Em posse nas agências, ministro verbaliza preocupações com “retrocessos” na infraestrutura

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio, aproveitou as cerimônias de apresentação de quatro novos diretores de agências reguladoras, três na ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e um na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), para indicar preocupações com o que está sendo qualificado como “retrocessos no setor” que estão sendo indicados pelo futuro governo.

A transição no Ministério da Infraestrutura tem sido das mais tranquilas da Esplanada, com acordos sendo costurados para parar ou dar andamento a processos que o governo eleito deseja ou não dar continuidade e troca de informações intensa entre as equipes que saem e que entram.

A ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior, que na prática liderou o grupo de trabalho do futuro governo, é respeitada e admirada pela maior parte da equipe do ministério, o que facilitou o trabalho. O senador Alexandre Silveira (PSD-MG), cotado para a pasta, também vem sendo bem recebido.

O fato de eles estarem sendo cogitados para cargos na área no futuro governo para liderar projetos da pasta vinha facilitando as conversas que foram sempre na linha da continuidade da maior parte dos projetos.

Mas o indicativo de que a pasta será dividida em duas – Ferrovias e Rodovias; e Portos e Aeroportos – e a aprovação na última terça-feira (13) de uma mudança nas leis das agências e das estatais para reduzir o tempo de quarentena de políticos para ocuparem cargos trouxe descontentamento em vários agentes privados e também no setor público.

Mesmo na equipe de transição, a solução de dividir a pasta não foi bem recebida e o relatório final entregue na segunda-feira recomendou que a pasta seja mantida como está. Mas, para evitar constranger o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, segundo uma fonte que elaborou o texto, o relatório indicou que, caso seja necessária a divisão, houvesse apenas duas pastas.

“Boi de piranha”
A divisão tem sido apontada como necessidade de atender a interesses dos partidos e a forma de acomodar uma base parlamentar para sustentar o futuro governo. O indicativo atual segue sendo que o PSD ficará com a área de transportes terrestres. PSB, MDB e agora também o União Brasil estariam brigando pela outra parte. O PT teria a estrutura que é hoje do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) acoplada à estatal de projetos Infra S.A.

No caso da mudança das leis das estatais e das agências, a avaliação de agentes do mercado é que o PT serviu de “boi de piranha”, ao anunciar a indicação de Aloizio Mercadante para o BNDES no mesmo dia em que houve a mudança da lei, já que os parlamentares já vinham tentando fazer há alguns anos a alteração para acabar com a quarentena de três anos.

“Passar o bastão”
O ministro Marcelo Sampaio verbalizou em seus discursos na quarta-feira (14) a oposição ao que está sendo apontado como “retrocessos”. Ele lembrou que a jornada da atual gestão foi cumprida e desejou que o futuro governo seja ainda mais exitoso.

“Agora é o momento de passarmos o bastão. Cumprirmos nossa jornada. E desejarmos que o próximo ciclo seja também vitorioso. Que possam ir melhor que nós fomos, entregar mais que entregamos, porque é isso que o Brasil merece. Tenho certeza e convicção que teremos brasileiros com esse mesmo ímpeto e dedicação, em transformar a infraestrutura do Brasil cada vez mais numa infraestrutura de primeiro mundo”, disse Sampaio na cerimônia da ANTT.

Aritmética
Depois, sem citar o futuro governo, o ministro lembrou pontos que ajudaram o atual governo a “ter quatro anos exitosos”. Ele disse que os projetos tocados na atual gestão vinham de governos anteriores e foram continuados – a paralisação de projetos tem sido um dos receios de empresas do setor. E completou que a agenda do setor é de “Estado”.

“A agenda da infraestrutura é a agenda da aritmética. A gente afastou a agenda de ideologia da [agenda da] engenharia no ministério, porque sabemos que é uma agenda que precisa de continuidade, ser de Estado”, disse Sampaio.

O ministro lembrou que, para isso, foi importante a colocação de “técnicos nas posições”, classificando-os como “liberais”. Sampaio citou que a pasta recebeu “oito companhias docas deficitárias” e entregará sete dando lucro e uma privatizada, chamando o modelo de desestatização da Docas do Espírito Santo de “inovação”.

“Esse é o Brasil que dá certo. O Brasil que acredita nos técnicos. O Brasil que acredita no planejamento integrado”, disse Sampaio.

Eficiência
O ministro, que é servidor de carreira da pasta, lembrou que havia antes, quando as pastas eram separadas, conflitos com ferrovias nas chegadas dos portos, o que foi solucionado pela atual gestão. “Essa visão integrada do setor de infraestrutura traz para nós eficiência”, defendeu o ministro. 

Sampaio também indicou outra oposição ao governo eleito, que é a contrariedade aos processos de privatização, o que foi declarado pelo presidente eleito em discurso nesta semana. 

“Nesse período de quatro anos, fizemos 36 arrendamentos portuários. Outro recorde para celebrarmos. Mostra o setor privado querendo investir. Setor ousado, que acredita no Brasil. E esse é o Brasil que dá certo. Quando o setor público entende o papel do setor privado”, disse Sampaio na cerimônia da ANTAQ.

Integridade
Sampaio lembrou ainda do cuidado com os bens públicos e o tratamento da “coisa pública com integridade”. “Fizemos isso nos últimos anos e vamos deixar um grande legado na agenda da infraestrutura brasileira”, disse Sampaio.

Na ANTAQ, foram nomeados os três novos diretores: Almirante Lima Filho, Alber Vasconcelos e Caio Cesar Farias. Na ANTT, o diretor nomeado foi Felipe Queiroz. Também foi dada posse ao novo auditor-geral, João Vicente Morais, ao procurador-geral, Milton Gomes, e à corregedora Ana Carolina Arrais.

Críticas à mudança da lei
Em nota, o IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás) disse ver “com preocupação” propostas de mudanças na lei das estatais sem o devido debate com o Congresso e a sociedade brasileira.

“É importante ressaltar que o advento da Lei das Estatais representou um avanço no âmbito da gestão pública, com o fortalecimento da governança de empresas públicas ou de economia mista”, informa a nota, indicando que a nomeação de diretores ficou “mais alinhada aos princípios da transparência e da meritocracia”.

A MoveInfra, que representa empresas do setor de infraestrutura de transportes listada na B3, também mostrou, em nota, “preocupação [com] o procedimento legislativo que pode resultar em retrocesso nas leis 13.303/2016 (Lei das Estatais) e 9.986 (Lei das Agências)”.

“Os requisitos introduzidos por essas duas legislações buscam, de forma objetiva, elevar a qualificação técnica. Isso representou avanços no âmbito da gestão pública. Avanços que permitiram indicações baseadas em critérios técnicos, alinhadas à transparência e à meritocracia, princípios consagrados pelas boas práticas internacionais e avaliados positivamente por investidores de longo prazo”, informa o texto, lembrando que uma alteração sem debate “afeta negativamente o ambiente de negócios”.

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