Monitoramento prudencial no mercado livre deve reacender discussão sobre garantias

Roberto Rockmann*

O monitoramento prudencial das operações de compra e venda de energia elétrica no mercado livre, que começará a vigorar em novembro em período de testes por 12 meses, deve reacender a discussão de necessidade ou não de estruturação de garantias em um mercado que movimenta mais de R$ 150 bilhões por ano, segundo dados das comercializadoras. Esse é um tema que ganha importância às vésperas da maior ampliação do mercado livre, que em janeiro de 2024 será aberto a todos os consumidores ligados à alta tensão.

Na terça-feira passada (29), a diretoria da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) aprovou para novembro o início do monitoramento prudencial das operações pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica). Serão visualizados parâmetros, metodologia e o limite de alavancagem dos agentes, assim como ter uma ideia melhor da posição de compra e venda deles. A ideia é que, com a complexidade e porte do mercado, a CCEE tenha mais ferramentas para poder se antecipar a eventuais problemas, com base em dados criptografados, de forma a preservar o sigilo dos dados dos agentes.

Bem sucedido o período sombra, como é chamada essa fase de testes que se encerrará em novembro de 2024, o setor deverá debruçar-se sobre uma fase seguinte: a discussão sobre garantias que poderão ser solicitadas. Quando o mercado foi pensado no fim dos anos 1990, vislumbrava-se um ambiente de negociação de diferenças de contratos entre agentes, que estariam em grande parte contratados. Hoje se negociam mensalmente bilhões de reais em acordos, ou seja, o mercado deixou de referenciar apenas transações de diferenças e a descontratação tornou-se maior que a prevista inicialmente.

Tema das garantias ganha relevância
“A transparência de preços e a segurança de mercado são dois temas essenciais. Já vimos a quebra de comercializadoras nos últimos anos, com garantias que não eram adequadas. Elas têm de ser mais seletivas”, disse o presidente da Neoenergia, Eduardo Capelastegui, em evento da Prumo na semana passada.

As comercializadoras participaram com a CCEE e a ANEEL das regras de monitoramento prudencial. “Esse é um tema importante e terá início ainda neste ano. A partir dos dados, será possível discutir qual é o nível de garantias que o mercado precisa, porque pode-se descobrir, depois de todo esse monitoramento, que as posições estão equilibradas. Com os dados desse período sombra, seria importante abrir uma consulta pública para avaliar resultados e discutir as garantias”, diz o presidente da Abraceel (Associação Brasileira das Comercializadoras de Energia Elétrica), Rodrigo Ferreira. O tema das garantias também pode envolver custos maiores para os agentes, o que exigiria cautela na discussão.

A realização de uma CP (Consulta Pública) foi defendida na reunião pública da ANEEL semana passada. “Depois de terminada essa fase, é importante a abertura de uma CP para ver o tratamento da alavancagem”, disse Hugo Leite, da área de assuntos regulatórios da Engie Brasil. A ANEEL concluiu que pode ser preciso uma nova etapa da consulta pública, sendo necessária uma análise do resultado do “período sombra” para afirmar qual o formato dessa participação.

Discussão se arrasta
O debate sobre as regras de segurança do mercado não é novo. Ganhou força em 2019, depois da quebra das empresas Vega e Linkx, mas tem se arrastado em discussões entre CCEE, ANEEL e resistência de agentes. Em 2019, a CCEE chegou a propor um mecanismo com origem no mercado financeiro utilizado para reduzir riscos de calote e exposição do mercado: a “chamada de margem”. As comercializadoras chiaram. Defenderam a autorregulação. O assunto foi deixado para a ANEEL, que agora aprovou o monitoramento prudencial, um passo anterior à discussão de estruturação de garantias.

Mercado livre baterá recordes em 2024
O tema da segurança ganhará importância em um momento em que o mercado livre se prepara para bater recordes sucessivos e chegar a um novo patamar. Dados da ANEEL publicados recentemente apontam que 5.300 unidades consumidoras já manifestaram às distribuidoras que migrarão para o mercado livre a partir de 2024, com a abertura de toda a alta tensão. Apenas em janeiro, serão 2.195 migrações, um recorde mensal histórico. Fugir de encargos e ter um acesso a preços mais baixos de energia são a principal razão.

Estudo da CCEE aponta que 72 mil consumidores poderão migrar para o mercado livre. Ou seja, quase 10% desse montante já manifestou seu interesse. Pelas regras do setor elétrico, quem deseja ir para o mercado livre deve indicar esse interesse à distribuidora com seis meses de antecedência do término do contrato.

O alto número de migrações tem feito distribuidoras e comercializadoras discutirem meios de facilitar o processo. Estudo da Abraceel com base em 148 problemas de consumidores que buscaram a migração indica que a principal queixa, apontada por 27% dos reclamantes, é a burocracia envolvendo a solicitação de documentos e falta de padronização de processos.

*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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