Sheyla Santos, da Agência iNFRA
A proposta inicial da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) para o modelo de contrato para a adesão de concessionárias de rodovias ao RCR (Regulamento das Concessões Rodoviárias) não foi bem recebida pelas empresas, que pediram que a proposta passe por uma reformulação completa.
A agência apresentou na última quarta-feira (9), em reunião participativa, a minuta padrão de contrato para as concessionárias. A reunião participativa é uma espécie de prévia ao processo formal de audiência pública para a revisão de uma norma.
O RCR é um conjunto de cinco normas que a agência vem aprovando desde 2020. A ideia é que os contratos de concessão sejam regidos pelas regras do RCR e os contratos com cada concessionária tragam apenas detalhes mais específicos sobre cada concessão.
Para os novos contratos, as regras do RCR já estão valendo. Mas, para os antigos, a maior parte do regulamento precisa que as empresas aceitem a mudança para se adequarem às novas regras. A reunião participativa desta quarta era para apresentar a proposta de um novo contrato para as empresas antigas. Leia aqui a apresentação da agência. As contribuições sobre o tema podem ser enviadas por escrito até 16 de abril.
Na apresentação, ficou claro que internamente havia divergência entre os técnicos sobre o modelo. A proposta foi elaborada pela Surod (Superintendência de Rodovias) da agência, mas um parecer da Sucon (Superintendência de Concessões) entendeu que a proposta da área rodoviária deixava de fora aspectos importantes dos contratos.
Alexandre Souto, da ANTT, que fez a apresentação da proposta na audiência, afirmou que a Gerência de Regulação Rodoviária apresentou à Superintendência de Concessões um protótipo no qual o chamado “contrato de concessão de rodovias do futuro” deveria ser dividido em duas partes, formado por uma cláusula geral, de uso comum a todas as concessões, e outra cláusula específica para cada contrato.
A Sucon identificou riscos de insegurança jurídica na proposta do novo modelo, apontando ausência de temas caros ao TCU (Tribunal de Contas da União) e às concessionárias, como mecanismos de contas de concessão, verbas previstas em contrato (fiscalização, RDT) e fatores tarifários.
Como propostas de melhorias, Souto disse que a superintendência propôs que haja efetiva participação do setor regulado, além de um prazo mínimo para compreensão por parte do mercado sobre as inovações do novo modelo e um tempo adequado para a consolidação do modelo vigente na 5ª Etapa, com identificação de pontos de aprimoramento.
A superintendência também defendeu que haja a preservação da confiança, previsibilidade e segurança jurídica na regulação, de forma a prevenir retrocessos na condução da política de outorga rodoviária que vem sendo aprimorada pela agência nos últimos anos. Segundo Souto, o novo modelo unificado, ainda em debate, trará redução de custo regulatório tanto para a agência quanto para as concessionárias.
Ele sugeriu que houvesse maior tempo para a consolidação do atual modelo de concessão, que está sendo aplicado na 5ª Etapa de Concessões Rodoviárias, e maior participação do setor regulado na elaboração da norma, com maior prazo para que as empresas entendam o regulamento.
De acordo com a ANTT, a adesão ao RCR segue sendo voluntária por parte das concessionárias. Na reunião desta quarta-feira, a agência reguladora descartou a possibilidade de adesão parcial aos RCRs, conforme aventado por um participante do encontro.
Segundo Hildevana Almeida, presidente da reunião participativa, a expectativa da autarquia é dialogar com as concessionárias sobre o tema ao longo do primeiro semestre para que haja uma adesão de 100% do setor até o fim deste ano. O superintendente de Infraestrutura Rodoviária da ANTT, Alexandre Souto, afirmou que haverá outras oportunidades para o setor debater o tema.
Surpresa com novo contrato
Guilherme Bianco, diretor de Relações Institucionais da Melhores Rodovias do Brasil – ABCR (Associação Brasileira das Concessionárias de Rodovias), que representa a maioria das concessionárias de rodovias, disse ser favorável ao RCR, o qual classifica como a “maior catedral regulatória” no setor de rodovia, mas mostrou-se surpreso com a proposta apresentada.
Ele afirmou que pode estar havendo insegurança jurídica na atual proposta, especialmente na forma como está sendo estabelecido o contrato. Segundo ele, o setor sempre imaginou que haveria um aditivo aos contratos existentes, mas o que foi apresentado é um contrato novo.
“Sempre entendemos que seriam aditivos contratuais aos contratos existentes, a inclusão dos RCRs. A gente conheceu a matéria agora e entendemos que é um novo contrato padronizado”, disse. “É algo que a gente não esperava e por isso é a gênese do nosso debate. A gênese do nosso debate é: estamos discutindo novos contratos”, afirmou.
O diretor disse que, inicialmente, a proposta de padronização poderá trazer muitos impactos aos contratos, incluindo o efeito tarifário de falta de receita, dada a falta de clareza de aspectos como o DUF (Desconto de Usuário Frequente). “Faz sentido essa mudança tão abrupta? Se faz, a gente vai ter que discutir muito mais.”
Rodrigo Barata, advogado e sócio do Madrona Advogados, disse que o imaginado é que haveria “um caminho um pouco mais simples”, de preenchimento de algumas lacunas ou correção de algumas questões que o setor evoluiu, mais do que uma substituição contratual. “A ideia aqui não é criticar a substituição, mas contar que, de fato, isso foi uma surpresa nossa”, disse.
Proposta de transição
Douglas Santiago, gerente jurídico da concessionária Nova Rota do Oeste, disse que as concessionárias poderão não querer aderir ao modelo unificado diante de uma “padronização excessiva” de contratos por parte da agência.
Ele ressaltou que há empresas com contratos desequilibrados com base no regramento atual e que a nova proposta poderá ter impacto nos processos em andamento na agência. Ele sugeriu uma etapa de transição, com uma terceira parte de contratos, além das cláusulas geral e específica.
“Que a gente faça uma terceira parte de contratos, que não seja chamada uma parte padrão, mas que seja chamada uma parte transitória, em que as concessionárias possam vir até a agência de uma forma independente e discutir de fato quais são os impactos”, defendeu.
O gerente técnico da Anut (Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga), André Aguiar afirmou que a aplicação do modelo contratual a contratos vigentes também gera preocupação, pois há diferença na precificação do risco. Daniele Franco, gerente jurídica da Arteris, disse que há muitas etapas que precisarão ser observadas na proposta, incluindo a figura da reclassificação tarifária, que não está prevista nos contratos de primeira etapa.