Custo de Oportunidade, WACC, TIR, CAPM… o que são e para que servem?

Adalberto Santos de Vasconcelos* e Rafael Andrade de Vasconcelos**

Com certa frequência, em discussões técnicas e consultas formais, observo a necessidade de esclarecer conceitos de finanças, especificamente acerca do valuation de ativos, em tese, bastante corriqueiros para aqueles que atuam na estruturação de projetos de concessões de serviços públicos e de PPPs (Parcerias Público-Privadas).

A par de ser tema árido e complexo, entendo ser oportuno perquirir os principais conceitos e o racional dos parâmetros comumentemente utilizados na estruturação desses projetos de parcerias, tendo em vista a impressibilidade do “bom” entendimento deles para o sucesso da licitação e da sustentabilidade econômica e financeira da execução contratual do ativo repassado à exploração da iniciativa privada. Por se tratar de artigo direcionado aos diversos atores que lidam com a regulação, desde técnicos a gestores públicos e privados, procurarei utilizar linguagem menos técnica possível.

No início da década de 1990, o Brasil enfrentava elevadas restrições fiscais à expansão de investimento público, decorrentes da década anterior de convivência com hiperinflação e após diversos pacotes econômicos que buscavam controlá-la.

Em escala global, “sopravam os ventos” do neoliberalismo, guiado pelo Consenso de Washington, que clamava por disciplina fiscal e por privatização de diversas atividades econômicas – à época nas mãos do Estado empreendedor – em busca de maior estabilidade da economia, mais recursos para atividades públicas típicas do Estado e maior eficiência na prestação de serviços públicos.

Além da privatização de empresas estatais, o Brasil empenhou-se na busca pelo mecanismo de concessão de ativos de infraestrutura à iniciativa privada, ou seja, a busca por gestão privada sem que houvesse a perda da titularidade do serviço pelo poder público.

Inicialmente, promulgou-se a Lei 8.031/1990, que criou o PND (Programa Nacional de Desestatização), revogada posteriormente pela Lei 9.491/1997. Ainda nesse contexto, regulamentou-se o art. 175 da Constituição Federal, por meio da publicação da Lei 8.987/1995, a chamada “Lei Geral de Concessões”.

Conforme teoria da contabilidade básica e econômico-financeira, ‘ativo’ pode ser definido como bem e direito controlados por uma entidade e capazes de gerar benefícios futuros. O governo federal – estadual ou municipal, a depender do ente federativo –, ao conceder ativos de infraestrutura, confere à iniciativa privada o direito de explorá-los mediante a cobrança de tarifas públicas dos usuários ou recebimento de contrapartida pública.

Para tanto, o poder concedente, antes de proceder ao processo de contratação da concessão por meio de licitação pública, precisa valorar os benefícios econômicos vinculados à exploração dos ativos a serem delegados à iniciativa privada.

O §3º do art. 30 do Decreto 2.594/1998, que regulamentou a citada Lei 9.491/1997, determinou que o valor econômico da empresa – qualquer ativo incluído no PND, inclusive concessões de serviços públicos, prevista como uma das modalidades de desestatização abrangida pelo art. 7º do citado decreto – é “aquele calculado a partir da projeção do seu fluxo de caixa operacional, ajustado pelos valores dos direitos e obrigações não vinculados às suas atividades operacionais, bem como pelos valores que reflitam contingências e outros efeitos” (grifos não constantes do original).

Em outras palavras, recorreu-se à metodologia amplamente utilizada em finanças para cálculo de valores de empresas ou bens/direitos públicos, o valuation, sendo o DFC (Discounted Cash Flow ou Fluxo de Caixa Descontado) o método mais utilizado para fazer referida valoração. Nesse método, o valor de determinada companhia ou projeto ou ativo equivale ao somatório dos fluxos de caixa livres anuais – entradas e saídas no caixa da empresa ou do projeto – durante todo o prazo projetado, trazido a valor presente por uma taxa de desconto que representa o chamado retorno exigido pelo investidor ou custo de oportunidade do projeto.

Preliminarmente, cabe destacar o uso da palavra ‘valor’ e não ‘preço’. Recorro a uma das citações mais famosas de Warren Buffett: “price is what you pay; value is what you get“. Dessa forma, o ‘preço’ é o que pagamos por algo, geralmente determinado pelo mercado e leva em consideração fatores como oferta, demanda, concorrência e custos de produção.

