Carolina Caiado*
A primeira medida provisória editada pelo novo governo Lula reorganiza a administração federal e traz mudanças importantes para o setor de infraestrutura de logística e transporte no Brasil. O antigo Ministério da Infraestrutura foi desmembrado em dois: Ministério de Portos e Aeroportos, e Ministério dos Transportes. A concentração da supervisão ministerial de todas as agências reguladoras, entidades públicas e órgãos dedicados aos diversos modais de transporte no Ministério da Infraestrutura estava adequada às melhores práticas de governança institucional.
Agora, a política nacional de transportes aquaviário e aeroviário ficará a cargo do Ministério dos Portos e Aeroportos, ao passo que a política nacional de transportes ferroviário e rodoviário será responsabilidade do Ministério dos Transportes. A medida provisória determina que ambos os ministérios devem se articular para estabelecer o planejamento estratégico e as diretrizes para sua implementação, bem como definir as prioridades dos programas de investimentos no transporte aéreo, aquaviário, rodoviário e ferroviário. A articulação ministerial também será necessária para planejar a expansão das respectivas infraestruturas, quais sejam: portuária, aeroportuária, rodoviária e ferroviária.
A nova configuração dos ministérios pode trazer grandes desafios de articulação e planejamento da expansão da infraestrutura de logística de transportes brasileira. Num país de dimensões continentais, o planejamento da logística de transporte – um dos maiores gargalos da infraestrutura brasileira – requer avaliação integrada das necessidades de se construir e ampliar portos, aeroportos, rodovias e ferrovias.
Trata-se de obras de grande vulto, que demandam longos prazos e muitos investimentos para serem planejadas e executadas. É preciso observar ao longo do tempo se haverá integração entre as ações dos ministérios e se esse alinhamento será preservado, garantindo a execução estratégica que precisamos para o setor.
Outro aspecto relevante é garantir que a nova configuração ministerial não afete negativamente a segurança jurídica dos contratos com a iniciativa privada. Justamente por se tratar de um setor que demanda grandes investimentos, o governo federal depende do setor privado para viabilizá-los. Nesse contexto, a sustentabilidade dos contratos, a análise integrada da demanda pelos modais de transportes e o planejamento para evitar “competição desleal” entre as infraestruturas são imprescindíveis.
Déjà vu
Já se viu no passado o quanto as mudanças da regulação e da governança impactam a viabilidade dos projetos e a segurança jurídica dos contratos, afastando investidores privados. Os players do mercado recordam-se de quando a regulação do setor de portos cambiava na velocidade dos jornais do dia. Naquela época, terminais arrendados nos portos organizados recém-adjudicados ao setor privado passaram a conviver com a autorização para construção de portos privados, muito próximos, prejudicando muito os planos de negócios dos terminais arrendados.
Quando participaram das licitações nos portos organizados, os adjudicatários dos terminais submeteram suas propostas e plano de negócios, sem considerar a possibilidade de poucos meses depois haver permissão para construção de terminais privados em áreas próximas, sem qualquer avaliação prévia da real demanda de transporte para justificar a presença de terminais arrendados e portos privados na mesma região. Exemplo claro das mazelas da falta de planejamento da expansão dos modais de transportes.
Na mesma linha, repercutiu-se muito os efeitos da possível reabertura do Aeroporto da Pampulha em Minas Gerais na concessão do Aeroporto de Confins. O adjudicatário de Confins, quando apresentou sua proposta na licitação, fez isso considerando que o Aeroporto da Pampulha seria dedicado somente à aviação executiva, pois a concessão do aeroporto de Confins estava inserida em política pública de torná-lo hub de transporte de cargas e passageiros, além de desenvolver urbanisticamente a região onde está inserido.
Futuro
O planejamento das políticas públicas e obras do setor de logística de transportes exige longo prazo. Estamos falando de tarefas complexas, que serão ainda mais desafiadoras com dois “chefes”, o ministro dos Portos e Aeroportos, e o ministro dos Transportes. Este já anunciou que dará seguimento aos projetos em estágio avançado de modelagem, o que é uma decisão acertada. Esses foram projetos estruturados sob a supervisão do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), alguns já estão até mesmo sob análise do TCU (Tribunal de Contas da União).
Diante do novo cenário ministerial, esperamos mais iniciativas como essa, baseadas em decisões técnicas, com visão de longo prazo, tendo por objetivo maior a expansão sustentável da infraestrutura da logística de transporte de que o Brasil tanto necessita.