Dimmi Amora, da Agência iNFRA
O acordo para a renovação antecipada da FCA (Ferrovia Centro-Atlântica), a maior em extensão no país, está enfrentando dificuldades para chegar a uma proposta final que seja aceita pelo Ministério dos Transportes e pela empresa, controlada pela VLI.
Nas últimas semanas, a pasta passou a avaliar a possibilidade de não fazer a renovação da concessão e iniciar um processo para licitar, ao fim do contrato, os trechos dos mais de 7,2 mil quilômetros controlados pela concessionária. Pelo menos até o próximo mês, no entanto, não deve haver uma decisão sobre o tema.
As informações sobre a dificuldade em fechar um acordo para a renovação foram confirmadas por diferentes fontes consultadas pela Agência iNFRA, no governo e no mercado, desde que foi encerrado o período de contribuições do segundo processo de consulta pública para a qual foi submetida a proposta de renovação, que foi solicitada em 2015 pela companhia. O contrato vence em 2026.
A proposta levada a audiência pública em agosto do ano passado não arrefeceu as críticas ao que foi apresentado na primeira tentativa, entre 2020 e 2021, pelo governo anterior. Elas só mudaram de foco.
Se na primeira tentativa a crítica era de que o governo estava desviando o dinheiro para melhorar a malha para projetos em outras regiões (investimento cruzado), agora a crítica é de que os investimentos são insuficientes para as propostas que envolvem oito estados por onde a malha passa.
Na avaliação do governo, segundo essas fontes, isso se deve a um projeto apresentado pela empresa que devolve grande parte da concessão (números finais dependem da proposta que vai sair da audiênica pública) e concentra o investimento a ser feito em equipamentos e quase nada em ampliação da capacidade física. Isso irritou especialmente a Bahia, cuja sociedade local vem se posicionando de forma veemente contra a renovação.
Essa crítica é a mesma feita nas renovações das três primeiras malhas ferroviárias, no governo passado, nas quais técnicos do setor indicavam que não havia vantagem em renovar a concessão se era para as empresas comprarem equipamentos para transportar mais carga e investir pouco em ampliar a capacidade das vias. No entanto, as malhas foram renovadas.
Mas o ponto principal agora para a falta de acordo com a VLI está no valor que a empresa está considerando como sendo o adequado para a outorga a ser paga por mais 30 anos de concessão, algo na casa dos R$ 300 milhões pela proposta que foi a audiência.
A maior parte dos R$ 5 bilhões que a conta da empresa mostra como ressarcimento ao governo vem de pagamento de indenização por ativos que serão devolvidos e um adicional de vantajosidade criado na atual gestão para aceitar as renovações. A empresa diz que, no total, serão feitos R$ 24 bilhões em investimentos nos 30 anos de concessão.
Os cálculos iniciais que estão sendo apresentados no EVTEA (Estudo de Viabilidade Técnica Econômico e Ambiental) contratado pelo governo para licitar a concessão – o que era até então um plano B para o caso de não se chegar a acordo de renovação – indicam um valor na casa dos bilhões superior ao estudo da outorga para a renovação.
No meio do conflito entre a empresa, que alega que seus estudos estão corretos e não há carga ao longo da ferrovia que justifique valor maior, e o governo, que acha que o projeto subestima a capacidade ferroviária bem no centro do país, está a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).
A agência referendou as três primeiras concessões de ferrovias no governo passado sob condições que a atual gestão contesta e decidiu mudar. Isso faz com que os técnicos tenham muito mais cautela para avaliar o processo, visto que se sentem inseguros sobre possíveis cobranças no futuro, na avaliação de um técnico que trabalha no tema.
Finalização do EVTEA
O fato agora é que o ministério vai esperar a finalização do EVTEA, o que deve ocorrer entre este mês e o próximo, para tomar a decisão de renovar ou não a concessão. A partir dessas informações é que as conversas com a empresa devem avançar mais, já que a avaliação é de que a companhia tem sido “inflexível” e com uma visão “pouco comercial” sobre o aproveitamento da malha.
Os representantes do governo vêm tentando uma interlocução mais profunda com os acionistas da empresa para tentar entender se será possível mudar a proposta que vem sendo defendida pela direção da VLI.
Criada pela Vale, controlada pela Brookfield
A VLI é uma companhia montada pela Vale no começo do século para explorar corredores de logística, especialmente de grãos para exportação, dedicados a terminais portuários da própria companhia, numa estratégia semelhante à que a mineradora utiliza para seus produtos.
A Vale segue como sócia da companhia, mas agora o controle está com o fundo de investimento Brookfield. Para os técnicos do governo e alguns especialistas do setor privado que falaram com a Agência iNFRA, a visão de corredores, que acaba privilegiando os ativos portuários, segue na companhia.
E isso não seria mais o adequado, especialmente pela localização da malha no centro do país, que teria a capacidade de transportar mercadorias além de commodities agrícolas para exportação. Outros especialistas do setor privado, no entanto, avaliam que essa visão superestima a quantidade de carga que a ferrovia poderia transportar.