Opinião

Opinião – Reequilíbrio econômico-financeiro cautelar e provisório: uma ferramenta viável

Evelin Teixeira de Souza Alves*

Atualmente, tramita no Congresso Nacional o PL (Projeto de Lei) 7.063/2017, que tem por finalidade promover uma verdadeira modernização na Lei Federal nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, a denominada Lei das PPPs. Em 16 de outubro de 2024, o substitutivo ao PL 7.063 foi submetido, em regime de urgência, pelo atual relator do projeto – o deputado Arnaldo Jardim, à apreciação do Plenário da Câmara dos Deputados, aguardando votação no âmbito daquela Casa Legislativa.

De autoria do senador Antonio Carlos Valadares, inicialmente, o PL 7.063 teve o propósito de reduzir o valor mínimo dos contratos de parceria público-privadas celebrados pelos entes federativos, mantendo, o até então, limite de R$ 20 milhões, quando contratados pela União, porém propondo a redução para R$ 10 milhões, quando contratados pelos Estados e Distrito Federal e, para R$ 5 milhões, quando contratados pelos Municípios. No entanto, a Lei nº 13.529, de 4 de dezembro daquele mesmo ano diminuiu para R$ 10 milhões o limite mínimo para a contratação de PPPs para as três esferas de governo.

Desde a sua apresentação, ao PL 7.063/2017, foram apensadas outras proposições originárias da Câmara dos Deputados (PL 2.892/2011, PL 1.650/2015, PL 2.039/2015, PL 2.365/2015, PL 4.076/2015 PL 6.780/2016 e PL 7.869/2017), que preconizavam demais modificações à Lei das PPPs, a exemplo do incremento do percentual da RCL (Receita Corrente Líquida) para comprometimento das receitas com PPPs, de 5% para 7% ou 10% e da adoção do regime diferenciado de contratação (RDC) para a licitação das parcerias público-privadas.

O projeto de lei foi apreciado por diversas comissões da Câmara dos Deputados – pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara, pelas comissões permanentes da referida Casa, pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público e pela Comissão Especial sobre Parcerias Público-Privadas, onde se sujeitou a emendas e ajustes que culminaram no atual Texto do PL 7.063/201, ora submetido ao plenário, após aprovação deste último colegiado.

No evento “A Hora de Discutir a Mudança no Marco das Concessões e PPPs”, promovido pelo SouzaOkawa Advogados, no dia 27 de fevereiro de 2025, o Deputado Arnaldo Jardim enunciou 20 pontos de mudança que estão sendo endereçados no PL 7.063. Neste artigo, destacamos, entre estes pontos, o Reequilíbrio Cautelar.

De fato, a incorporação do novel instituto jurídico do reequilíbrio econômico-financeiro cautelar à Lei das PPPs atende aos anseios de promoção da celeridade e efetividade na resolução de controvérsias inauguradas nos contratos de PPPs, que desequilibram as condições econômico-financeiras originárias desses ajustes. Com efeito, tais desequilíbrios são capazes de gerar impactos prejudiciais tanto ao interesse público quanto aos concessionários. Do lado público, em virtude do prolongamento dos processos administrativos destinados à mensuração do seu valor, com provável elevação desse montante. Do lado privado, pelo potencial comprometimento do fluxo de caixa dos concessionários, em razão da morosidade na solução do conflito, que ao fim e ao cabo podem prejudicar o próprio objeto da concessão pública.

Vale destacar que a temática do reequilíbrio cautelar e provisório não é novidade em nível subnacional. Em 2023, a SPI (Secretaria de Parcerias em Investimentos) do Governo do Estado de São Paulo editou a Resolução SPI nº 19, que disciplinou a aplicação de medidas mitigatórias de impactos de desequilíbrios econômico-financeiros em contratos de delegação de serviços públicos. Em linhas gerais, a resolução enunciou os requisitos mínimos para que o Poder Concedente possa promover cautelarmente o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos que, em apertada síntese, se resumem à eleição de desequilíbrio cuja ocorrência seja inequívoca (já reconhecidos ou extremamente prováveis em razão de casos semelhantes), à necessária motivação e à preservação do erário.

