Marisa Wanzeller e Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA
A diretoria da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) adiou novamente a decisão sobre a renovação da concessão da EDP Espírito Santo. O diretor Ricardo Tili pediu vista do processo nesta terça-feira (22) e afirmou que fará requerimento para que seja feita análise pela procuradoria da agência, com a devida urgência, de adoção de critérios adicionais para renovações futuras.
Os diretores não chegaram a uma conclusão após debate acerca das sugestões trazidas pelo diretor Fernando Mosna em voto-vista, sobre incluir um critério de análise de expurgos (interrupções excluídas dos cálculos regulatórios) e realização de audiências públicas nos próximos processos que tratem da prorrogação de contratos das distribuidoras.
De acordo com Tili, considerando a urgência de uma decisão em função do prazo até 4 de maio para deliberação da ANEEL e o fim do contrato da EDP em 17 de julho, o tema poderá ser pautado em uma reunião extraordinária da reguladora após a análise da procuradoria.
Em busca de uma convergência, a diretora Ludimila Lima, relatora original do processo, já havia incluído em seu voto determinação para que as áreas técnicas e a procuradoria estudem acerca da validade e legalidade das sugestões do voto-vista. A nova instrução técnica seria levada à diretoria no momento de deliberar os demais pedidos de prorrogação. Mosna, no entanto, manifestou que manteria seu entendimento.
Expurgos
A renovação da EDP Espírito Santo, em si, não é ponto central do debate. A proposta apresentada por Mosna em voto-vista foi aprovar a recomendação para renovar o contrato, mas incluía no dispositivo determinação para que os expurgos sejam considerados nas próximas prorrogações a serem analisadas.
Atualmente, interrupções de fornecimento de energia por causas e situações específicas, como eventos climáticos extremos, não entram no cálculo dos indicadores de qualidade de serviço (DEC e FEC), considerados para determinar ou não a renovação. Esses episódios são expurgados, sendo que não há um indicador regulamentado pela ANEEL hoje que avalie especificamente a continuidade do serviço sem esses expurgos.
Seria avaliado, pela sugestão do diretor, se os expurgos ultrapassaram a variação de 140% nos últimos três anos. A regra incluída pode prejudicar empresas como Enel São Paulo, Enel Rio e RGE (Rio Grande Energia), que hoje não atenderiam a esse critério. O risco seria menor para a distribuidora gaúcha, segundo o voto-vista, uma vez que as enchentes de maio de 2023 no Rio Grande do Sul tiveram tratamento regulatório e legal específicos.
“A regularidade e a continuidade com relação à prestação adequada do serviço devem considerar os indicadores de continuidade DEC e FEC levando em conta também seus respectivos expurgos […] Assim, para fins de aferição do serviço público adequado, impõe-se que as análises de desempenho contemplem também as interrupções efetivamente percebidas pelos consumidores, independentemente das exclusões regulatórias motivadas”, argumentou o diretor Mosna.
A Superintendência de Fiscalização atualmente considera que uma concessão está performando mal em um conjunto elétrico quando o DEC supera 140% do DEC regulatório, explicou Mosna à imprensa. “Eu entendi que uma maneira de a gente ver qual era a perceção do consumidor [sobre a concessão], de acordo com a métrica que nós temos, era pegar o que foi DEC, expurgados todos os expurgos da concessionária, e dividir pelo DEC regulatório que nós estabelecemos como métrica de qualidade e eficiência”, afirmou.
Há, porém, a percepção de que o índice de 140% seria “discricionário”, já que não existe uma metodologia estabelecida a partir de uma discussão pública, avaliam fontes. Assim, a depender do índice estabelecido, determinadas distribuidoras podem ser penalizadas ou não.
Segundo fontes, a ideia de se analisar os indicadores de expurgos chegou a ser analisada pelo próprio MME (Ministério de Minas e Energia) na época da elaboração do decreto, mas ficou de fora dos critérios justamente por ainda não existir uma metodologia regulamentada de análise da continuidade sem considerar os expurgos. O decreto, por outro lado, cita a necessidade de regulamentação da medida para o novo período contratual.
Agentes do setor também ponderam que o Decreto 12.068/2024 deixa claro que só pode ser utilizado o DEC e o FEC global, de tal forma que a proposta de Mosna ultrapassa o que foi definido na norma.
Critérios adicionais
O diretor-geral da ANEEL, Sandoval Feitosa, defendeu que mais critérios sejam levados em consideração no processo de prorrogação das concessões de distribuição de energia elétrica, caso se conclua que cabe à agência uma análise ampliada do que é o “serviço concedido adequado”.
“O que eu defendi é que, em havendo a possibilidade legal de analisar o [que seria o] serviço adequado, eu discordei do ponto de que um critério apenas é o suficiente. Eu coloquei outras perspectivas”, afirmou à imprensa após a reunião da diretoria.
Além dos indicadores globais, como é colocado no decreto que traz diretrizes para as renovações, e os que contabilizam expurgos, apresentados pelo diretor Mosna, Sandoval citou: 1) DEC interno, calculado para um grupo específico de consumidores; 2) TMAE (Tempo Médio de Atendimento a Emergências), que apresenta o tempo levado pela distribuidora para restabelecer o fornecimento de energia após uma ocorrência; e 3) Iasc (Índice ANEEL de Satisfação do Consumidor).
“Há um conjunto de componentes que poderiam ser incluídos na análise. Mas isso, superada a perspectiva inicial: à ANEEL, neste processo de renovação, cabe uma análise ampliada do que é o serviço concedido adequado? Se couber, que critérios são esses?”, ponderou.
Audiências públicas
O diretor Mosna também trouxe em seu voto a ideia de que os processos de renovação sejam precedidos de audiências públicas presenciais nas cidades onde está localizada a sede de cada distribuidora. Ressalvou a EDP ES, uma vez que tem prazos mais apertados.
Ludimila Lima e Sandoval Feitosa apontaram que, como se trata de processo de instrução, em que a ANEEL tem apenas a missão de avaliar o cumprimento de critérios específicos e recomendar, com base nessa análise, a renovação ou não para decisão do MME, a realização de audiências públicas pela reguladora seria dispensável.