STF confirma liminar que impediu TCU de determinar redução de tarifa em concessão de rodovia

Tales Silveira, da Agência iNFRA

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) anulou a decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) que, em 2018, determinou a revisão do valor da tarifa do pedágio da BR-290/RS. O valor havia sido acordado entre a Concepa, do grupo Triunfo, e a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Por unanimidade, o colegiado confirmou a decisão liminar proferida pelo ex-ministro Marco Aurélio, ainda em 2018. O processo pode ser acessado neste link.

De acordo com o relatório apresentado pelo TCU na época, teria havido irregularidades da ANTT na projeção de cálculos da tarifa para a extensão de prazo de 12 meses do contrato de concessão da rodovia à Concepa. O acórdão apontou também suposta superestimativa dos custos operacionais e de conservação da rodovia.

A Concepa havia encerrado seu prazo contratual mas a ANTT ainda não havia conseguido fazer a licitação para uma nova concessionária assumir a rodovia. A agência então propôs uma redução de tarifa ao usuário para que a própria concessionária se mantivesse na operação, recebendo uma tarifa que só cobriria os custos operacionais. Isso ocorreu por 12 meses.

Mas, após a decisão do TCU, a concessionária se recusou a ficar por um outro período e a rodovia ficou sem cobrança de pedágio e manutenção e serviços adequados por quase um ano até a nova concessionária assumir.

O voto-vista no STF, apresentado pelo ministro Alexandre de Moraes no último dia 3, seguiu em parte o entendimento do então relator. Os dois concordaram que o TCU extrapolou o princípio do contraditório e da ampla defesa ao não permitir que a empresa tivesse acesso aos cálculos que fundamentaram a decisão.

“O procedimento do TCU não ouviu a concessionária e não permitiu acesso à documentação, aos estudos e às provas. A concessionária poderia, eventualmente, conseguir impugnar a revisão da tarifa. Não houve qualquer possibilidade do contraditório e da ampla defesa”, disse Moraes.

Competência mantida
Em seu voto apresentado à época, Marco Aurélio escreveu que o TCU não poderia interferir em uma competência que seria da ANTT. Segundo ele, “toda agência controladora é autarquia especial, submete-se ao princípio da legalidade estrita e tem autonomia nas providências que entenda necessárias. Extravasamento deve ser alvo não da atuação do TCU, órgão auxiliar, simplesmente auxiliar – repita-se –, do Legislativo nacional”, escreveu.

Moraes afirmou discordar do entendimento do ex-ministro. Para ele, o TCU auxilia o Congresso Nacional exercendo o controle externo de autarquias. Portanto, o órgão pode aplicar revisões em contratos da ANTT.

“Mas entendo que isso não o exime de, nesses casos, observar o contraditório e a ampla defesa”, afirmou o ministro, que recebeu apoio da maioria da turma para seu entendimento.

Procurado, o TCU afirmou que não irá se pronunciar sobre o assunto.

Decisão aplaudida
Flávio Bettega, representante da Concepa e sócio da Rodrigues e Bettega Advogados Associados, disse que a determinação do TCU acaba interferindo no poder de decisão da ANTT.

“Aplaudimos a decisão. Vimos a decisão do TCU como certa exacerbação dos órgãos de controle. A oferta da ANTT, na época, reduzia pela metade o preço da tarifa. A Concepa fez as contas e aceitou. Depois, o tribunal, sem nos dar acesso aos documentos que fundamentaram a decisão, determinou uma revisão de tarifa no prazo de 10 dias. Não se desconhecem as importantes atribuições do tribunal. Só é necessário ter cuidado para que ele não seja transformado em um regulador de segunda ordem”, comentou.

Processo semelhante na Dutra
Neste momento, o TCU está julgando um processo com características semelhantes ao da Concepa, mas em outra rodovia, a concessão da BR-116/RJ-SP, a Rodovia Presidente Dutra, administrada pela CCR.

No caso específico, a Secretaria de Infraestrutura de Rodovias e Aeroportos encampou uma denúncia da UsuVias (Associação Brasileira de Usuários de Rodovias sob Concessão) contra o mecanismo instituído pela ANTT para manter o patamar de cobrança de pedágio após a data do fim do contrato em valores semelhantes aos que vinham sendo cobrados.

Os auditores entenderam ser ilegal o mecanismo criado pela agência, que estabelece uma conta para que seja depositado o valor arrecadado além do que seria a tarifa apenas para a manutenção da via e depois seja usado para compensar a concessionária ou fazer mais obras na rodovia. Reportagem sobre o tema está neste link.

O relator do processo, ministro Bruno Dantas, convocou uma audiência pública para tratar do tema, na qual o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, defendeu o mecanismo como legal e mais adequado do ponto de vista da concessão, evitando variações bruscas de tarifas. Dantas ainda não levou sua decisão ao plenário.

Processos suspensos
Se por um lado a ANTT teve confirmada sua decisão pela Justiça, por outro foi impedida por ela de dar prosseguimento a dois processos referentes a rodovias. A ViaBahia, concessionária das rodovias BR-116-324/BA, obteve decisão favorável em mandado de segurança na 21ª Vara da Seção Judiciária Federal do Distrito (1054632-41.2021.4.01.3400) determinando que a agência se abstenha de deliberar imediatamente sobre a proposta de revisão quinquenal do contrato de concessão, pautada na semana passada.

A ANTT vem pressionando a concessionária a implementar o programa de investimentos, e o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, já disse que pode fazer uma intervenção na concessão. A concessionária vem alegando que há descumprimentos por parte do governo e quer reequilíbrio do contrato. Uma arbitragem está em curso sobre o contrato.

Da mesma forma, a Ecosul, concessionária das rodovias BR-116-392/RS, também obteve liminar na 6ª Vara Federal (processo 1015421-95.2021.4.01.3400) que impede a agência de rever obras já realizadas pela concessionária entre os anos de 2016 e 2019. O processo sobre o tema também foi retirado da pauta da agência da semana passada.

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