iNFRADebate: Concessão do aeroporto de Congonhas – ainda é hora de corrigir o rumo

Cesar Pereira*

Está em tramitação no TCU (Tribunal de Contas da União) desde 4 de agosto de 2022 a representação TC-014.405/2022-9 formulada pela ABAG (Associação Brasileira da Aviação Geral). A iniciativa traz ao TCU a oportunidade de corrigir um defeito essencial na modelagem da 7ª Rodada de Concessões Aeroportuárias da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil).

O Aeroporto de Congonhas – vale dizer, os usuários de São Paulo, sobre os quais recairão todos os custos no final das contas – foi condenado a assegurar a viabilidade econômico-financeira de aeroportos espalhados por três regiões brasileiras.

É a típica ideia da solução simples e errada para um problema complexo.

Muitos aeroportos do Brasil são deficitários. E não só aeroportos. Muitos outros serviços públicos são deficitários. Isso é um problema? Não. A resposta existe desde 2004. A Lei 11.079 (Lei das PPPs) estabeleceu um mecanismo formal, transparente, com responsabilidade fiscal de subsídio público por meio de contraprestações pecuniárias do poder público nas parcerias público-privadas.

Desde a 5ª rodada de concessões da ANAC, passou-se a adotar um sistema de blocos para as concessões, em lugar da delegação de aeroportos isolados, como nas rodadas anteriores. Na 7ª rodada, cogitou-se inicialmente de um bloco reunindo o aeroporto de Belém e outros aeroportos da amazônia, que formariam um conjunto regional.

Houve sucessivas alterações nas definições dos blocos. O bloco regional não parava em pé. E a discussão sobre a concessão do aeroporto Santos Dumont esquentava cada vez mais. Criou-se um bloco isolado só com o aeroporto Santos Dumont, o qual foi cancelado em fevereiro de 2022, quando o aeroporto do Galeão aderiu à relicitação.

Duas semanas depois, surgiu a versão definitiva dos blocos, que o governo federal pretende leiloar ainda em agosto: o aeroporto Santos Dumont foi preservado para uma futura 8ª rodada e o aeroporto de Congonhas foi reunido em um bloco que reúne dez outros aeroportos de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Pará – todos deficitários.

Segundo os estudos do próprio governo federal, o VPL (Valor Presente Líquido) negativo desses aeroportos corresponde a quase metade do VPL positivo do Aeroporto de Congonhas.

A situação se enquadra com precisão no instrumento legal criado exatamente para ela – a PPP, na modalidade de concessão patrocinada. Delega-se o aeroporto deficitário para um concessionário dedicado a explorá-lo como sua missão principal, não como um penduricalho do aeroporto que de fato vale a pena, e se complementa a receita do concessionário com recursos conhecidos e quantificados de antemão. Essa é a solução para os dez aeroportos deficitários do bloco de Congonhas. Não a sua reunião em um pacote opaco, em que não se sabe nem quanto o governo federal deixará de receber por Congonhas nem quanto será efetivamente retirado de Congonhas (leia-se, dos seus usuários) para custear o déficit dos demais.

Ainda há tempo para reverter esse quadro, retirar o aeroporto de Congonhas da 7ª rodada de concessões e aplicar aos aeroportos deficitários do bloco o regime de PPPs.

Não há novidade alguma nisso. Seria apenas tratar o aeroporto de Congonhas com a mesma atenção dedicada ao aeroporto Santos Dumont, que será objeto de estudos específicos prestes a começar. De quebra, as PPPs ainda estimulariam a atividade econômica local, com o estímulo a empresas e empregos na região de cada aeroporto. E a concessão isolada de Congonhas poderia levar a resultados muito melhores sem os encargos vinculados aos aeroportos deficitários.

A ideia de PPP para aeroportos inviáveis é tão boa que foi defendida pelo diretor-presidente da ANAC em entrevista de 25 de novembro de 2021. Já existe na prática em Parnaíba, no Piauí. Foi incluída na Lei 14.368/2022, derivada da MP do Voo Simples. E foi levantada de ofício pela instrução técnica do TCU em maio de 2022, conforme o acórdão 1.228/2022-Plenário (proferido no âmbito do processo de acompanhamento da desestatização da 7ª Rodada – TC 041.500/2021-0).

Naquela ocasião, o TCU não levou adiante a discussão. Consignou apenas que aeroportos deficitários deveriam submeter-se ao regime da concessão patrocinada da Lei 11.079. Conformou-se com a constatação de que as PPPs não estavam na cartilha do Ministério da Infraestrutura e arquivou sua própria ideia.

A representação formulada pela ABAG dá ao TCU a oportunidade de se aprofundar no tema e corrigir o rumo. Arremeter é a melhor solução em alguns casos. Às vezes, a única.

*Cesar Pereira é doutor em direito administrativo pela PUC/SP e sócio de Justen, Pereira, Oliveira e Talamini.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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