TCU pede revisão de valor de obras e prazo de processo competitivo em primeira repactuação de concessão rodoviária

Sheyla Santos, da Agência iNFRA

O TCU (Tribunal de Contas União) aprovou nesta quarta-feira (25), em sessão plenária, a repactuação do contrato de concessão da Eco101, da EcoRodovias, para exploração de 478,7 quilômetros da BR-101/ES, assinado em 2013.

O relator do processo na corte de contas, ministro Walton Alencar Rodrigues, afirmou que o acordo em questão, a primeira repactuação rodoviária realizada no âmbito da Secex Consenso (Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos) do TCU, promove “profundas mudanças no contrato” da concessão, com alteração de parâmetros críticos, como equilíbrio-econômico-financeiro, matriz de risco, TIR (Taxa Interna de Retorno) e custos dos investimentos.

O relator votou por aprovar a proposta de solução consensual determinando condicionantes, como ajustes pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) dos custos associados a investimentos (capex) e operação (opex), que estariam acima da média de mercado. Determinou ainda que seja revisto o prazo acordado de 70 dias para empresas avaliarem o edital do processo competivivo para a disputa do novo contrato repactuado.

Essas duas mudanças mexem no acordo feito na mesa de negociação e, por isso, será necessário que as partes concordem com o que foi apresentado pelo TCU em nova rodada de negociação. Há outras determinações de mudanças na proposta que não precisam passar pela mesa de negociação, mas que terão que ser feitas pela ANTT. A primeira é um processo de audiência pública sobre a proposta, e a outra, uma avaliação da capacidade econômico-financeira da atual concessionária.

Apesar dos elogios ao modelo de repactuação, com a indicação de que ele não fere principios da mutabilidade contratual e a de que a solução é a mais vantajosa ao intersse público, o relator Walton Alencar, que acompanha os processos de concessão desde a década de 1990 como ministro do órgão de controle, fez críticas ao processo, indicando que a celeridade não é justificativa para que os procedimentos necessários deixem de ser realizados.

Para viabilizar a repactuação, a tarifa de pedágio da concessão poderá ser reajustada em até três vezes em relação ao valor atual, a quantidade de obras foi reduzida em relação ao contrato original, a taxa de retorno foi aumentada e a vigência do contrato foi ampliada em 10 anos, passando de 25 para 35 anos, com possibilidade de ir a 40 anos se for incluída uma obra posterior.

A avaliação é que essas mudanças são melhores do que um possível processo de relicitação do contrato que resultaria em tarifas que poderiam ser superirores e mais tempo sem qualquer investimento de melhoria na rodovia.

O acordo tem previsão de novos investimentos na ordem de R$ 7,18 bilhões. Desse montante, deve ser aportado R$ 1,87 bilhão entre o primeiro e o terceiro ano do novo contrato. O projeto agora prevê a duplicação de 169 quilômetros, sendo 80 quilômetros até 2026, além de 41 quilômetros de faixas adicionais, 11 quilômetros de marginais e construção de dois PPDs (Pontos de Parada e Descanso).

Posição contrária
A AudRodoviaAviação, Unidade de Auditoria Especializada em Infraestrutura Rodoviária e Aviação Civil, manifestou-se contrária à celebração do acordo. Segundo o relator, a atualização do modelo regulatório também sofreu questionamentos por parte do MPTCU (Ministério Público junto ao TCU).

Para a AudRodoviaAviação, as alterações propostas “ultrapassam os limites legais para a mutabilidade dos contratos de concessão, não preservam o equilíbrio econômico-financeiro original, nem obedecem o prazo contratual”. O MPTCU, por sua vez, decidiu pela solução consensual mediante a adoção de condicionantes. A SecexConsenso, o Ministério dos Transportes e a ANTT defenderam o modelo, e a maior parte das propostas apresentadas foi referendada no plenário.

Modernização do contrato
A proposta aprovada prevê ainda a modernização do contrato de concessão para os moldes dos contratos da 5ª etapa de concessões da ANTT e a fixação de um período de transição para garantia de execução dos investimentos com procedimento de extinção antecipada consensual, em caso de descumprimento pela concessionária das obrigações previstas.

As condicionantes também incluem avaliação de haveres e deveres e a realização de processo competitivo para oferta das ações do atual grupo controlador da SPE (Sociedade de Propósito Específico) ao mercado a fim de validar valores e mitigar os riscos. O objetivo do processo competitivo, segundo o TCU, é oferecer ao mercado a possibilidade de arrematar o contrato remodelado com a Eco101 e, com isso, assumir o controle da SPE. O referido processo terá como critério o menor valor de tarifa de pedágio.

“Os lances dos interessados deverão considerar, obrigatoriamente, o pagamento pela venda integral das ações pertencentes ao atual grupo controlador da SPE, no valor de R$ 320 milhões (agosto/2024), acrescido dos bens reversíveis não depreciados ou amortizados após agosto de 2024”, explica o relatório.

Caberá à concessionária disponibilizar informações sobre a SPE ao mercado. Os eventuais interessados poderão realizar due dilligence, que consiste na análise de informações. Antes da publicação do edital do processo competitivo, a ANTT disponibilizará dados gerais do projeto, permitindo contribuições, “desde que não contraponham as condições definidas no acordo”.

Valor da indenização
O valor de indenização foi obtido por meio de um acordo. De R$ 1,28 bilhão que a Eco101 tem como valor do ativo, serão deduzidas dívidas relativas à ANTT, ao desconto de reequilíbrio concentrado para investimentos previstos e não executados, à Dívida Ativa da União e dívidas junto ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Essa lista inclui processos trabalhistas, infrações ambientais, além de uma dívida de R$ 183,5 milhões oriunda da operação “Infinita Highway”, realizada pela Polícia Federal, que decorre de vantagem indevida obtida pela não aplicação de descontos tarifários pela concessionária.

‘Leading case’
O ministro e presidente do TCU, Bruno Dantas, afirmou que a repactuação da Eco101 servirá de “leading case” (caso paradigmático). “Vai parametrizar todas as futuras negociações em concessões de rodovias”, disse Dantas.

Mais cedo, Dantas participou de um dos painéis do evento “O Efeito do TCU no Consenso da Administração Pública”, promovido pelo IBDA (Instituto Brasileiro de Direito Administrativo), no qual seguiu na defesa do consensualismo na adminsitração pública. Ele explicou que a divergência interna entre as áreas de auditoria do tribunal pode ocorrer, mas que são “opiniões qualificadas” e que a palavra final cabe ao plenário. E que o consenso tem que ser entre as partes.

“Tem que ter consenso entre as partes. E o TCU não é parte. A unanimidade estava sendo interpretada como entre todos os membros da comissão, mas não era. Era entre as partes”, afirmou o ministro. 

Crítica contra ação no STF
Dantas também criticou o pedido de suspensão do modelo de solução consensual no tribunal, apresentado pelo Partido Novo ao STF (Supremo Tribunal Federal) alegando que, se não houver modelos de solução de conflito em contratos de longo prazo, o que se está defendendo é uma “solução estatizante”.

“Me custa crer que quem defende a liberdade empresarial, em soluções pelo mercado, que quem confia no mercado para suprir as deficiências do Estado, seja contra criar um ambiente institucional para revitalizar contratos que estão em crise”, disse Dantas. “Se não há isso, as empresas vão à bancarrota, e a solução é estatizante.”

Também nesta quarta-feira, o TCU apresentou melhorias na página interativa para acompanhamento dos pedidos de solução consensual que tramitam pelo órgão. Entre outras informações, a página reúne os processos, status e respectivos acórdãos.

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