da Agência iNFRA
A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e o Ministério dos Transportes estão implementando ações para mitigar os impactos da crise climática que afeta o Brasil. A ANTT deve aprovar, até o final deste mês, um projeto de sustentabilidade que poderá ser integrado aos contratos regulados pela agência.
“Estamos desenvolvendo um programa de sustentabilidade, que deverá ser aprovado ainda em novembro. A proposta inclui alternativas de financiamento para novas abordagens, com o objetivo de impulsionar projetos sustentáveis, algo que já estamos implementando nos últimos anos”, afirmou Cynthia Ruas, gerente de Estruturação Regulatória da ANTT.
Guilherme Penin, vice-presidente da Rumo e mediador do painel “Concessões e Mudanças Climáticas: Desafios da Adaptação e da Alocação de Riscos”, ressaltou que 2024 deve ser um ano de alerta para os desafios climáticos nos próximos anos. Ele destacou que a questão climática tem se tornado cada vez mais relevante e exige uma resposta urgente tanto do ponto de vista regulatório quanto das empresas.
“Assistimos no Brasil a fenômenos climáticos que antes víamos apenas em outras partes do mundo, mas que, até então, eram raros em nosso país. Recentemente, ainda temos em mente a tragédia sem precedentes no Rio Grande do Sul, que comprometeu gravemente a infraestrutura do estado. Em seguida, o Centro-Oeste enfrentou uma seca severa, com queimadas devastadoras que impactaram a agricultura e a infraestrutura. Além disso, a Amazônia vivenciou uma seca intensa, que parece ter sido ainda mais grave do que nos anos anteriores.”
No Ministério dos Transportes, as ações para enfrentar os desafios climáticos estão sendo cuidadosamente analisadas e devem ser incorporadas aos projetos em andamento, segundo o subsecretário de Sustentabilidade do Ministério, Cloves Benevides. Ele enfatizou que os aspectos climáticos e os riscos precisam ser considerados desde a fase de modelagem dos projetos. Para ele, a política pública deve encarar os riscos relacionados à infraestrutura como uma realidade a ser “identificada, precificada e compartilhada”.
“Este é um terreno ainda muito incerto. A realidade discursiva está bem distante da nossa capacidade preditiva de compreender como os fenômenos climáticos se manifestarão”, disse Cloves citando a seca na Região Norte. “O comportamento das chuvas e dos rios mudou de forma imprevisível. E ninguém estava preparado para isso. Mudanças como essas impactam diretamente os negócios dos parceiros privados e influenciam os investimentos que eles farão, com base na demanda”.
Fundo Clima
Para Tiago Toledo Ferreira, chefe do Departamento de Transporte e Logística do BNDES, a transição ecológica é o principal desafio da nossa era e não pode mais ser tratada como uma questão separada. De acordo com ele, o banco já está se preparando para esse novo cenário, mas ainda depende de contratos mais tecnológicos. Nesse contexto, o Fundo Clima surge como uma resposta às demandas atuais.
“O Fundo Clima, que anteriormente destinava cerca de R$ 200 milhões por ano, com limite de R$ 80 milhões por projeto, era insuficiente para garantir a viabilidade econômica de muitos projetos. Neste ano, o fundo foi ampliado para R$ 10 bilhões, com possibilidade de até R$ 500 milhões por projeto. Essa mudança altera a equação de risco dos projetos e começa a viabilizar soluções, incluindo aquelas que envolvem tecnologias emergentes, que podem não ter retorno imediato”, afirmou Tiago Toledo Ferreira.
Tiago Sousa Pereira, diretor-presidente substituto da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), destacou que, desde o início das concessões, diversos eventos impactaram a performance dos contratos de forma recorrente, incluindo desastres naturais, como o recente episódio no aeroporto de Porto Alegre (RS). Contudo, a agência conseguiu lidar com a situação aplicando as cláusulas de caso fortuito e força maior previstas nos contratos. O terminal ficou inundado por 25 dias, além do período adicional necessário para as obras de recuperação.
“Houve um seguro contra enchentes, que foi apresentado pela própria concessionária. Ou seja, o dano estava coberto, mas a extensão do prejuízo não era passível de ser segurada. Foi com base nesse contexto que utilizamos o mecanismo previsto, o que se mostrou fundamental para adotar uma medida cautelar. Isso possibilitou que o governo disponibilizasse, de forma emergencial, mais de R$ 400 milhões, permitindo à concessionária contar também com o apoio do BNDES para a recuperação”, explicou Tiago Pereira.
Licenciamento ambiental
Apesar das questões climáticas, alguns concessionários ainda enxergam insegurança jurídica quando se deparam com o licenciamento ambiental. A Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) já trabalha com esse cenário, ressaltou o presidente da empresa,Thomaz Miazaki.
“Essas são as duas referências em que temos trabalhado bastante. Primeiramente, a segurança jurídica do processo de licenciamento, com uma instrução robusta, e, em seguida, a celeridade nas decisões para garantir a viabilidade dos projetos”, afirmou.
Marcelo Guidotti, CEO da EcoRodovias, enfatizou a importância de considerar não apenas como o clima pode afetar os empreendimentos, mas também como esses empreendimentos podem impactar o clima. Para ele, as obras precisam ser realizadas com responsabilidade, e o setor de infraestrutura não pode depender de “aventureiros”. A inovação, impulsionada pelos desafios climáticos, deve ser encarada como uma situação favorável.
“As empresas precisam encarar isso como uma oportunidade. Porque é uma oportunidade que vai gerar valor para o setor privado. Não podemos permitir que o setor de infraestrutura seja invadido por aventureiros, atraídos por investimentos de fundos ou por interesses de grupos que assumem todos os riscos. O setor privado precisa assumir sua responsabilidade, inovar e entender que estamos diante de uma situação dinâmica, em constante mudança, que exige adaptação”, afirmou.