Dimmi Amora, da Agência iNFRA
O governo federal e o governo de Minas Gerais articulam para que o trecho ferroviário entre as cidades de Lavras e Varginha, com cerca de 130 quilômetros, seja delegado ao estado para que seja feito um chamamento público estadual que vai passar essa ferrovia para a administração privada.
A passagem dessa ferrovia para que o governo estadual possa levá-la ao setor privado foi negociada dentro do pacote de apoio do governador reeleito do estado, Romeu Zema, com o presidente Jair Bolsonaro, que disputa o segundo turno das eleições de 2022.
O governo mineiro pediu a delegação do trecho por causa do interesse manifestado em uma grande operação de transporte de carga por ferrovia, baseada especialmente no transporte de café para exportação, fertilizantes importados, além de produtos industriais de alto valor agregado.
Em Varginha funciona o Porto Seco Sul de Minas, que tem faturamento bilionário e trabalha num grande projeto para escoar suas cargas por via ferroviária pelo porto de Angra dos Reis, na região sul do Rio de Janeiro.
A ferrovia até Lavras, hoje praticamente inativa, seria o primeiro passo. Num termo de ajustamento que assinou com o governo federal, a FCA (Ferrovia Centro-Atlântica), responsável pelo trecho, prometeu devolvê-lo operacional ao governo até o fim de 2023.
Para isso, terá que fazer investimentos, já que os trilhos hoje não estão em condições de receber trens para o transporte de cargas. A ideia do governo mineiro é, com essa requalificação, abrir o chamamento público para encontrar uma empresa para administrar o trecho.
Atendendo a pedidos
O secretário nacional de Transportes Terrestres do Ministério da Infraestrutura, Felipe Queiroz, afirmou que houve pedidos de parlamentares de Minas Gerais e do Rio de Janeiro para que o governo delegue o trecho ao estado. O trecho faz parte de um plano estadual de ferrovias e, como é uma demanda específica do estado, a decisão é por fazer a delegação.
Felipe explicou que estão sendo acertados detalhes técnicos para que o protocolo para a delegação possa ser assinado ainda neste mês. Ele acredita que esse projeto poderá ser exemplo para outros trechos de ferrovias que tenham interesse local e que o governo federal receberá dos concessionários que não quiserem incluí-los nas renovações de seus contratos.
“O chamamento é um instrumento muito mais simples de se fazer e, assim, ampliar a oferta de transporte ferroviário. Os trechos que não tiverem interessados, teremos mais facilidade para justificar que eles devem ser descomissionados. Acho que esse será o caminho para reestruturar a malha”, disse Felipe à Agência iNFRA.
O trecho seguinte a Lavras, que vai até Barra Mansa (RJ), já é operado pela FCA, que pertence à VLI. Nessa região do Rio de Janeiro, há outras conexões ferroviárias que chegam aos portos do Rio de Janeiro e de São Paulo, além de ser próxima à rodovia Presidente Dutra.
Carga conteinerizada
Mas, de acordo com Delmo Pinho, ex-secretário de Transportes do Rio de Janeiro e hoje assessor para o tema da federação do comércio do estado, a intenção do grupo mineiro é operar os produtos pelo porto fluminense de Angra dos Reis, com operação em contêineres. A estimativa é que essa operação ferroviária com contêineres no porto seco passe o volume de 93 mil ao ano para mais de 183 mil.
Entre Barra Mansa e Angra dos Reis há uma ferrovia muito antiga que não tem condições de operar e será devolvida pela FCA ao governo. Segundo o secretário Felipe, a empresa tem que apresentar um projeto básico para a requalificação da linha. A partir dele, o governo federal pretende abrir um outro chamamento público para encontrar quem possa reconstruir e operar esse trecho.
Segundo ele, essa é uma operação mais complexa e, por isso, o modelo de chamamento para ferrovias privadas será importante para criar novos trechos operacionais. De acordo com Felipe, o governo pode fazer um estudo mais simplificado sobre a ferrovia por ela ser privada, o que faz o risco ser assumido pela empresa que pedir para operar.
Trilhos e regulação
Um especialista do tema, que pediu anonimato, também alertou que há necessidade de, antes da delegação efetiva, melhorar o atual projeto da FCA para o trecho Varginha-Lavras, que teria trilhos com uma capacidade muito baixa. Segundo ele, isso pode levar à necessidade de troca dos trilhos por um de maior capacidade no momento em que o projeto começar.
Ele alertou também para a necessidade do governo de Minas Gerais desenvolver um sistema para a regulação do setor ferroviário. Em Minas, houve a aprovação de uma lei estadual para autorizar ferrovias, mas não há uma agência reguladora definida ainda para o tema.
Outra necessidade é que o governo federal dê prosseguimento à regulamentação da Lei 14.273/2021, a Lei de Ferrovias, por meio de um decreto que está em discussão há 10 meses. Um dos temas a ser regulamentado é o chamamento público. A proposta final de texto está na Casa Civil e a estimativa é que possa sair ainda no atual governo.