Felipe Lisbôa* e João Paulo Pessoa**
Em razão da necessidade de expansão e melhorias na malha ferroviária nacional observamos nos últimos anos algumas iniciativas, estaduais e federais, que visam alcançar esse objetivo. Assim, passamos a elencar algumas dessas iniciativas e apresentar, de forma não exaustiva, os seus possíveis impactos no setor.
A primeira delas foi a publicação da Lei 13.448/2017, oriunda da Medida Provisória 752/2016, que prevê – entre outros temas – a possibilidade de prorrogação antecipada dos contratos de concessão, incluindo as concessões ferroviárias, mediante contrapartidas financeiras e adoção de melhorias regulatórias.
Entre as contrapartidas, de forma mais concreta, podemos elencar: (a) o aperfeiçoamento dos contratos vigentes, mediante, por exemplo, a definição de novas metas de qualidade e segurança; e (b) a possibilidade de exigência de investimentos imediatos nas malhas concedidas ou, de forma ainda mais inovadora, em outras malhas que não fazem parte dos contratos renovados, os chamados investimentos cruzados.
No caso dos investimentos cruzados, as concessionárias ficariam responsáveis pela construção/expansão de trechos definidos durante a negociação das prorrogações, cabendo posteriormente ao poder público a realização de licitação para concessão desse novo ativo, auferindo (desses novos contratos) outros recursos que também poderiam ser aplicados na malha nacional.
Um outro aspecto importante da Lei 13.448/2017 é a preocupação – digna de nota – de reforçar a necessidade de comprovação da vantagem da prorrogação em relação à realização de nova licitação para o empreendimento. Ou seja, na teoria, as prorrogações antecipadas têm potencial de afetar positivamente todo o sistema ferroviário, uma vez que, além de melhorar os contratos vigentes e garantir a vantajosidade para o poder público, carimbam recursos federais para expansão do setor, criando um verdadeiro círculo virtuoso.
Nessa linha, destacamos as prorrogações dos contratos da Malha Paulista (Rumo Malha Paulista), da EFC (Estrada de Ferro Carajás) e da EFVM (Estrada de Ferro Vitória a Minas), sendo que nesta última, por exemplo, parte do valor da outorga viabilizará a construção da Fico (Ferrovia de Integração Centro-Oeste), comprovando os benefícios da aplicação da Lei 13.448/2017. Vale o destaque de que outros três contratos estão em processo de renovação, sendo eles FCA (Ferrovia Centro-Atlântica S/A), MRS (MRS Logística S/A) e Malha Sul (Rumo Malha Sul).
Somadas a isso, as manifestações favoráveis do STF (Supremo Tribunal Federal) – ADI 5991 – e TCU (Tribunal de Contas da União) – acompanhamento dos procedimentos de prorrogação – ajudam a solidificar os institutos criados pela norma, favorecendo a segurança jurídica para os investimentos em contratos de longuíssimo prazo.
Outra iniciativa, no momento ainda mais em voga, que pode trazer mais investimentos ao setor é a possibilidade de exploração de ferrovias por meio de autorizações em alternativa à adoção do modelo de concessão. Essa iniciativa, de simplificação regulatória, pode ser dividida atualmente em três frentes: (a) pela Medida Provisória 1.065/2021, editada pela pelo Poder Executivo federal; (b) por meio do Projeto de Lei do Senado Federal 261/2018 (Novo Marco Legal das Ferrovias); e (c) as iniciativas estaduais, mediante criação de leis semelhantes, em especial dos estados de Minas Gerais e Mato Grosso.
O PLS 261/2018, quando aprovado, possivelmente substituirá a MP 1.065/21, mas é certo que as inovações propostas mostraram que o modelo interessa aos investidores, considerando que após a publicação da MP e até a presente data já se somam 14 pedidos de autorização ferroviária, conforme noticiado pelo Ministério da Infraestrutura, bem como, no âmbito estadual, o contrato de adesão, sob a regência do modelo de autorização, já assinado pela Rumo para construção de ferrovia (730km) em Mato Grosso com investimentos estimados entre R$ 9 bilhões a R$ 11 bilhões.
No entanto, há também de se dizer que o modelo enfrenta algumas críticas, sendo a principal a possibilidade de criação de desequilíbrio concorrencial no setor, uma vez que pode significar num menor número de contrapartidas como as exigidas nas concessões, criando-se, pelo menos em tese, espécie de assimetria regulatória. Tais críticas apenas serão sanadas ou confirmadas após aprovação do PLS 261 e a regulamentação, que deve vir a reboque da nova Lei.
O fato é que, ainda que existam algumas incertezas, fica evidente que para o Brasil de alto custo logístico e crise orçamentária, essas mudanças podem representar, no curto prazo, o aumento expressivo de investimentos e, no longo prazo, a consolidação do modal ferroviário como fator para transformação e redução do custo da matriz de transporte nacional.