Governo diverge de PL de senador para voltar a fechar mercado rodoviário de passageiros


Tales Silveira, da Agência iNFRA

A votação pelo Senado Federal do PL (Projeto de Lei) 3.819/2020, que tenta fechar o mercado do Trip (Transporte Rodoviário Interestadual de Passageiros) pode ser pautada nesta semana. 

A proposta virou uma guerra entre parte do Senado, que quer voltar a fechar o mercado, e o governo, que quer manter a abertura iniciada em 2013 e que foi ampliada a partir do ano passado. Líderes do Senado afirmam que houve uma distorção, pois o transporte rodoviário coletivo de passageiros é um serviço público, não podendo ser outorgado por autorização, como a nova lei e os novos regramentos da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) permitiram. 

O autor do projeto, senador Marcos Rogério, (DEM-RO), afirma na justificativa da proposta que o regime de autorização é “unilateral e discricionário do poder público” e, portanto, não deve ser aplicado ao transporte coletivo interestadual e internacional de passageiros.

A proposta do senador tenta voltar ao regime antigo, no qual a ANTT tinha que fazer uma avaliação se cada ligação teria a capacidade ou não de ter competição, antes de permitir novas empresas, o que o atual governo considera uma restrição à competitividade. Integrantes do executivo argumentam que o regime de autorização trouxe uma maior competitividade para o setor, que, nos últimos 50 anos, vem sendo controlado por poucas empresas.

Fontes ligadas ao governo afirmam ainda que, antes da liberação da autorização, quase 70% das ligações tinham apenas uma empresa operando na rota, ou seja, eram feitas sem concorrência. Outro ponto levantado é de que o regime de monitoramento da ANTT, baseado em níveis de envio de dados, incomoda empresas que não realizam os envios solicitados pelo órgão. 

De acordo com dados da agência, nos últimos quatro meses (maio, junho, julho e agosto), mais de quatro mil ligações foram autorizadas. Maior aumento de mercados da história do Trip. Houve incremento de 10% do mercado em meio à pandemia, mesmo com 87% dos pedidos analisados tendo sido indeferidos.

Ainda de acordo com os dados levantados na ANTT por uma fonte, após a Deliberação 955/2019, 2.374 mercados novos foram outorgados – desses, 841 já estão em operação. Aproximadamente 70% dos mercados outorgados nesse período são novos, ou seja, compreendem ligações que nunca foram feitas pelo setor de transporte rodoviário de passageiros. Também nesse período, mais de 30 empresas obtiveram outorga de mercados, sendo oito novas entrantes. 

Conforme publicado na edição 857 desta newsletter, o relator da proposta no Senado, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), fez diversos acréscimos ao PL. Em seu texto, Gurgacz afirma, entre outras questões, que a ANTT adota cobranças que oneram “desnecessariamente o serviço prestado à população”. 

O relator e a agência têm uma história de desencontros. O parlamentar é dono de duas empresas ligadas ao setor – Eucatur e Solimões. No início de agosto, a ANTT aplicou a pena de cassação da autorização especial à Eucatur e, atualmente, a empresa do parlamentar deve mais de R$ 20 milhões em multas para o órgão. 

Tramitação
Em 27 de agosto, o Senado chegou a colocar o PL em pauta, mas adiou a sua apreciação. O motivo do adiamento foi a apresentação de parecer do relator, que fez novos acréscimos ao texto dando novas determinações para a ANTT. Por causa das mudanças, o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), pediu o adiamento por duas sessões.

Para que o pedido fosse acatado, um acordo foi desenhado entre governo e lideranças determinando o envio, ao Senado, da relação de todas as autorizações dadas pela ANTT ao setor a partir do dia 30 de outubro de 2019. O ofício, assinado pelo presidente da CI (Comissão de Infraestrutura), foi enviado no dia 28 e recebido no fim da tarde pela agência. De acordo com a ANTT, as informações já estão disponíveis para consulta no site da agência e devem ser prontamente entregues ao Congresso.

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