Jenifer Ribeiro, da Agência iNFRA
A decisão do plenário do TCU (Tribunal de Contas da União) no processo da consulta do governo federal para a repactuação dos contratos de concessão em processo de relicitação permitirá a flexibilização dos investimentos contratuais numa futura renegociação. No entanto, as outorgas e a tarifa básica originalmente assumidas deverão ser mantidas.
O plenário julgou, na última quarta-feira (2), de forma unânime, que é possível que o governo federal desista dos processos de relicitação, porém foram adicionadas 15 condicionantes para que esse processo seja viabilizado. A consulta sobre essa possibilidade foi feita pelos ministérios dos Transportes e de Portos e Aeroportos.
Durante o voto, o presidente do órgão, ministro Bruno Dantas, fez duas ponderações, a pedido da Secex Consenso, que foram aprovadas ao final da sessão plenária. A primeira alteração diz respeito ao restabelecimento integral das outorgas e da tarifa básica com possibilidade de flexibilização dos investimentos previstos no contrato original.
A segunda ponderação está relacionada à permissão de mudanças na matriz de risco do contrato observando os princípios norteadores que fundamentaram essa alocação dos riscos durante o processo de contratação. No voto inicialmente apresentado pelo relator do processo, ministro Vital do Rêgo, havia proposta de determinação para que não houvesse alterações na matriz de risco.
Apreensões setoriais
A determinação da manutenção do VPL (Valor Presente Líquido) original do contrato foi sutilmente flexibilizada no voto, também por sugestão do ministro Bruno Dantas. Na sugestão inicial do relator, o acórdão indicava que o processo dizia: “Assegure a manutenção do valor presente líquido das outorgas originalmente assumidas”. Com a sugestão, o texto ficou: “Assegure o restabelecimento integral do pagamento de outorgas vencidas e não pagas (ou eventual parcelamento), e leve em consideração a manutenção do valor presente líquido das outorgas originalmente assumidas”.
Manter o VLP original era visto como uma barreira que poderia até inviabilizar a repactuação de vários contratos e levava temor a integrantes do governo e do mercado, como adiantou a Agência iNFRA. Com a mudança, a indicação é que as negociações sobre esse tema podem ocorrer no âmbito da repactuação, que vai ter que passar pela Secex Consenso e pelo plenário do próprio TCU posteriormente.
O ministro Vital do Rêgo disse para a reportagem que o TCU não tem competência para permitir que o valor pago de outorga seja menor que o firmado em contrato. Para ele, isso seria uma descaracterização do contrato original e poderia gerar questionamentos da validade do leilão por parte dos demais participantes da licitação.
Em relação à necessidade de os estudos de vantajosidade e do novo termo aditivo ao contrato de concessão serem encaminhados ao TCU, fonte ligada ao setor rodoviário apontou que esse trâmite pode atrasar a repactuação e é desnecessário do ponto de vista técnico.
Tanto o ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, quanto o ministro dos Transportes, Renan Filho, disseram para a Agência iNFRA que as alterações acatadas pelo plenário são positivas e podem aumentar o interesse das concessionárias na repactuação dos contratos. Ambos também elogiaram a aprovação do processo após a votação, em conversa com jornalistas.
Demais condicionantes
Além das condicionantes já apontadas, o concessionário terá que seguir outras regras para que a desistência da relicitação seja aprovada. Uma delas é que o concessionário será obrigado a retomar o pagamento das contribuições devidas, seguir os investimentos previstos originalmente e manter o nível de prestação dos serviços.
No âmbito dos estudos de vantajosidade para repactuação frente à continuidade da relicitação, que deverão ser elaborados por concessões ferroviárias, rodoviárias e aeroportuárias, terão que ser feitas avaliações acerca da:
Incorporação de mecanismos para amortização de empreendimentos geradores de receitas não tarifárias; da garantia da viabilidade econômica, financeira e operacional do novo termo aditivo; e da utilização da metodologia de fluxo de caixa marginal para garantia do reequilíbrio econômico-financeiro.
E também um levantamento da repercussão sobre as receitas da Infraero – tendo em vista que a empresa tem 49% de participação em diversas concessões aeroportuárias – ante a impossibilidade da sua participação na nova SPE (Sociedade de Propósito Específico) e em vista da possibilidade de incluir uma indenização da concessionária à Infraero.
Ademais, fica proibida mais de uma repactuação para o mesmo contrato. Para que o contrato seja restabelecido, será necessário que o ativo saia da carteira do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) e que haja uma demonstração de interesse público e aderência ao princípio da legalidade, em especial os princípios do PPI, e da continuidade da prestação do serviço público.
O concessionário também precisará manifestar oficialmente o interesse em permanecer operando o ativo, deverá cumprir integralmente os dispositivos dos TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) pactuados ao longo da concessão e renunciar aos processos, liminares e quaisquer demandas judiciais ou arbitrais – no entanto não será afastada a possibilidade de que tais demandas sejam tratadas em uma possível resolução consensual entre o poder concedente e o concessionário.
Foram determinadas como condicionantes a garantia de resposta e a aderência do novo termo aditivo ao contrato de concessão vigente e ao escopo da política pública setorial.
Consenso
O ministro Vital do Rêgo destacou que os ajustes apresentados no voto, nesta quarta-feira, foram feitos em conjunto com os ministros revisores Walton Alencar e Jhonatan de Jesus, que pediram a retirada do processo da pauta no começo do mês passado.
O ministro relator afirmou ainda durante o voto que a desistência do processo de relicitação deve ser excepcional; que o excedente tarifário não poderá ser cobrado pelo concessionário durante a repactuação; e que, no caso de licitações com critério de menor tarifa, o modelo deve continuar ao longo do novo contrato firmado a fim de não descaracterizar a concessão, assim como no caso de leilões com critério de desempate por maior outorga.