Lais Carregosa e Geraldo Campos Jr., da Agência iNFRA
A área técnica da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) discordou do entendimento aprovado pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) sobre a obrigatoriedade da contratação de “posteiros”. Nota técnica assinada no último dia 9 de maio recomenda que a cessão do direito de exploração comercial dos postes de rua seja facultativa.
Esse é um dos principais pontos de discordância entre os setores de energia e de telecomunicações, cuja norma para compartilhamento da infraestrutura está pautada para a reunião da diretoria da ANEEL de hoje (20). O processo está sob relatoria do diretor Ricardo Tili, que encerrará seu mandato no sábado (24).
A recomendação da área técnica da ANEEL é para permitir que as distribuidoras possam escolher se preferem administrar o compartilhamento da infraestrutura com as operadoras de telecomunicações ou se vão contratar uma empresa terceira, que faça a operação e organização dos ativos, com direito à receita da cessão dos pontos de fixação.
Os técnicos da ANEEL divergem da Procuradoria Federal junto à Anatel, que entendeu que o decreto de renovação das concessões de distribuição obriga a cessão do direito de exploração comercial dos postes a outras empresas. A interpretação tem como base nota técnica elaborada pelo MME (Ministério de Minas e Energia) ao encaminhar a minuta de decreto à Casa Civil.
Contudo, para a área técnica da ANEEL, o decreto publicado usa termos diferentes da minuta enviada à Casa Civil, o que sinalizaria uma mudança de posicionamento do governo sobre o tema.
“No texto proposto inicialmente, a cessão da exploração comercial estava estabelecida no caput do artigo, e com uma determinação a ser seguida pelas distribuidoras, dado que foi utilizada a expressão com sentido mandatório ‘deverão ceder’. Contudo, o texto publicado usa essa mesma expressão, ‘deverão ceder’, para se referir aos espaços em infraestrutura, e não à exploração comercial desses espaços”, diz.
À Agência iNFRA, fontes a par do assunto disseram que o decreto pode ser interpretado das duas maneiras. Para esses interlocutores, a ANEEL encontrou um meio-termo entre a proposta de cessão compulsória e facultativa ao determinar que, caso as distribuidoras falhem em regularizar os postes, as agências poderão impor a figura do “posteiro”.
Avaliação e imposição
Os técnicos da agência agora preveem que as distribuidoras terão o seu desempenho na gestão dos postes avaliado e, caso seja insuficiente, poderão ser obrigadas pela ANEEL e Anatel a ceder a exploração comercial ao chamado “posteiro”.
“Portanto, entende-se que a cessão da exploração comercial dos espaços em infraestrutura deve ser uma prerrogativa das distribuidoras, com a possibilidade de as duas agências determinarem essa cessão em caso de inefetividade da atuação da distribuidora quanto à regularização do desordenamento dos postes”, diz a nota técnica.
Essa regularização dos ativos inclui a obrigação de a distribuidora retirar as redes não identificadas dos seus postes, com foco inicial naqueles pontos considerados prioritários. A falta de cumprimento da regra poderá “caracterizar a inefetividade da atuação da distribuidora quanto às suas obrigações” e levar à determinação da cessão da exploração comercial dos postes.
Fontes do setor avaliam o trecho como positivo e ressaltam que as agências devem observar o processo legal, com direito ao contraditório, ampla defesa e parâmetros claros de avaliação.
A norma de compartilhamento chegou a ser aprovada pela Anatel em 24 de outubro de 2023, mas a ANEEL não chegou a um consenso e abriu um novo processo diante da publicação de portaria conjunta do MME e MCOM (Ministério das Comunicações) com novas diretrizes para a norma.
Além disso, a publicação do decreto que estabelece as diretrizes de renovação dos contratos de distribuição também afetou o andamento da resolução conjunta. O decreto determina que as distribuidoras devem ceder a outras empresas o espaço, as faixas e os pontos de fixação das redes aéreas.
Custo de regularização
Já o custo de regularização do passivo – outro ponto de contenda entre distribuidoras e operadoras de telecomunicações – deve ser arcado pelas operadoras, entrando na metodologia de cálculo do preço para utilização do ponto de fixação nos postes.
Uma nota técnica da Anatel, de 2020, calcula que o passivo é da ordem de 10 milhões de postes em situação crítica. Seriam necessários oito anos para regularizar os 46 milhões de postes pelo país.
À Agência iNFRA, o diretor de regulação da Abradee (Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia Elétrica), Ricardo Brandão, disse esperar que a regulação avance, uma vez que é uma demanda dos dois setores.
“Esperamos que as agências busquem essa convergência, mas ainda assim vemos que há vários pontos na regulação da Anatel que precisam de uma evolução para considerar as especificidades do setor elétrico e as dificuldades de implantação desse modelo na forma como foi aprovado pela Anatel”, declarou.
Se aprovada hoje (20), a norma volta para deliberação pela Anatel. A resolução conjunta só terá validade quando as duas agências aprovarem o mesmo texto.