Por sua vez, o ‘valor’ é mais difícil de se medir, pois é baseado na utilidade ou no benefício do bem ou serviço a determinado indivíduo ou grupo específico de indivíduos, sendo, portanto, dependente de cada destinatário (subjetivo). Por exemplo, uma garrafa de água pode ter alto valor para alguém com sede no deserto, mas baixo valor para alguém que tem acesso fácil à água potável.

Em concessão de infraestrutura, o valuation dos ativos é projetado por meio de fluxos de caixas futuros, em que os resultados estão estritamente relacionados com as premissas elaboradas para sua estruturação. Em consequência, esses fluxos têm valores diferentes para atores diferentes. Isso explica, em parte, ser comum haver deságios tarifários – ou maior valor de outorga, se for esse o parâmetro da licitação – nos certames licitatórios de projetos de infraestrutura.

Daí surge a seguinte indagação: como o Poder Concedente deve projetar um fluxo de caixa de forma técnica e neutra, sendo que os resultados são intrínsecos as premissas adotadas e, portanto, diferentes para cada ator?

Primeiramente, elabora-se estudo de viabilidade econômico-financeiro incorporando todos os aspectos técnicos, jurídicos e ambientais de projetos de infraestrutura. Para isso, faz-se necessário projetar todas as rubricas que irão subsidiar na estruturação do fluxo de caixa ou compô-lo, tais como receitas operacionais, despesas operacionais e administrativas, investimentos, custos ambientais, impostos, depreciação, dentre outras rubricas.

Por se tratar de delegação de ativo público, tais valores precisam ser justificados, pois, conforme já dito, essa avaliação precisa ser técnica e neutra, sem nenhum viés e muito menos dirigida, mesmo que inconscientemente, a algum potencial licitante. Para realização do orçamento dos investimentos, por exemplo, são utilizados dados provenientes de algum sistema de custos públicos, como o Sinapi (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índice da Construção Civil) ou o Sicro (Sistema de Custos Referenciais de Obras).

Nesse contexto, o fluxo de caixa a ser estruturado pelo poder concedente é o FCFF (do inglês free cash flow to the firm: ‘fluxo de caixa do(a) projeto/firma’ ou ‘fluxo de caixa desalavancado’).

O referido fluxo de caixa tem por objetivo avaliar a rentabilidade financeira do capital investido no projeto, independentemente de sua origem ser do acionista ou de terceiros (financiamentos/dívida). Portanto, em sua elaboração, não se deve considerar questões referentes à especificidade ou particularidade da alavancagem, como empréstimos e serviços da dívida atinentes a determinado licitante ou concessionário, visto que esses são riscos alocados majoritariamente aos concessionários. Dessa forma, deve-se utilizar parâmetros médios do setor a ser desestatizado.

Por outro lado, o poder concedente não pode negligenciar os benefícios fiscais/tributários, ao se contrair empréstimos ou dívidas, provenientes da diminuição de base de incidência do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e da CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido).

Para tanto, o governo recorre ao cálculo do WACC (do inglês: weighted average cost of capital) – também conhecido como CMPC (Custo Médio Ponderado de Capital), TMA (Taxa Mínima de Atratividade), ‘custo de oportunidade do investimento/projeto’ ou, simplesmente, ‘taxa de desconto’, de modo a aferir a viabilidade econômico-financeira do projeto de “forma técnica e neutra”. Agindo, assim, evita-se dirigir a licitação para algum participante específico.

O WACC é a técnica mais utilizada para se calcular o valor que irá demonstrar o risco-retorno de se investir em determinado ativo ou projeto. O WACC, conforme infere-se do próprio nome, é um valor médio, ou seja, o WACC calcula a taxa de retorno que um licitante “mediano” do setor aceitaria para estruturar e operar determinado projeto de infraestrutura, caso consiga financiamentos em conformidade com a média histórica do setor.

Com essa metodologia mundialmente utilizada, espera-se que o certame licitatório seja disputado pelas melhores empresas possíveis de modo a maximizar a eficiência do ativo público, servindo de primeiro filtro para eliminar empresas menos eficientes.

Cabe destacar que o WACC é calculado de forma exógena ao fluxo de caixa, de modo a permitir atestar a viabilidade do projeto quando comparado a TIR (Taxa Interna de Retorno), variável endógena ao fluxo de caixa[1]. Ressalte-se que o WACC representa rentabilidade média anual, sendo assim grafado em “percentagem de taxa de juros anuais” (% a.a.).

Por sua vez, a TIR representa o retorno do projeto no fim do período projetado (cinco anos, dez anos, 20 anos etc.), ou seja, a TIR não representa rentabilidade média anual, sendo assim grafada apenas em percentagem (%).

