ocorrida no PLD no início de dezembro demandará maior atenção às regras setoriais em relação à formação de preços.
O “susto”, como afirmam alguns atores do setor, se deve a uma decisão operativa da ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico) que elevou a defluência das hidrelétricas de São Francisco, resultando numa derrubada súbita do PLD.
“Não temos nenhuma dificuldade com o preço horário. O único problema nosso é a manutenção da credibilidade no processo de formação de preços […]. Estamos prontos para a entrada do preço horário […], estamos todos preparados”, disse o presidente da Abraceel (Associação Brasileira de Comercializadores de Energia Elétrica), Reginaldo Medeiros.
A Abraceel foi o primeiro agente do setor a questionar na ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) os impactos da mudança brusca de preços no último mês. Foi acompanhada posteriormente pelo BTG Pactual, que entrou com uma cautelar junto à agência para corrigir os impactos sofridos com a decisão.
Ao julgar a cautelar do banco, em votação com divergências, a ANEEL reafirmou entendimento do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) de que é necessário que mudanças desse tipo sejam divulgadas com ao menos 30 dias de antecedência.
Na avaliação de Medeiros, o entendimento da agência foi positivo e dá credibilidade às operações, mas essa visão precisa ser ratificada pelos diretores no mérito, e não só no âmbito do processo do BTG Pactual. “Queremos que esse assunto seja ratificado pela agência reguladora, é fundamental para a governança do PLD”, disse.
Oportunismo e governança
Para o presidente da Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia), Paulo Pedrosa, o episódio não pode representar um atraso na modernização do setor elétrico.
“Muito cuidado com os agentes do setor que usam a crise para justificar investimentos desnecessários e sobrecusto ao consumidor”, disse. “Esse problema não é desculpa para postergar nenhuma modernização do setor, especialmente a implantação do preço horário”, completou.