iNFRADebate: A nova Lei de Licitações e a roupa velha colorida – a inércia na aplicação da 14.133

Carine de Oliveira Dantas e Fernanda Oliveira de Alencar*

A nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 14.133/2021) foi publicada em 2021. A ela foi aplicado o período de transição: até abril de 2023 é facultada, à discricionariedade do gestor, a opção pelos regimes da (já antiga) Lei Geral de Licitações (Lei 8.666/1993), a Lei do Pregão (Lei 10.520/2002) e a Lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei 12.462/2011). 

Ou seja, por dois anos da data de publicação da nova lei, a Administração pode adotar até quatro tipos de regramentos licitatórios, vedada a combinação das leis em um só processo de contratação. 

Inércia
O que se percebeu, todavia, é que a Administração Pública em geral primou pela inércia e preferiu, ao longo do período de transição, a utilização da roupa velha em suas contratações. O fato chamou a atenção do TCU (Tribunal de Contas da União), conforme manifestado pelo ministro Benjamin Zymler em comunicado durante sessão plenária de setembro de 2022, sendo recomendada auditoria para verificação específica do tema.

Os motivos da opção pela legislação antiga foram listados pelo Ministério da Economia, em seu Plano de Gestão de Riscos (PGRONLL), também datado de setembro de 2022. O relatório lista 56 riscos a serem tratados antes da implementação total da nova lei, dos quais se destacam do panorama geral a dificuldade na regulamentação e a falta de capacitação dos agentes públicos, tanto quanto à nova sistemática a ser executada quanto à questão dos procedimentos tecnológicos.

E, neste apego ao iminente passado, a nova lei ainda poderá demorar a acontecer, apesar de o prazo de dois anos do período de transição chegar a termo no próximo mês de abril. 

Primeiro, pela ultratividade da legislação anterior. Quer-se dizer que, mesmo com a revogação das leis 8.666/93, 10.520/02 e 12.462/11, os contratos firmados sob sua tutela assim seguirão, ainda que aditivados já na vigência da nova lei.

Segundo, pela divergência entre os órgãos da Administração de qual seria o ato que efetua a opção do regime legal da contratação. Há duas correntes majoritárias.

Posições oficiais
De um lado, a Advocacia Geral da União exarou o Parecer 06/2022, com o posicionamento de que, sendo o processo licitatório um desencadeamento de atos, a opção do regime licitatório se dá ainda nos atos preparatórios, em momento anterior à publicação do edital. A problemática é o alargamento indefinido do prazo de ultratividade das legislações revogadas, já que editais elaborados com base nessas poderão ser publicados em momento muito posterior à vigência da nova lei. Bastaria que o ato de escolha, ainda em fase interna da elaboração do edital, seja exarado até 31 de março. 

Por sua vez, pelos Comunicados 10 e 13/2022, o Ministério da Economia foi pontual ao estabelecer que a opção da legislação se preencheria no ato da publicação do edital, de modo que os processos licitatórios modelados sob a tutela da legislação revogada devem ser publicados até o prazo máximo de 31 de março de 2023. Esta, no momento, é a posição que deve ser seguida pelos demais órgãos da Administração Federal.

Prejuízo
O período de transição é importante porque é o tempo concedido para a Administração “arrumar a casa” para a aplicação da Lei. A 14.133/2021, em especial, muito mais que unificar normativas e procedimentos, tenta implementar o rejuvenescimento das contratações públicas, por meio de instrumentos de planejamento, governança, transparência e controle. Expressão dessa mudança é a necessidade de divulgação dos contratos no Portal Nacional de Compras Públicas para que esse seja válido, ou, diga-se também, da explícita necessidade de compatibilização com o que seria o plano de contratações anual e com as leis orçamentárias.

A nova lei não ter sido utilizada nesses dois anos – e, principalmente, um dos motivos ter sido a falta de capacitação – liga o alerta para o despreparo em sua aplicação. O período de transição serve justamente para a utilização incremental, que possibilita tanto os órgãos administrativos quanto os órgãos de controle à análise calma daquilo que for novo, em vez do certo açodamento que deriva da aplicação do desconhecido.

Fato é que, quanto antes a nova lei começar a ser aplicada de forma efetiva, maiores os benefícios – seja por se tornar mais conhecida de seus aplicadores, seja pelos benefícios advindos de suas disposições. A mudança é anunciada e é preciso estar preparado para quando se tornar inevitável.

*Carine de Oliveira Dantas e Fernanda Oliveira de Alencar são membros da Manesco Advogados.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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