Apresenta-se, a seguir, a fórmula para o cálculo do WACC, comumentemente utilizada pelos entes concedentes:

Os parâmetros da fórmula precedente significam: (i) E é o volume de capital próprio; (ii) D é o volume de capital de terceiros ou dívida; (iii) é o custo de capital próprio; (iv)  é o custo de capital de terceiros ou custo da dívida; e (v) T é a alíquota total de imposto de renda de pessoa jurídica, incluída para avaliar o referido benefício fiscal da dívida.

Destaque-se que o WACC deve ser compatível com fluxo de caixa, ou seja, se o fluxo de caixa é nominal[2], deve-se utilizar o WACC nominal. A compatibilidade em moedas (real ou dólar) também se faz necessária. Entretanto, por questões quantitativas e qualitativas das informações disponíveis, recomenda-se utilizar índices norte-americanos e aplicar o risco país no cálculo do custo de capital próprio na conversão da moeda norte-americana para a moeda nacional (real).

O resultado numérico atribuído ao WACC é de extrema importância para as concessões de serviço público, haja vista que é exatamente essa taxa que deverá descontar o fluxo de caixa livre anual do projeto de parceria sob análise. A soma de todos os fluxos de caixa livre anual durante todo o prazo de concessão levará ao VPL (Valor Presente Líquido) do projeto. Em outras palavras, o FCFF da concessão, descontado a valor presente pela taxa do WACC, fornece o VPL do projeto.

A partir daí, pode-se extrair diversos parâmetros de interesse na modelagem da concessão, sobretudo, no que se refere ao parâmetro utilizado para selecionar o licitante vencedor do certame.

Assim, a título de exemplo, caso se iguale o WACC à TIR do projeto se obterá VPL nulo, usualmente aplicado em concessões em que o parâmetro da licitação é o menor valor de tarifa pública abaixo do valor definido no edital. Por outro lado, caso o VPL seja positivo, pode-se sinalizar uma concessão por maior valor de outorga, como é o caso das concessões de infraestrutura aeroportuária. E, na hipótese de VPL negativo, estar-se-á diante de uma PPP stricto sensu.

Outro ponto importante, refere-se ao fato de o WACC não ser o parâmetro ideal para captar riscos e oportunidades de um projeto específico sob a ótica do poder público, tendo em vista que ele reflete o retorno do investimento em determinado momento e não ao longo da execução contratual, quando os riscos do projeto podem se materializar.

Veja-se que no cálculo do WACC utiliza-se de valores médios pretéritos, assumindo-se a premissa de que o futuro pode ser explicado pelo passado. No entanto, sabe-se que, durante a execução contratual, diversos eventos novos econômicos e financeiros – tanto em prol ou contra o concessionário – pode vir a ocorrer, não sendo ideal ou tecnicamente justificado o poder concedente colocar algum ajuste, seja de risco ou de oportunidade, no cálculo do WACC.

Eventos futuros de riscos, por exemplo, devem ter tratamento muito mais criterioso, devendo estar presentes na matriz de risco do contrato, sendo alocados à parte contratual que pode gerenciá-lo ou absorvê-lo, se for o caso, com o menor custo regulatório, ou seja, a forma adequada de se tratar riscos durante a execução contratual é por meio da construção de matriz de risco robusta e, a medida do possível, a mais completa possível.

Assim, em caso de materialização de qualquer evento extraordinário, reequilibra-se o contrato, por exemplo, por meio do WACC do momento do evento desequilibrador. Não por outra razão que periodicamente as agências reguladoras calculam o denominado WACC regulatório setorial para ser empregado em revisões extraordinárias implementadas por meio do fluxo de caixa marginal[3].

Com efeito, vale relembrar que se está, até o momento, falando da estruturação de projetos de concessão de serviços públicos ou de PPP sob a ótica do poder concedente, ou seja, do governo federal, estadual ou municipal, pois o racional da iniciativa privada é diferente, como se verá adiante.

Assim, em resumo, o poder concedente estrutura a concessão por meio do FCFF, ou seja, não considera os efeitos do financiamento e do serviço da dívida. A alavancagem financeira é embutida no cálculo do WACC, que reflete a rentabilidade média do setor avaliado, incluindo a percentagem média de empresas do setor de se financiarem com capital próprio (dos acionistas) e com capital de terceiros (dívida/financiamento).

Para se ter leilão isento de viés e neutro, deve-se utilizar parâmetros médios e setoriais e não de uma determinada empresa específica. Esse é o racional na ótica do poder concedente.  