Outrossim, a Resolução SPI nº 19 exige que a apuração provisória do desequilíbrio seja feita em bases estimativas, que a recomposição seja limitada a 80% do impacto estimado e que seja dada tramitação prioritária à mensuração definitiva, ademais de enunciar os casos em que o reequilíbrio cautelar é obrigatório (se verificados cumulativamente que (i) o evento já foi reconhecido ou possa ser presumido nos termos da resolução, (ii) é possível adotar medidas de suspensão de exigibilidade, elevação ou redução de pagamentos devidos pela Concessionária (ex. outorgas) e (iii) não houver indisponibilidade de recursos para cumprimento de obrigações orçamentárias e financeiras do Estado ou para preservação da autonomia financeira da agência reguladora responsável pela fiscalização do contrato).

Um exemplo concreto da aplicação do instrumento [em que tive a oportunidade de participar] pode ser encontrado em um dos complexos hospitalares administrados sob a modalidade de parceria público-privada junto ao Estado de São Paulo, notadamente relativo ao Contrato PPP nº 02/2014. Ainda no ano de 2023, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, considerando o reconhecimento de um evento de desequilíbrio ocorrido no bojo desse contrato de concessão administrativa, acolheu pleito de reequilíbrio econômico-financeiro cautelar e provisório apresentado pela concessionária responsável pela prestação dos serviços bata cinza.

Amparado em pareceres jurídicos da Procuradoria Geral do Estado e inspirado nas diretrizes contidas na Resolução SPI nº 19/2023, o termo aditivo celebrado entre a Secretaria da Saúde e a concessionária promoveu a recomposição econômico-financeira provisória do contrato, que se limitou a 80% do impacto econômico-financeiro estimado do evento de desequilíbrio. Após a finalização do reequilíbrio cautelar, as partes contratantes imediatamente deram início à apuração definitiva, com vistas ao cálculo do efetivo montante do desequilíbrio, que se lastreou na apreciação de informações e documentações mais bem detalhadas, cuja conclusão se deu um ano após, com a grata surpresa de que o valor de desequilíbrio preliminarmente alcançado foi ligeiramente superior ao efetivamente apurado (em 4,77%). Os termos aditivos respectivos podem ser encontrados aqui.

Como visto, as diversas vicissitudes e obstáculos para a concretização do reequilíbrio econômico-financeiro de contratos de PPPs, tais como, as dificuldades para a mensuração do desequilíbrio (decorrente do déficit de pessoal capacitado para análise do pleito ou de restrições orçamentárias), a complexidade da matéria técnica envolvida e da quantificação do desequilíbrio (necessidade de análise contrafactual) e o disciplinamento insuficiente ou inexistência de procedimento destinado à análise do evento de desequilíbrio, mensuração do seu impacto e da adoção de mecanismos para sua recomposição, que tanto assombram os gestores de contratos de concessão, podem ser mitigados por meio da recomposição provisória e cautelar do equilíbrio econômico-financeiro.

O exemplo apresentado evidencia a relevância da busca da contemporaneidade do reequilíbrio contratual e da maior previsão da mensuração do desequilíbrio e do reequilíbrio, assim como a dilação temporal necessária para apurar o impacto definitivo do desequilíbrio. Tal instrumento propicia uma redução efetiva dos impactos econômico-financeiros do desequilíbrio contratual, melhora a eficiência de todo o processo e reforça a segurança jurídica da relação contratual. A adoção dessa prática contribui para a viabilização de novos projetos com razoável redução de riscos percebidos ex ante pelos potenciais licitantes, trazendo benefícios inegáveis ao tão urgente avanço da infraestrutura social brasileira.

* Evelin Teixeira de Souza Alves é diretora de Infraestrutura, PPPs e Concessões da Pezco Economics.

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