Entidades alegam que minuta apresentada pela ANTT sobre Trip restringe o mercado

Jenifer Ribeiro, da Agência iNFRA

Em uma audiência pública sem entendimento, entidades ligadas às novas empresas de Trip (Transporte Rodoviário Interestadual de Passageiros) defenderam que a proposta de marco legal para o setor apresentada pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) não permite a abertura do mercado.

A afirmação foi feita na última terça-feira (1º) durante audiência pública para debater as alterações que foram incorporadas à primeira versão da minuta de resolução do novo marco regulatório do Trip e aos dispositivos relacionados aos critérios de inviabilidade econômica e técnica para o ingresso de novas empresas.

A audiência realizada é resultado da reabertura da consulta pública, que aconteceu no meio do ano passado, sobre o novo marco legal do setor, devido ao novo entendimento acerca do assunto no STF (Supremo Tribunal Federal) e no TCU (Tribunal de Contas da União).

Regras anticoncorrenciais
Representantes da FlixBus, da Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia) e do Instituto Livre Mercado afirmaram que a minuta apresentada não dialoga com o modelo de autorização de novas linhas e caminha no sentido de manter o mercado fechado.

André Porto, da Amobitec, disse que a norma vai restringir a concessão de novas linhas nas principais rotas do país caso as regras apresentadas não sejam modificadas. Para a representante da FlixBus, Andreia Mustafa, sem alterações, o novo marco vai permitir que mercados com somente uma empresa atuante siga com poucos operadores.

Por sua vez, o diretor-executivo da AFMOB (Associação Brasileira pelo Futuro da Mobilidade), Bruno Azambuja, e o presidente do Sindicato do Transporte Alternativo do Brasil, Alexandre Fausto, explicaram que a minuta prejudica pequenas e médias empresas ao criar barreiras econômicas para a entrada de novas autorizatárias.

Os representantes da ANTT defenderam que a proposta apresentada vai trazer oportunidade de novos negócios, acarretar no aumento da oferta de serviços para usuários, na ampliação progressiva da concorrência, no estabelecimento da regulação gradual e em maior segurança jurídica.

Decisões da Justiça
Outra avaliação apresentada pelas associações presentes na audiência ligadas às empresas de Trip não reguladas é a de que a proposta de normativo apresentada pela ANTT descumpre as decisões recentes do STF e do TCU.

Em março deste ano, o STF formou maioria pelo entendimento de que a oferta de serviços de transporte rodoviário coletivo de passageiros interestadual e internacional por autorização, sem licitação prévia, é constitucional e recomendou que a ANTT voltasse a emitir as autorizações.

No mês anterior à decisão do STF, o Tribunal de Contas havia suspendido uma medida cautelar que impedia que a ANTT emitisse novas autorizações para o transporte rodoviário interestadual de passageiros.

No ano passado, na primeira consulta pública sobre o setor, a ANTT concluiu que as empresas que solicitaram as autorizações de Trip não tinham viabilidade econômica e técnica para prestar os serviços por insuficiência de recursos financeiros ou de produção necessários à operação proposta e que isso afetava a segurança dos usuários.

No entanto, com os novos entendimentos, a agência reguladora aprovou um novo cronograma para o Trip. A expectativa é que a autarquia publique o novo marco regulatório em novembro deste ano e os termos de autorização sejam emitidos ao longo de 2024.

Controle de entrada
A minuta divulgada dispõe que o controle de entrada de novas autorizatárias no serviço de Trip será feito com base na identificação de inviabilidade econômica e técnica de operação. Essa definição foi bastante criticada pelas entidades ligadas às novas empresas, que afirmaram que essa é uma premissa incorreta se o objetivo for a abertura de mercado, posição da qual a ANTT discorda.

A redação cria cinco etapas para determinar a inviabilidade de operação de novas empresas: classificação de mercado, identificação da quantidade de operadores, avaliação da qualidade da operação, avaliação da eficiência da operação e novos operadores mediante vagas.

Com isso, a ANTT classificará cada mercado com base no número de passageiros transportados e determinar quantos operadores são necessários para essas regiões. No caso de mercados subsidiários – com menor movimentação – será permitida a livre entrada de novas empresas. Em locais com somente um operador será autorizada a entrada de mais uma empresa anualmente.

Já para os mercados principais haverá uma separação de três níveis. Em mercados com nível 1, o mais alto, será permitida a entrada de mais 20% de novas empresas anualmente. Para mercados de nível 2, somente uma nova empresa poderá entrar no ano. E mercados principais de nível 3 estão em situação de contingenciamento.

Janela de entrada
Essas entradas poderão ser realizadas durante uma janela anual estabelecida pela agência reguladora, o que segundo a ANTT permitirá a ampliação de forma gradual da concorrência no setor. Essa janela será válida tanto para as empresas que já são reguladas, quanto para as não reguladas.

A primeira janela estabelecida no cronograma apresentado pela ANTT será em janeiro de 2025. A modalidade de entrada das empresas no setor de forma gradual também foi alvo de críticas das entidades ligadas às novas empresas.

Com isso, pelo que apurou a Agência iNFRA, existe a possibilidade de as empresas não reguladas continuarem a entrar com pedidos na justiça para operar linhas sem autorização via liminar, como tem acontecido nos últimos anos.

Desde o início das discussões sobre o Trip há falta de consenso entre as empresas reguladas e as não reguladas. Associações, entidades e grandes empresas do setor declaram que o novo regimento precisa prever regras bem definidas de qualidade e de segurança para os usuários. Por sua vez, associações ligadas às novas empresas entendem que há uma reserva de mercado no setor.

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