da Agência iNFRA
A proposta de regulamentação da reforma tributária apresentada pelo governo com o PLP (Projeto de Lei Complementar) 68/2024 vai fazer com que o setor de transporte rodoviário de carga pague mais impostos do que a média atual e gera preocupação sobre o modelo de ressarcimento de créditos, especialmente dos gastos com combustíveis.
É o que indicou a advogada tributarista Alessandra Brandão Teixeira, que tem acompanhado a reforma tributária para a CNT (Confederação Nacional do Transporte) no 23º Seminário Brasileiro do TRC (Transporte Rodoviário de Cargas), realizado na semana passada na Câmara, tendo como tema a reforma tributária.
O encontro é promovido pela NTC & Logística, associação que representa as empresas transportadoras, e houve apoio geral à reforma. Mas foram apresentadas dúvidas sobre como será o funcionamento do novo sistema que implantou no país um modelo de IVA (Imposto de Valor Agregado) para o consumo. O evento pode ser visto neste link.
O setor de transporte rodoviário de carga não entrou em nenhum dos grupos com alíquotas reduzidas ou regimes especiais. Com isso, vai ter que pagar os 26,5% de alíquota estimada até agora dos dois novos tributos, o IBS e a CBS, mas com direito a se ressarcir de todos os pagamentos que fizer.
De acordo com Alessandra, antes da apresentação do projeto de lei complementar da reforma, havia expectativa de que na média o impacto no setor poderia ser um aumento de até 10 pontos percentuais nos impostos pagos em relação a hoje. Segundo ela, após a apresentação do projeto, ela já fez estudo com um caso real de empresa e o impacto foi menor, de cinco pontos percentuais. Mas ela afirmou que seriam necessárias mais análises, o que já é possível com as informações disponíveis no PLP.
A advogada afirmou que o maior problema para os transportadores na regulamentação será a forma como se dará o ressarcimento dos créditos gerados com compras. Segundo ela, a maior parte dos custos de uma transportadora, a mão de obra, não é ressarcida. E a outra parte grande, cerca de 40%, é gasta com combustível, cujo ressarcimento de créditos tem um modelo diferente dos demais.
De acordo com Alessandra, os créditos nesse setor de combustível terão que ser reconhecidos pela Receita Federal e pelo comitê de estados e municípios que vai gerir o sistema, o que para ela pode levar a um tempo inadequado para a devolução do crédito.
“Não vai poder tomar o crédito imediatamente. Vai ter que aguardar a homologação. Vai que demora 60 dias? É um prazo longo. No caso do transporte, 50% do custo é mão de obra e 40% é combustível”, lembrou a advogada.
Condicionante
Outra preocupação em relação aos créditos é uma condicionante a que o ressarcimento seja ao que foi efetivamente pago. Segundo ela, isso pode fazer com que as empresas tenham que recolher o imposto de uma nota, mas demorem a receber o crédito, seja devido a um prazo mais longo para o fornecedor quitar a nota ou desavença comercial. Segundo ela, no IVA europeu, que baseou o modelo do Brasil, não há essa condicionante para a devolução do crédito.
Ela pediu ainda que os transportadores que entrarem na cadeia de exportação também possam ser exonerados de impostos, como o restante dos bens para o comércio exterior. “Da forma como está, o transportador está fora. Se uma empresa de café contrata o exportador para levar até o porto, ele está fora porque ele não foi contratado por empresa no exterior [como determina o PLP 68/2024]”.
Círculo virtuoso na economia
Fernando Mombelli, gerente de projetos que representou a Receita Federal no encontro, explicou detalhes da reforma, defendendo o modelo que será implantado e indicando que a reforma tende a gerar um círculo virtuoso de crescimento no país, e que isso será benéfico para toda a economia. Além disso, defendeu que o amplo regime de ressarcimento tende a ser benéfico para todos os setores.
Mombelli explicou ainda que o problema brasileiro do devedor contumaz levou à necessidade de se usar como regra o pagamento do imposto para a geração do crédito, evitando a concorrência desleal. Segundo ele, há mecanismos no PLP para que “haja a menor interferência” possível no fluxo de caixa das empresas e que novos instrumentos poderão gerar até mesmo créditos imediatos no futuro.
Em relação ao transporte de carga, ele lembrou ainda que foi permitido que a contratação de motoristas autônomos gere um crédito presumido. Mombelli informou que tudo será discutido na tramitação do PLP, mas indicou que a neutralidade buscada pela reforma é geral, e não específica por setor ou por empresa, o que seria impossível.
De acordo com o assessor, o caso dos combustíveis é diferente porque a tributação é na refinaria e paga sobre um valor fixo. Por isso, o ressarcimento vai ser diferente dos outros tipos de crédito, mas ele garantiu que será feito de maneira célere.
Contra aumento de carga
O deputado Diego Andrade (PSD-MG) lembrou que o intuito da reforma não é o aumento de arrecadação, e sim a simplificação, pedindo ao representante da Receita Federal para que o setor seja ouvido na regulamentação e se evite aumento de carga. “Não podemos ter aumento de arrecadação sem o crescimento econômico”, disse o deputado.
Hugo Leal (PSD-RJ) comparou a reforma com o futebol, dizendo que a emenda constitucional foi como a torcida para a Seleção Brasileira na Copa do Mundo, quando todo mundo torce a favor. Já o PLP é como se fosse o Campeonato Brasileiro, onde cada um está defendendo o próprio time. “É um grande dilema e não é simples [a regulamentação]. O desejo de todos é contribuir na forma justa”, afirmou o deputado, lembrando que as exceções não podem ficar acima da regra.