Na ótica da iniciativa privada, a par de os investidores se basearem nos fluxos de caixas elaborados pelo poder concedente, eles realizam ajustes nos valores e nas premissas a fim de retratar suas particularidades e seus “custos de oportunidades”.

Nesse sentido, além de ajustes nos preços de insumos, investimentos, custos e despesas, dentre outros, os licitantes incluem na estrutura do fluxo de caixa a sua alavancagem financeira específica, em que considera, entre outros fatores, o tamanho e taxa da dívida específica e a sua fonte de financiamento.

Agindo assim, a iniciativa privada elabora o denominado FCFE (do inglês: free cash flow to the equity, Fluxo de Caixa do Acionista ou Fluxo de Caixa Alavancado).

O aludido fluxo de caixa abrange todo o volume financeiro a ser despendido para honrar qualquer tipo de compromisso da concessionária, como amortização e serviços da dívida. Tem por finalidade principal avaliar o desempenho exclusivo do capital do acionista ao longo do tempo.

Por isso, a taxa de desconto desse fluxo de caixa é o custo de capital próprio – o  da fórmula do cálculo do WACC –, usualmente calculado pelo método do CAPM (Capital Asset Pricing Model):

Na fórmula precedente, as siglas significam: (i) é a taxa de retorno de investimento livre de risco; (ii)  (beta) é grau de sensibilidade do ativo ou do setor em relação ao mercado de ações; (iii)  é o prêmio de risco do mercado de ações; e (iv) é o risco país. Observe-se que o risco país somente entra na fórmula se a base de cálculo não for os parâmetros nacionais. Geralmente, utiliza-se parâmetros dos Estados Unidos. Dessa forma, a alavancagem financeira é feita “individualizada e personalizada” por cada licitante.

Alinhado ao racional exposto acerca de utilização de valores médios setoriais na estruturação do projeto sob a ótica do poder concedente, para se estimar o beta, é recomendável que se utilize ativos setoriais ao invés de determinada companhia em específico. Ressalte-se que companhias dentro de um mesmo setor têm riscos operacionais semelhantes e, portanto, betas similares[4].

Assim, em síntese, pode-se afirmar que a iniciativa privada estrutura sua proposta, a ser apresentada no certame licitatório, por meio do fluxo de caixa alavancado ou do acionista, considerando nele próprio os financiamentos e o serviço da dívida. Dessa forma, a alavancagem financeira, ao contrário do que faz o poder concedente, encontra-se particularizada para cada proponente, de acordo com suas condições de contratar empréstimos, e não o valor médio setorial.

Isso explica, em parte, deságios em tarifas públicas, quando esse for o parâmetro da licitação, ou ágio em valores de outorgas, nos casos em que o parâmetro for o maior valor de outorga ofertado acima de valor mínimo fixado no edital. Esse é o racional da iniciativa privada.

Longe de pretender exaurir os conceitos e as particularidades dos principais parâmetros utilizados na estruturação de projetos de parcerias, a diferenciação da forma que o poder concedente estrutura projetos da forma utilizada pela iniciativa privada e a singela compreensão da metodologia utilizada por tais atores não podem ser tidas como mero rigor técnico. Mas, em especial, como cada ator busca maximizar seus resultados, seja no interesse dos acionistas, para os privados, seja no interesse público, para o poder concedente.

Ademais, deve-se alertar para o equívoco de pretender intercambiar parte da metodologia utilizada pela iniciativa privada para o setor público que, mesmo no intuito de obter valores de outorga maiores ou de tarifas mais módicas, poderá levar ao indesejável direcionamento da licitação ou mesmo não retratar equidade de tratamento regulatório.


[1] Caso: (i) WACC > TIR, projeto é provavelmente inviável; (ii) WACC < TIR, projeto é provavelmente viável.

[2] Fluxo de caixa nominal é o que considera os efeitos da inflação (projeção).

[3] A metodologia do fluxo de caixa marginal consiste em determinar um fluxo de caixa apenas com os fluxos dos dispêndios e/ou receitas marginais do evento que deu origem ao desequilíbrio econômico-financeiro do Contrato

[4] KOLLER, T; GOEDHART, M.; WESSELS, D. Valuation: Measuring and Managing the Value of Companies. McKinsey & Company. Hoboken, 2015.

*Adalberto Santos de Vasconcelos é CEO da ASV Infra Partners Consultoria em Infraestrutura.
**Rafael Andrade de Vasconcelos é diretor de projetos da ASV Infra Partners Consultoria em Infraestrutura.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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