17/06/2025 | 09h00  •  Atualização: 17/06/2025 | 12h38

Mercado projeta leilão de petróleo morno, com Petrobras como grande compradora

Gabriel Vasconcelos, da Agência iNFRA

O leilão do 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) deve ser “morno”, com competição por somente alguns dos 172 blocos em disputa e protagonismo da Petrobras, disseram à Agência iNFRA analistas e agentes do setor. A ANP promove o certame hoje, a partir das 10h, em hotel da Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro.

A expectativa baixa do mercado se deve não só à natureza das áreas ofertadas, com alguns blocos desprezados em certames anteriores ou de alto risco, mas também à conjuntura desfavorável do setor, com cotação internacional do barril em baixa e cenário doméstico marcado por judicialização, dificuldade na obtenção de licença ambiental na Margem Equatorial e investida do governo para aumentar a arrecadação sobre a produção de petróleo.

“Sempre existe a chance de a Petrobras ser a grande compradora do leilão e o governo defini-lo como um sucesso”, resume Marcelo de Assis, dono da consultoria MA2Energy. Ele destaca que o preço do Brent, próximo aos US$ 70, abaixo do patamar dos últimos anos, dá menos folga ao caixa das empresas e torna os investimentos mais restritos. Soma-se a isso a ausência de grandes descobertas nos últimos 10 anos e o movimento do governo para arrecadar via aumento dos preços de referência e majoração de participações especiais, o que afugenta o investidor.

“O esforço para aumentar impostos é visto de maneira bem negativa. Como sempre, podemos ter petroleiras marcando posição no país. Mas, assim como nos últimos leilões, não terão o apetite visto no passado, em 2016 e 2017, e que durou até 2019”, diz Assis.

Arrecadação e regras
O governo espera arrecadar algo próximo a R$ 600 milhões, que seria a soma dos bônus de assinatura mínimos caso todos os blocos das cinco bacias espalhadas pelo país sejam licitados.

No leilão de concessão, vence quem oferecer a melhor combinação entre bônus de assinatura (80% da pontuação) e PEM (Programa Exploratório Mínimo, que representa 20% da pontuação). Decisivo nesse caso, o bônus é o valor em dinheiro oferecido pelo bloco e pago no momento da assinatura do contrato.

Estão habilitadas 31 empresas, entre as quais quase todas as majors que atuam no país, como Petrobras, Equinor, Shell, TotalEnergies, BP, Chevron, Exxonmobil, Sinopec e as estatais chinesas CNODC e CNOOC.

Bacia a bacia
Geólogo da Petrobras por 34 anos e hoje à frente da Zag Consultoria, Pedro Zalán concorda com a tese de leilão morno, mas é um pouco mais otimista com relação à qualidade dos ativos. Ele aposta no interesse pelos blocos da Bacia de Pelotas, no litoral do Rio Grande do Sul, principalmente por parte de empresas como Petrobras e Shell, que arremataram 29 blocos em 2023.

“Pelotas vai ter interesse. Mais do que possível, isso é provável. E empresas que não têm ativos nessa bacia podem tentar entrar”, diz. Segundo o especialista, nada mudou do último leilão (2023) para cá, mas as petroleiras ali presentes já planejam perfurações exploratórias e Pelotas segue como alvo do mercado, em função de bons resultados na Namíbia, hotspot do momento e região geologicamente correspondente do outro lado do Atlântico.  

Na Bacia de Santos, que repete dezenas de blocos de cinco setores já ofertados no passado, Zalán destaca o possível interesse em um bloco específico situado ao sul, o S-M-1617. Trata-se do bloco com o maior bônus de assinatura do leilão, R$ 17,28 milhões.

“Este (S-M-1617) é um bloco de pré-sal, mas fora do polígono. Tem uma estrutura gigante, chamada Puri. Se tiver óleo ali, estamos falando de um campo gigante”, explica o consultor da Zag.

Nesse caso, o fator limitante, diz, é a distância do litoral: o bloco está além da Zona Econômica Exclusiva de 200 milhas náuticas. “É possível que empresas como Total, Shell, Karoon ou até uma chinesa tente adquirí-lo porque já têm blocos na área”, continua Zalán. Ele também cita Equinor e BP, já presentes em Santos, como possíveis interessadas.

Marcelo de Assis, que igualmente vê uma procura limitada por concessões na Bacia de Santos, não descarta que petroleiras menores, as chamadas independentes, como Brava e Prio, tentem reforçar o portfólio exploratório com esses ativos menores.

Os setores menos atraentes do leilão, dizem os analistas, estão na única bacia sedimentar terrestre do leilão, a do Parecis, com blocos em Mato Grosso e Rondônia. O isolamento e o alto risco tendem a deixar os ativos escanteados ou nas mãos de empresas aventureiras, a exemplo do que houve no último leilão, em 2023.

Margem Equatorial  
Zalán prevê que blocos com potencial alto e moderado do ponto de vista geológico nas bacias da Foz do Amazonas e Potiguar, ambas na Margem Equatorial, dificilmente vão receber ofertas devido às dificuldades para obter licenciamento ambiental e à profusão de ações na Justiça.

Assis concorda. “É difícil para grandes petroleiras justificarem investimentos nessa região, o que seria, em alguns casos, uma volta após abandonarem blocos”, diz em relação à TotalEnergies e BP, que abriram mão de concessões na Foz do Amazonas, hoje tocadas pela Petrobras

Como mostrou a Agência iNFRA, há pelo menos sete processos na Justiça Federal para impedir a oferta de blocos nessas áreas, protocolados pelo MPF (Ministério Público Federal) do Pará, pela ONG Instituto Arayara e por entidades de petroleiros, como FUP e Anapetro.

“Na Foz do Amazonas há pelo menos cinco blocos com alto potencial geológico que mereciam ser ‘bidados’. Mas não deve haver concorrência, em função da resistência do Ibama em dar licenças ambientais. Se houver algum lance, será da Petrobras e em blocos específicos”.

Esses blocos são o FZA-M-1410 e FZA-M-184, contíguos à área onde a Petrobras busca licença para perfurar um poço exploratório, e os blocos FZA-M-1040, FZA-M-1042 e FZA-M-1102, na fronteira com a Bacia Pará-Maranhão. Trata-se de blocos visados, pela chance de repetirem perfis geológicos de sucesso encontrados na Guiana e no Suriname ou até mesmo do outro lado do Atlântico, nos litorais de Costa do Marfim e Gana.

Algo parecido, mas com potencial menor, ocorre em campos da Bacia Potiguar ora ofertados e próximos dos quais a Petrobras já descobriu acumulação de petróleo. Nesse caso, ações na Justiça apontam proximidade à cadeia de montanhas submarinas que levam a Fernando de Noronha e ao Atol das Rocas, o que é rechaçado por Zalán. “Noronha está a mais de 400 quilômetros da área ofertada mais próxima”, diz o geólogo. 

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