Dimmi Amora, da Agência iNFRA
A ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) está analisando mais de 200 processos de denúncia contra armadores de contêineres por cobrança indevida de “detention”, que é a entrega dos contêineres cheios de carga fora do prazo dado pelos armadores aos exportadores de carga.
A informação foi dada pela diretora da agência Flávia Takafashi, durante o evento P3C, realizado no fim de fevereiro, em São Paulo. Segundo ela, a agência está convocando as empresas para tentar chegar a um acordo e evitar que uma avalanche de processos de cobrança tenha que ser julgada pela diretoria da agência.
“É o nosso grande problema no momento”, explicou a diretora em entrevista à Agência iNFRA após o evento.
Quando uma exportação é contratada, os donos dos navios (armadores) entregam contêineres vazios ao exportador para que a carga seja colocada nessa unidade. O exportador ou seu agente tem um prazo, em geral de cinco a 10 dias, para levar o contêiner cheio até o terminal portuário combinado com o armador para que o equipamento seja colocado no navio.
Se o exportador entregar o contêiner fora do prazo no terminal portuário que armazena a carga até a chegada do navio, o chamado “free time”, os dias a mais em que o equipamento fica com o exportador são cobrados pelo armador. É a detention.
O crescimento grande do volume de contêineres transportado no Brasil nos últimos anos, a falta de investimentos em terminais portuários (que deixou os existentes cheios) e a baixa previsibilidade da chegada dos navios devido a problemas de navegação em várias partes do mundo bagunçaram esse mercado.
No passado havia muita disputa sobre quem era o responsável por pagar a detention, o exportador ou o terminal portuário. A ANTAQ regulou o tema indicando que, se a cobrança for devido ao atraso do navio, a detention não pode ser cobrada pelo armador.
Segundo Flávia, a agência identificou que os terminais portuários estão se negando a receber os contêineres se os navios estão atrasados. Os terminais alegam que os pátios já estão cheios e por isso eles informam que não têm como armazenar cargas para navios que vão demorar muitos dias para pegar.
As denúncias, segundo a diretora, indicam que os armadores cobram pelo tempo extra, mesmo se o terminal se recusou a receber do exportador a carga no prazo do free time porque o navio não tinha previsão de aportar.
“Temos um problema estrutural [de espaço] que vai ser resolvido com o tempo. Mas o problema que temos que resolver agora é o comportamento dos agentes”, disse Flávia, que está relatando o processo que a agência abriu sobre o tema.
Clientes pedem previsibilidade
De acordo com a diretora, além da conversa com os representantes dos armadores, também estão sendo chamados representantes de grandes associações de exportadores, como a CNI (Confederação Nacional da Indústria), a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), a CNA (Confederação da Agricultura e Agropecuária do Brasil) e outras associações de áreas específicas.
Essas associações pedem que seja criado um modelo de maior previsibilidade para as escalas dos navios. “Eles pedem isso para se organizarem logisticamente e não precisarem tirar o contêiner de seus armazéns com tanta antecedência”, explicou. “Se o armador não dá previsibilidade e ainda cobra a detention, há um elo muito fraco na relação.”
Segundo Flávia, nesse processo geral que está analisando o problema, a ideia é sair uma orientação para que todas as áreas da ANTAQ possam aplicá-la nas denúncias que chegarem e evitar assim que as centenas de denúncias tenham que ser avaliadas uma a uma na diretoria colegiada do órgão.
Alguns processos que pedem liminar contra a cobrança já chegaram à deliberação do plenário, segundo ela, mas não houve ainda julgamento de mérito em nenhum. “Se não [tiver orientação geral], vamos passar a deliberar só isso. Porque todo dia está chegando.”
Impacto no Tecon 10
A diretora da agência acredita que ainda vai ser preciso avaliar se esse problema terá algum impacto na análise concorrencial que a ANTAQ está fazendo para decidir sobre se haverá ou não restrições à concorrência pelo novo terminal de contêineres em Santos (SP), o Tecon 10, cuja licitação está prevista para este ano.
“O que de fato vai impactar na análise é a concorrência entre os terminais. A gente considera o funcionamento da cadeia, mas não diria que é o fator mais importante”, disse a diretora.
No evento, Flávia citou o interesse de grandes grupos internacionais nesse leilão, o Hudson Ports, dos Estados Unidos, e o PSA, de Singapura, que não operam no Brasil. Outros operadores de terminais de contêineres que estão no Brasil, como a APM Terminals, a TiL e o grupo JBS, também estão sendo apontados como interessados no negócio.