Disparada de preços de insumos leva a nova rodada de pedidos de reequilíbrio no setor de transportes

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

Empresas que atuam no setor de infraestrutura na área de transportes estão em estudos avançados para iniciar uma nova rodada de pedidos de reequilíbrio de seus contratos com órgãos públicos em decorrência da Covid-19.

O motivo dos pedidos será a disparada de preços de insumos considerados essenciais para a realização de investimentos ou até mesmo, em alguns casos, para a operação de serviços públicos. A nova rodada deve afetar as concessões em todos os setores e também empresas que têm contratos diretos com a administração para obras.

O descolamento entre os preços de insumos essenciais e os índices inflacionários que corrigem os contratos, especialmente o IPCA, foi demonstrado em estudo realizado pela consultoria Tendências, feito a pedido da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias).

Esse fator ameaça, na visão dos agentes do setor privado ouvidos pela Agência iNFRA, os contratos que já foram firmados, especialmente os que estão em fase de obras no momento ou próximas. E, também, as concorrências planejadas na carteira de projetos de todos os entes governamentais.

Avaliação de previsibilidade
Em entrevista à Agência iNFRA, o diretor-presidente da ABCR, Marco Aurélio Barcelos, afirmou que o estudo foi contratado para que a Tendências pudesse avaliar se os aumentos de insumos provocados pelo período de pandemia de fato ocorreram e se fugiram à normalidade. Mais ainda, se poderiam ser previstos por quem participou de leilões nos últimos anos.

Com programas de computador especializados, foram rodados cenários diversos, baseados em 16 variáveis setoriais de preços, algumas com dados internacionais. O objetivo era comparar o comportamento real dos preços de diversos insumos importantes – como aço, cimento, asfalto, combustíveis e outros – com previsões que pudessem ser tiradas para avaliações de cenários futuros a partir das variáveis.

Essas variáveis consideram dados em diferentes anos, como 2015, 2017 e 2019, sempre períodos em que houve uma crise. O que ocorreu como resultado foi que, para todos os insumos, os cenários criados pelo programa estão com preços sempre muito abaixo do comportamento real, o que para Barcelos comprova que o descolamento entre os índices de preços que reajustam contratos e os preços reais dos insumos era “imprevisível”. 

E o descolamento da curva foi especialmente notado em 2019, mesmo com dados das 16 variáveis setoriais atualizados até aquele ano. Ou seja, mesmo se tivessem sido rodados os melhores programas de previsão, com dados até 2019, eles errariam os preços notados após a Covid-19 em muito, na avaliação do estudo.

“Não havia como prever, por melhor que fosse o modelo [usado por quem venceu os leilões]. A melhor capacidade para precificar existente erraria”, afirmou Barcelos. 

Força maior
A classificação do descolamento dos preços dos insumos em relação aos índices de reajustes oficiais como algo imprevisível e de força maior é parte da solução que a ABCR e outras associações que trabalham no tema querem encaminhar para resolver o problema apontado.

Isso porque o Ministério da Infraestrutura já deu parecer jurídico, ainda em 2020, para caracterizar a Covid-19 como um evento extraordinário e de força maior e, com isso, permitir reequilíbrios de contrato em relação à perda de demanda, o que está em andamento no setor de aeroportos e de rodovias.

Como no caso da demanda, o risco de aumento de insumos é assumido pelos proponentes de concessões ou obras públicas, em praticamente todos os contratos. Barcelos defende que, o que ocorreu após a Covid-19 “é incerteza, não é risco. Risco é algo que você pode administrar”.

Apresentação na ANTT
O presidente da ABCR disse que iniciou um processo de apresentação para os órgãos de governo na semana passada, inclusive na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), para que seja possível fazer, como foi no caso dos reequilíbrios por demanda, um processo “transparente e aberto” de consulta à sociedade. As conversas vão se estender para as concessões estaduais.

A tentativa também será, por parte da associação, de evitar impactos diretos aos usuários de rodovias no pagamento das tarifas de pedágio, buscando outras formas de reequilíbrio dos contratos como reprogramação de obras ou ampliação de prazos de contrato.

De acordo com Barcelos, a situação atual das empresas é de deterioração de seus caixas para sustentar os investimentos diante dos aumentos de custos, o que pode levar a um passivo de “consequências desastrosas” para o futuro.

“Precisamos atacar o mal pela raiz, dando tratamento célere ao problema, como foi com a primeira pernada dos reequilíbrios da Covid-19”, disse o presidente.

Trabalhar no tema
Davi Barreto, um dos diretores da ANTT que esteve na reunião com a ABCR, afirmou à Agência iNFRA que o trabalho apresentado foi bem recebido e que há um espírito para se trabalhar no tema dentro da agência. 

Ele reconheceu que, de fato, há um descolamento entre as correções de valores dos contratos pelos índices inflacionários e os aumentos reais. Mas, segundo ele, a revisão de parâmetros de concessões é um processo complexo, que vai precisar de avaliações por parte da agência e do poder concedente, lembrando ainda que passam por órgãos de controle.

O descolamento de preços que mais afeta o setor rodoviário é o das ligas asfálticas. O comportamento das curvas de preços reais com as esperadas chega a mostrar alguns preços com valores 50% superiores ao esperado pelas previsões criadas no estudo.

Nas primeiras conversas com a ANTT, a tentativa foi a de fazer com que o preço desse insumo, que é proporcionalmente alto dentro de uma obra rodoviária, fosse tratado separadamente nos contratos, dentro de uma banda de flutuação que geraria gatilhos de correção, para mais e para menos.

Barreto disse que fazer a desvinculação de um insumo específico precisa de uma avaliação rigorosa, porque pode afetar o equilíbrio de outros itens do contrato, e que a agência já está trabalhando em alguns mecanismos para melhorar a atualização dos preços dos contratos.

Reajustes no DNIT
A ideia de fazer um reajuste específico para itens é parcialmente usada pelo DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) em seus contratos para obras rodoviárias, cujos preços de parte dos insumos não é corrigido apenas pelo IPCA. Mas, mesmo lá, os problemas estão ocorrendo e as empresas já estão em dificuldades.

É o que afirmou o presidente da Aneor (Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias), Danniel Zveiter, que reúne a maior parte das companhias que prestam serviços ao órgão. Segundo ele, será necessário criar uma frequência maior que a atual (anual) para os reajustes.

A defasagem entre o aumento dos custos dos insumos e o reajuste dos contratos pode levar, segundo ele, as empresas a ficarem sem condições financeiras de tocar contratos e, mais ainda, desistir de concorrências do setor.

“Já temos visto alguns leilões desertos [sem concorrentes], o que era muito incomum até alguns meses atrás”, disse Zveiter. Procurado, o DNIT não respondeu.

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