Dimmi Amora, da Agência iNFRA
O processo de renovação antecipada da malha ferroviária da MRS Logística está entrando em sua reta final, após mais de dois anos de aberta a audiência pública sobre o tema, iniciada em junho de 2019.
Operadora da Malha Central, ferrovia que liga as três maiores regiões metropolitanas do país, São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, a empresa entrou em 2015 com o pedido de renovação por mais 30 anos da concessão em troca de investimentos estimados na casa dos R$ 18 bilhões.
A proposta foi direcionada para que a MRS, atualmente concentrada no transporte de minério, possa transitar para ser uma operadora com maior foco no transporte de carga geral, conforme explicou seu diretor à Agência iNFRA em 2019.
As principais questões levantadas ao longo do processo de audiência pública que ocorreu a partir de 2019 já estão encaminhadas, como o direcionamento do investimento cruzado para apoiar a viabilização do projeto do TIC (Trem Intercidades) de São Paulo, as obras que serão feitas nos outros estados e a realização de projetos executivos para os investimentos que serão realizadas pela concessionária.
Mas remanesce um conflito que surgiu ao longo do processo e ganhou força neste ano: a questão da operação da ferradura de Santos (SP), trecho da ferrovia que dá acesso ao maior porto do hemisfério sul.
Conforme mostrou reportagem da Agência iNFRA, no processo para uma nova modelagem da Fips (Ferrovia Interna do Porto de Santos), que hoje é operada pela Portofer, tornou-se pública uma pressão para que os novos operadores da ferrovia assumam o trecho da ferradura que hoje está em poder da MRS (reportagem neste link).
A alegação é que, nas mãos da MRS, haveria risco para a operação da ferrovia dentro do porto e que os custos para se operar no trecho que compete à concessionária seriam elevados. Não há como chegar ou sair do porto sem passar pelo trecho da MRS, mesmo outras concessionárias que chegam com suas ferrovias à cidade de Santos, como a Rumo Malha Paulista e a FCA (Ferrovia Centro-Atlântica).
Em artigo para a Agência iNFRA, a diretoria da MRS se posicionou sobre o tema, alegando que fez os investimentos necessários para manter a capacidade da ferradura ao longo do contrato e atender a todos os clientes, mantendo sempre uma ociosidade maior que 20% no trecho, e nunca foi gargalo para o porto.
Ao longo deste ano, estão sendo realizados estudos e avaliações sobre a questão, além de reuniões com os envolvidos, e não se chegou a um consenso. A MRS não abre mão de se manter na sua parte da ferradura e a Autoridade Portuária de Santos quer que pelo menos os pátios da área operada pela MRS fiquem sob o controle da Fips.
Na avaliação de envolvidos no processo que defendem esse modelo, haveria maior segurança para a operação do porto se pelo menos todos os pátios ficarem sob o controle da Fips, de onde se poderia manejar a entrada e saída dos trens sem risco de gargalo na operação.
Já os que defendem a manutenção da MRS, informam que a operação da Fips e da Ferradura já é feita em conjunto e não fará diferença técnica se os pátios ficarem com a MRS. Todos falam sob condição de anonimato para a Agência iNFRA.
Disputa comercial
No fundo, a questão envolve mais uma guerra comercial sobre as ferrovias, que tem a Rumo Logística como protagonista. Por operar majoritariamente com trens de grãos, a Rumo será naturalmente a empresa que terá a maior participação no consórcio que vai gerir a Fips (o modelo proposto pela Autoridade Portuária de Santos é que cada operador que esteja no porto tenha participação e investimentos proporcionais ao uso da via na Fips, uma espécie de cooperativa).
Como a MRS vai passar a operar prioritariamente com trens de contêineres, que têm tamanho menor que os de grãos, teme ficar sem o espaço adequado para essa operação se não tiver uma posição relevante para participar do controle da via.
Negociação de tarifas
A empresa já enviou informação ao governo de que tem disposição para negociar as tarifas, dentro do processo de revisão que já está ocorrendo na renovação antecipada de todas as ferrovias. E que garante investimentos necessários para operar os supertrens de grãos, de 120 vagões, que a Rumo vai comprar após finalizar as obras na Malha Paulista, para transportar grãos do Centro-Oeste do país.
Lembraram ainda que a Fips pode não sair dentro do prazo que se espera por questões jurídicas internas do porto – o arrendatário de uma área onde passa a nova ferrovia briga na Justiça para se manter no local. Se o trecho da ferradura entrar na Fips, os investimentos podem atrasar ainda mais.
Decisão do ministro
Questão extremamente técnica, política e comercial, não haverá outra solução além de uma decisão que será levada ao ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas. Nos últimos dias, quando perguntado sobre o tema, ele tem uma resposta, dizendo que quando tiver tudo pronto, vai decidir e já tem na cabeça o que vai fazer.
Depois da decisão do ministro Freitas, o processo terá finalmente a audiência pública concluída e seguirá para a análise do TCU (Tribunal de Contas da União). Os dois últimos processos de renovação antecipada de ferrovias levados ao TCU precisaram de uma longa avaliação, por mais de um ano.
O ministério acredita que os aprendizados e as decisões já tomadas pelo órgão de controle possam reduzir esse prazo. Mas, o mais provável é que somente em 2022, sete anos depois do pedido de renovação feito pela empresa, a proposta seja concluída para que se possa iniciar os investimentos para ampliação da capacidade da via.