Tobias Markert*
O Brasil chegou à sétima rodada de concessão de aeroportos e traz para a mesa dois importantes ativos para o país: os aeroportos de Congonhas, em São Paulo, e Santos Dumont, no Rio de Janeiro. No geral, a concessão de aeroportos mudou a indústria de aviação significativamente. Desde os anos 70 vemos a expansão do modelo em todo o mundo, e seus benefícios para o desenvolvimento do transporte aéreo e das cidades há muito são percebidos. No Brasil seguimos o mesmo caminho com a decisão de conceder ativos aeroportuários a partir de 2011.
Enquanto investidor percebo que a concessão de aeroportos precisa ser uma situação de ganha-ganha para todos os atores envolvidos. O governo, que busca receitas, qualidade de serviço e desenvolvimento da infraestrutura; o mercado, que quer realizar bons investimentos e operar bons ativos; e, sobretudo, o passageiro, que precisa perceber o benefício em sua experiência como consumidor.
Esse ganha-ganha é possível, mas apenas se nós permitirmos que o sistema de concessão funcione o mais livremente possível. E isso nos leva uma questão que vem sendo discutida no momento aqui no Brasil: o tamanho da liberdade do “city airport” Santos Dumont como forma de proteger os voos internacionais do Galeão. Dois aeroportos de grande potencial que estão no Rio de Janeiro, uma das cidades mais turísticas do mundo.
Em diversos lugares do mundo vemos como não é recomendável restringir aeroportos, por algumas razões simples. A primeira delas é a capacidade de processamento de passageiros das cidades. Pensando no caso do Brasil, hoje o mercado do Rio de Janeiro pode absorver dois aeroportos sem limitação.
Parte da literatura diz que um sistema multiaeroporto precisa de 30 milhões de passageiros por ano para a cidade sustentar dois aeroportos, e a cidade mantinha uma média de cerca de 25 milhões de passageiros transportados no pré-pandemia, entre Santos Dumont e Galeão.
Não podemos esquecer que o Rio é a sétima maior cidade nas Américas, com um enorme potencial econômico e turístico. Como referência, a única cidade nos Estados Unidos que é maior é Nova York, e muitas outras cidades nos Estados Unidos possuem dois ou até três aeroportos.
E em segundo lugar, é preciso pensar sempre no potencial que o aeroporto tem para o desenvolvimento da cidade. Aeroportos que são verdadeiros microcosmos urbanos trazem um crescimento orgânico para os seus arredores, e essa é uma das vocações que o Santos Dumont pode ter.
A cidade de Memphis, nos Estados Unidos, é conhecida como “Aerotrópole da América” por seu pólo industrial e corporativo ao redor do aeroporto. Aeroportos de Istambul, Londres, Frankfurt e Dubai são outros exemplos de como cidades podem se desenvolver e ter centros comerciais criados a partir de seus aeroportos. É claro que temos que considerar a realidade de cada país e cidade, mas não tenho dúvidas de que o Rio tem esse mesmo potencial.
A nossa base, o Aeroporto de Zurique, está localizado a apenas 8km do centro da cidade, uma grande oportunidade para usar o potencial de ser mais do que um hub de transporte. E lá aprendemos uma lição e começamos a colher os frutos.
Hoje o nosso “The Circle” é uma área de 40 mil metros quadrados ligada ao Aeroporto de Zurique com hotéis, shopping centers, centros médicos e escritórios de multinacionais como a Microsoft. Hoje cerca de 6 mil pessoas trabalham nos arredores do aeroporto, e antes mesmo da abertura do empreendimento, quase todos os espaços foram ocupados por empresas e investidores que perceberam a oportunidade que é estar conectado a um aeroporto e em um ambiente seguro e inovador.
Santos Dumont fica ainda mais perto do centro da cidade, com apenas 2,5km de distância. Assim como fazemos no “The Circle”, em Zurique, acredito que o Santos Dumont pode alavancar muito seu desenvolvimento se inspirando no princípio básico dos bons investimentos: a diversificação de receitas com a transformação do entorno do aeroporto em “uma cidade dentro da cidade”. É bom para os investidores e bom para a geração de emprego e renda para os cariocas.
Sabemos que os aeroportos centrais são estratégicos para o desenvolvimento urbano, e a chance que acaba de aparecer no Rio de Janeiro não é diferente. Com ligação por VLT mantida no contrato de concessão, ponte aérea a 50 minutos da maior cidade da América Latina e a proximidade do centro de negócios do Rio, a concessão do Aeroporto Santos Dumont pode ser a chave para a revitalização do centro da cidade.
Operadores criativos e experientes certamente olham para esse ativo não apenas pensando em suas operações – e consequente concorrência com aeroportos vizinhos –, mas em sua capacidade de gerar receita, novos negócios e melhor atendimento aos passageiros e cidadãos locais. Com base em nossa experiência em todo o mundo posso afirmar que bons projetos geram valor, demandas e oportunidades até então impensáveis.
Limitar o Santos Dumont fará o oposto de trazer mais voos para o Rio, pois menos rotas significam preços mais elevados, o que pode tornar o voo inalcançável para muitos que viriam à cidade. Ao mesmo tempo, apenas forçar os voos domésticos para o Galeão provavelmente não será suficiente para trazer os voos de longa distância que desejamos.
O ganha-ganha que abordei no início é possível se o ambiente for livre para que os investimentos venham. Com a concorrência e investimentos corajosos teremos um país com infraestrutura aeroportuária modernizada por um modelo que se provou eficaz em todo o mundo. Também ganham os investidores que virão realizar melhores negócios e deixar seu legado. E especialmente ganham os passageiros – com mais opções de voos, horários e melhores preços – e os cidadãos, com cidades mais prósperas e desenvolvidas.
Enquanto entusiasta do crescimento brasileiro, investidor do setor e morador da cidade do Rio, eu acredito que esse é o caminho que nós precisamos seguir.