Roberto Rockmann*
Nas últimas semanas, em reuniões com o governo federal, governadores da região Nordeste e desenvolvedores de projetos voltaram a defender a prorrogação em 36 meses, ou três anos, do prazo de início de operação comercial de empreendimentos de geração renovável, sob a Lei 14.120/2021, obtendo os benefícios da “Corrida do Ouro” (a busca por descontos dentro do prazo da lei).
Isso faria com que os projetos, em vez de terem de entrar em operação até o início de 2026, poderiam ingressar até 2029, quando as linhas de transmissão que estão sendo licitadas devem estar operacionais, segundo os defensores da proposta. O caminho da mudança ainda está em discussão pelos governadores, no entanto, não é fácil por envolver alteração da Lei 14.120/2021.
A legislação que provocou a chamada “Corrida do Ouro” das renováveis, com pedidos de cerca de 200 GW em outorgas, estipula que empreendedores que solicitassem até 2 de março de 2022 a outorga e iniciassem a operação comercial dos projetos em 48 meses da emissão da outorga teriam descontos na conexão ao sistema.
Movimento ganhou força
O movimento para a prorrogação do prazo até 2029, que começou em maio com uma carta dos governadores do Nordeste ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, ganhou novo ímpeto nos últimos dias. O movimento deve ganhar mais corpo nas próximas semanas.
Há duas semanas, representantes do consórcio Nordeste se reuniram em Brasília com a Casa Civil e Ministério do Desenvolvimento para falar da transição energética e da importância de regulação para eólicas offshore e hidrogênio verde. A extensão do prazo de outorgas dos projetos sob a Lei 14.120/2021 também está ligada a isso.
Um dos defensores da prorrogação é o governador do Ceará, Elmano de Freitas, líder do tema energia no Consórcio Nordeste, que congrega os nove estados da região. “Considero de grande importância essa prorrogação das outorgas para a geração de energia, para poder propiciar a concatenação entre os prazos das outorgas e os prazos para a implantação dos sistemas de transmissão de energia correspondentes. Quanto à forma de implementação, estão sendo avaliadas quais as mais adequadas”, informou o governador por meio de sua assessoria.
Três fatores contribuem
Além do fim do recesso parlamentar, três fatores explicam a retomada do tema, segundo assessores de governadores. Primeiro, a recente resolução da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) sobre perdão e regularização de projetos da lei 14.120, um primeiro passo para indicar quais projetos poderão sair do papel.
Segundo motivo: as indicações do governo federal de que se começa a avaliar um novo projeto de lei para a modernização do setor. Terceira razão: o avanço dos projetos de transmissão a serem licitados entre esse ano e 2025. Na semana passada, foi divulgado o edital do segundo leilão de transmissão desse ano, que deve ser realizado em 15 de dezembro e contemplar R$ 21,7 bilhões de investimentos.
Também foi informado que, em março de 2024 deve ser realizado um novo leilão com investimentos de R$ 21 bilhões em seis mil quilômetros de linhas. Em 2025, o governo ainda estuda licitar um sistema bipolo de transmissão que interligaria o Rio Grande do Norte a São Paulo ou Paraná, obra que sozinha poderia representar mais de R$ 15 bilhões em investimentos. Essas interligações serão entregues até o fim dessa década e ampliarão a capacidade do Nordeste de receber projetos.
“É um tema de grande importância, a conexão ao sistema está escassa pelo menos até 2027 e conceder prazo maior pode facilitar a entrada de projetos em um momento em que a região tem se desindustrializado”, diz um assessor de outro dos governadores.
“Há um temor entre governadores de que muitos projetos não saiam do papel, sem essa ampliação, sendo que muitos projetos eolicas e solares estão no interior dos Estados e geram riqueza local em áreas com PIB per capita mais baixo”, diz um desenvolvedor de projetos.
Caminho incerto da alteração
Estender o prazo exigiria alteração da Lei 14.120/2021. O caminho dessa modificação é ainda incerto. Estaria ainda sendo avaliado, mas a indicação do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, de que as fontes renováveis terão destaque na pauta desse segundo semestre foi interpretada como sinal positivo.
No início do ano, governadores do Nordeste também pressionaram para a realização de três leilões de transmissão nesse ano, um a mais que a média de licitações realizadas desde 1999. A ideia não avançou por gargalos existentes na cadeia de fornecedores.
*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.
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