Alessandro Miranda*
Obra é sinônimo de planejamento. Desde o Plano Real, em 1994, quando o Brasil conseguiu domar a hiperinflação, era possível calcular custos de obras, fossem elas públicas ou privadas, com um certo grau de previsibilidade. Hoje, nem com bola de cristal.
Segundo a Fundação Getulio Vargas, a média de aumentos relacionados à construção civil foi da ordem de 38,66% no primeiro ano da pandemia, a maior inflação registrada no setor em 28 anos. Itens como o aço registraram aumento de 72,6% em 12 meses. E os preços desde então não param de subir.
A pandemia explica, em parte, a situação. Prevendo retração no consumo, em todo o mundo a indústria de cimento e aço, insumos fundamentais da construção civil, interrompeu sua produção no início da crise sanitária. Quando a demanda voltou a crescer, em ritmo acelerado, a retomada das atividades não deu conta das entregas.
Além de um aumento substancial de preços, há desabastecimento. O cimento, que antes era entregue em até 48 horas, passou a demorar até 30 dias. Aço e materiais elétricos passaram a levar de 60 a 90 dias para chegarem aos canteiros de obras.
A elevação do preço do barril do petróleo que saiu de US$ 26 para quase US$ 100 também impactou nos custos. O diesel acumulou alta de 65,5% em 2021 e a gasolina, 74,8%. Resultado: em janeiro de 2021, pagava-se pelo CAP (Cimento Asfáltico de Petróleo) 50/70 R$ 3.500. Um ano depois, quando são escritas essas linhas, ele custa R$ 5.500.
Para não atrasar as frentes de produção, não raro os empreendimentos têm sua margem de lucro consumida por negociações conduzidas às pressas. Isso leva as empresas a uma situação de insustentabilidade. Por isso, cada vez mais gestores públicos terão que lidar com um termo que detestam ouvir, mas que infelizmente é imposto pelo cenário atual: reequilíbrio contratual.
Pesquisas de mercado, relatórios técnicos e notas fiscais são meios de demonstrar as variações objetivas no preço de insumos e variações no âmbito contratual. Na esfera federal, o Sinapi (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil) ou Sicro (Sistema de Custos Referenciais de Obras), conforme o caso e a depender de sua atualidade e nível de detalhamento, podem referenciar uma planilha de variação no preço de insumos, conforme o Decreto 7.983/2013.
Uma vez demonstrado o desequilíbrio, caberá ao contratado comunicar à Administração Pública a necessidade de reajuste. Havendo inércia do contratante em analisar e processar a demanda, não restará alternativa à empresa a não ser a intermediação judicial.
E assim vamos em frente. Se construir é a arte do planejamento, em tempos de inflação e imprevisibilidade, quem se arrisca nesse ramo deve ser também equilibrista.