Dimmi Amora, da Agência iNFRA
A 13ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou improcedente recurso da Localfrio Armazéns Gerais que pedia revisão de sentença de primeira instância que julgou procedente a cobrança pela BTP (Brasil Terminal Portuário) do SSE (Serviço de Segregação e Entrega), também chamado de THC2. A decisão está neste link.
A sentença foi proferida em 12 de fevereiro, apenas sete dias depois de uma outra decisão da 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, que considerou a cobrança ilegal e acatou recurso da Marimex em ação em que essa companhia havia sido condenada a pagar à Embraport por esse serviço. A decisão está neste link.
Localfrio e Marimex são terminais retroalfandegados, sem acesso à área onde os navios atracam. Essas empresas alegam que os terminais com acesso (chamados molhados) usam essa cobrança como concorrência desleal e tentam anulá-la. Eles alegam que os navios recebem dos clientes o chamado box rate, onde está incluído o THC (Terminal Handling Charge), que deveria pagar por toda a movimentação de contêiner no terminal molhado.
Os terminais molhados alegam que, no serviço de importação, recebem apenas para retirar os contêineres do navio e colocarem em solo e que o serviço de movimentação para empilhá-los no terminal e entregá-los aos retroalfandegados requer movimentações extras que devem ser cobradas.
Essa guerra judicial ocorre desde a privatização dos serviços portuários, no fim do século passado, sem que se chegue a uma conclusão, nem na Justiça, como mostram as duas sentenças do mesmo tribunal, com decisões opostas em menos de uma semana, nem em órgãos administrativos.
O valor do THC 2 varia muito de porto para porto. Em algumas regiões, a taxa fica por volta de R$ 200. Em outras unidades, chega a custar R$ 1,5 mil por contêiner.
O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) mantém entendimento de que a cobrança do THC2 é abusiva. O TCU (Tribunal de Contas da União) também critica, mas determina que a ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) deve regular a abusividade da cobrança. A agência revisou recentemente a resolução que permite a cobrança do SSE para criar as regras para definir sobre a abusividade, mas reconheceu que sua cobrança é legítima.
No caso da sentença da 13ª Câmara, o relator Francisco Giaquinto não obteve unanimidade em sua decisão, tendo sido acompanhado por três desembargadores. Dois foram contrários.
Para Giaquinto, há prestação de serviços na movimentação dos contêineres e “a pretensão de proibição da cobrança da THC2, além de ser contrária à regulamentação estabelecida pela ANTAQ, configura flagrante enriquecimento sem causa das instalações portuárias alfandegadas, tornando inviável a atividade do operador portuário, que teria que arcar com todos os custos da operação, sem nada receber pelo serviço prestado”.
Insegurança para investimentos
Cassio Lourenço Ribeiro, sócio da Lourenço Ribeiro Advogados, que representa terminais molhados em ações sobre o tema, afirma que a maioria das decisões sobre o THC2 tem sido favorável à permissão de cobrança. Segundo ele, o mais provável é que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) tenha que decidir sobre essas contradições.
“Essas decisões extravagantes causam uma enorme perplexidade. A decisão desfavorável à Ecoporto no TRF-3 foi dada pela mesmíssima 4ª Turma que, dois anos antes, havia decidido favorável e unanimemente a outro operador molhado de Santos”, lembrou Lourenço sobre outro caso.
A consequência desse tipo de decisão, para o advogado, que em geral é tomada por juízes substitutos, é a insegurança jurídica para o investidor de longo prazo que quer aportar recursos no sistema portuário.
“Para o investidor que apostou no desenvolvimento da infraestrutura portuária, a insegurança é enorme. De um lado, comprometem-se com o Estado brasileiro a atender à demanda portuária por meio de vultosos investimentos. De outro, correm um risco permanente de serem proibidos a qualquer momento de auferir a receita que faz frente aos investimentos.”
Decisão a favor da concorrência
O advogado da Marimex, Rui Camilo, afirmou que a decisão da 30ª Câmara foi a primeira a analisar com profundidade o caso do THC2, avaliando os aspectos concorrenciais da cobrança.
“A Câmara não olhou a árvore. Viu a floresta”, avaliou o advogado. “Essa decisão será fundamental na inflexão para a jurisprudência desse caso.”
Camilo lembrou que a decisão da 30ª Câmara reverenciou o que já havia sido decidido pelo Cade, fortalecendo o entendimento do órgão de defesa da concorrência de que essa taxa é uma prática abusiva. Para ele, especialmente em Santos (SP), onde o espaço portuário é limitado, o THC2 se torna nocivo para a concorrência.
“Essa foi uma decisão pró-mercado. Não há qualquer justificativa para essa cobrança que é puramente uma barreira concorrencial.”